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A rotina dos paulistanos viciados em shopping

Conheça as pessoas que passam o dia nas compras

Por Milene Saddi
Atualizado em 5 dez 2016, 19h27 - Publicado em 18 set 2009, 20h30

Já aconteceu de, após um dia corrido, você ficar com a impressão de que faltou alguma coisa? Para os paulistanos destas e das páginas a seguir, a sensação costuma aparecer quando sua agenda os impede de tirar um momentinho para bater pernas entre as vitrines do Iguatemi, do Villa-Lobos, do Anália Franco ou do Pátio Higienópolis. Numa metrópole como São Paulo, em que praticamente todo grande bairro dispõe de um centro comercial para chamar de seu, não demorou a surgir uma geração de consumidores que podem ser classificados como viciados em shopping. O que, apesar do nome aparentemente pejorativo, significa integrar a mais alta casta de clientes, cobiçadíssimos pelos lojistas – sobretudo porque chegam a torrar 10 000 reais por mês em compras e serviços. Conhecem os funcionários e vendedores pelo nome, queixam-se com desenvoltura se algum dos espaços está sujo ou desorganizado e, enfim, tratam seu shopping de estimação como uma extensão de sua casa.

800 reais por mês em café e pão de queijo

“Nessas mesas, já rimos e choramos juntas várias vezes”, conta a dona-de-casa Benilde Longo. Falante e divertida, ela integra um grupo de animadas senhoras que têm entre 32 e 71 anos e, há pouco mais de um ano, se reúnem para o café da tarde no Shopping Anália Franco de segunda a sexta-feira. Haja disposição! O grupo chega às 15h e só vai embora três horas depois. Afinal, seria chato se os maridos voltassem do trabalho e elas não estivessem em casa. Apesar de terem formações diferentes (uma é advogada, outra é professora e por aí vai), quase todas se dedicam às chamadas prendas do lar. “Resolvemos pendências domésticas de manhã e curtimos nosso lazer aqui à tarde”, conta Renata Donato. “Mas já esqueci de buscar meu filho na escola”, confessa outra delas, Graziely da Costa. Somente com cafezinhos, pães de queijo e afins, torram por mês 800 reais. A quantia é fichinha em comparação com os gastos de cada uma delas: entre 2 000 e 10 000 reais mensais. “É difícil sair sem pelo menos uma sacolinha”, diz Renata. De tão assídua, ela ocupou por dois anos um posto de consultora no conselho de consumidores do Anália Franco, sem remuneração nem regalia alguma. Detalhe curioso: as amigas criaram um cadastro informal dos vendedores. Ai de quem as destratar durante o atendimento! O sujeito fica marcado e todas se recusam a comprar uma agulha com ele, mesmo que vá trabalhar em outra loja. “Olha, nós somos madames mesmo”, assume Benilde. “Vou ficar em casa olhando a babá cuidar do meu filho para quê?”, emenda Renata..

Isto, sim, é bater pernas!

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Cuidar dos pés é importante para o arquiteto Érico Mingoni, 33 anos, que a cada quinze dias consulta-se com um podólogo no Center 3, na Avenida Paulista. A preocupação faz sentido. Pelo menos três vezes por semana, ele caminha até quatro horas (seu recorde são seis) de olho nas vitrines de diversos centros comerciais paulistanos. Programa as visitas conforme o produto ou serviço de que precisa. Morador de São Bernardo do Campo, é capaz de, num mesmo dia, tomar café-da-manhã no MorumbiShopping, rumar para o Villa-Lobos, na Vila Leopoldina, em busca de eletroeletrônicos, e comprar roupas no Eldorado, em Pinheiros. Suas visitas misturam trabalho e prazer. “Além de me distrair, fico de olho em novidades que posso usar em futuros projetos”, diz ele, especialista em decoração de interiores e cenografia. Érico jura ser do tipo “consumista-mas-nem-tanto” e gastar, no máximo, 4 000 reais por mês em suas incursões pelos corredores. Como bom viciado, conta nos dedos a hora de conhecer o Cidade Jardim, o mais novo templo de compras da cidade. “Estou megacurioso.”

Passeio sem a mãe? Só no shopping

Típico de cidadezinhas do interior, o costume dos jovens de caminhar em volta da praça da igreja ganhou na São Paulo dos shoppings uma versão moderna e consumista. As estudantes Nicole Degreas (na foto, de camiseta listrada) e Luiza Prado, ambas de 11 anos, são adeptas do, digamos, ritual. Pelo menos duas vezes por semana vão ao Iguatemi. Levam entre 30 e 50 reais, o que dá para pouca coisa, é verdade. Um CD de cantoras como Hillary Duff e Ashley Tisdale, acessórios de cabelo e, se sobrar algum, lanches, um chocolatinho ou doces. “É o único lugar aonde minha mãe deixa eu ir sem ela”, diz Nicole, em geral levada às compras pelo motorista, que fica do lado de fora. Durante as quatro horas entre vitrines, procura roupas e objetos que gostaria de ter – para voltar depois com os pais e matar a vontade. “Melhorei minha nota em geografia, por isso acho que vou conseguir ganhar uma luminária que quero muito”, diz Nicole.

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Família que faz compras unida…

Se não fossem sócios do Clube Pinheiros, no Jardim Europa, o engenheiro mecânico Carlos Eduardo Bacchin e sua mulher, Andrea, dificilmente cruzariam a Ponte Cidade Jardim no sentido centro. O casal, que vive há catorze anos no Morumbi com as filhas Carolina, 11 anos, e Tatiana, 8, concentra suas atividades domésticas no Shopping Jardim Sul. O que isso significa? Lavanderia, supermercado, exames em laboratório de análises clínicas, cinema, restaurante, cabeleireiro e manicure. Além, claro, de compras. Só de estacionamento, gastam 200 reais por mês. “Resolver tudo em um lugar é mais prático”, explica Andrea, que passa diariamente por ali. De tão à vontade, nem liga de aparecer em trajes de ginástica ou chinelão, hábito raro entre os paulistanos. “Eu me sinto no quintal de casa.”

Cliente preferencial na pet shop

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Na época em que se anunciou o projeto do Pátio Higienópolis, muitos moradores do bairro mobilizaram-se em abaixo-assinados e protestos contra a sua construção. A empresária aposentada Ivani Saraiva, que ali vive desde 1979, achou uma tremenda bobagem. “Imaginava que o dia-a-dia ficaria mais prático. E estava certa”, diz. Aos 72 anos, divorciada, dois filhos casados e cinco netos, circula por seus corredores no mínimo três vezes por semana. Gosta de almoçar, comprar remédios na farmácia, fazer uma fezinha na Mega Sena toda quarta e sábado, além de trocar moedas numa casa de câmbio. Nada, porém, a faz sorrir com mais satisfação do que levar seu companheiro para um trato. A cada quinze dias, seu spitz alemão anão Tschully recebe mimos, banho e vacinas numa pet shop. Torrar boas cifras em roupas e compras, ela afirma, não é a sua. “Minha fase consumista ficou no passado”, diz. “Esse lugar faz parte da minha vida.”

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