Casas de parto humanizado têm alta em nascimentos na pandemia
Mães dividem experiências nestas unidades geridas 100% pelo SUS; é preciso seguir alguns critérios, como estar esperando apenas um bebê
Passos largos no jardim, uma banheira com água quente e músicas da cantora espanhola Rosa Zaragoza ao fundo. Esses foram os preparativos escolhidos pela paulistana Amanda Meskauskas, 38, para receber seu primeiro filho, no Centro de Parto Humanizado Casa Angela, na Zona Sul. O espaço é 100% gerido pelo SUS, com todo o atendimento gratuito. Mãe de primeira viagem, Amanda almejava dar à luz da forma mais natural possível. Pela internet, encontrou uma descrição simpática da Casa em um blog.
“Era apresentada como uma casinha de vó, com jardim florido, cheirinho de bolo saindo do forno e pessoas muito acolhedoras. Quando fui conhecer, confirmei tudo isso. Eu me apaixonei, e meu marido também, no momento em que pisamos lá”, conta. O encanto foi tanto que não só seu primogênito, Pedro, de 7 anos, e o seu caçula, Arthur, de 2, nasceram lá. Amanda decidiu também se candidatar à vaga de gerente administrativa da Casa Angela, função que ocupa há seis anos.
A metrópole está vendo um crescimento no número de gestantes que decidiram dar à luz no local desde o ano passado. Em 2020, em comparação com o ano anterior, o centro humanizado registrou um aumento de partos em 4,2%, totalizando 424 nascimentos. A expectativa é que no fim deste ano o número seja ainda maior. Somente nos primeiros quatro meses de 2021, foram realizados dez partos por semana. Em março e em abril, o número por mês registrado passou de quarenta bebês, transcendendo a média da Casa, segundo a gerente administrativa.
A razão para a alta se dá devido à pandemia, de acordo com Amanda. As mães passaram a desejar dar à luz em um ambiente extra-hospitalar, onde não teriam contato com possíveis infectados com a Covid-19. Além disso, também pelo modelo de nascimento que preza pelo respeito à fisiologia, ao corpo e às escolhas da mulher. No parto humanizado, a mãe é a protagonista e dita o ritmo do processo.
Não existem regras. As mães escolhem se querem receber massagens, técnicas de aromaterapia, andar ou descansar. Para receber o bebê, qualquer local da sala de parto é válido: na banheira, no chuveiro, na cama ou em pé. Na Casa, não há nenhuma intervenção médica ou anestésica no parto. Caso haja essa necessidade, ambulâncias 24 horas ficam à disposição para levar as gestantes ao hospital. “A dor é muito forte, uma das mais fortes que eu já senti, mas é uma dor de felicidade, não de sofrimento. Foi uma das experiências mais maravilhosas da minha vida”, diz Amanda.
Para ter um bebê na Casa Angela, é necessário seguir alguns critérios: a gravidez deve ser de baixo risco, a paciente deve gestar apenas um único bebê com exames de pré-natal apontando resultados normais, não ter sido submetida a parto cesárea anterior e não ter comorbidades, como diabetes e hipertensão, por exemplo. A recuperação da maioria das mães é rápida, com alta em 24 horas.
Desde a fundação da Casa, em 2009, nasceram 2 509 bebês na unidade. Um dos próximos a chegar é Bernard, primeiro filho de Clara Elice, moradora do Jardim Piracuama, na Zona Sul. A auxiliar de limpeza conta que participou dos cursos preparatórios para gestação do espaço — on-line, na pandemia —, que abordavam aleitamento materno, cuidados com o bebê, como o banho e a troca de fralda, a fisiologia do trabalho de parto e o puerpério, que são os quarenta dias pós-parto e que podem ser bem desafiadores para a mãe.
“Os cursos foram ótimos para mim, que sou mãe de primeira viagem. Eu não tinha muita informação. Adquiri mais conhecimento e fui perdendo o medo”, explica Clara. A jovem de 22 anos não planeja nada além de conforto, tranquilidade e a presença do seu companheiro para a chegada de seu bebê.
A cerca de 30 quilômetros da Casa Angela, na Vila Industrial, Zona Leste, outra casa de partos humanizados mudou a vida de várias mães — são as duas únicas unidades pelo SUS em São Paulo. Uma delas, Larissa Domingues, 34 anos, teve seus dois filhos na Casa do Parto de Sapopemba. Um dos motivos para buscar esse modelo veio após perder sua irmã para uma cesárea mal executada. “A minha primeira experiência, do Maui, hoje com 3 anos, foi de um amor e carinho fora do normal, por isso tive meu segundo parto lá”, conta Larissa.
A segunda bebê, Maya, de 58 dias, veio na onda crescente de nascimentos da casa do parto. Entre maio e dezembro de 2020, nasceram 219 crianças na unidade, um aumento de 85,6% em relação ao mesmo período do ano passado. Em 2021, 35 bebês nasceram no local, todos vindos de gravidez de baixo risco. A bola de pilates foi a melhor amiga de Larissa para ajudar a receber sua filha, com destaque adicional para a segurança e o conforto transmitidos pelos profissionais do lugar, segundo ela.
+Assine a Vejinha a partir de 8,90.
Publicado em VEJA São Paulo de 12 de maio de 2021, edição nº 2737