PM e USP vão ampliar a vigilância na Cidade Universitária
O objetivo é reduzir os problemas de violência no local
No primeiro dia de aula dos calouros da Faculdade de Odontologia da USP, o professor abriu um painel sobre a lousa. Mas, em vez de apontar a posição de molares na arcada dentária, indicou os locais da Cidade Universitária que deveriam ser evitados pelos estudantes para reduzir o risco de assalto. Também aconselhou os jovens a circular em grupos e sem celulares à mostra. As recomendações não bastaram para impedir que duas alunas do curso sofressem ataques, há quase dois meses. A primeira foi surpreendida por três homens em um estacionamento na Avenida Professor Lineu Prestes e escapou ao se refugiar em sua Mitsubishi Pajero, que tinha recebido blindagem de 30 000 reais. Minutos depois, uma colega não teve a mesma sorte: abordada em um ponto de ônibus, levou coronhadas no rosto e seu celular foi roubado.
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Os episódios mostram o crescimento dos índices de violência registrados no câmpus. Três estupros ocorreram na área da universidade somente em 2015 — no caso mais rumoroso, a vítima foi uma estudante de 17 anos, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, atacada em junho na Praça do Relógio. Em outra estatística triste, o número de furtos de veículo aumentou 380% no primeiro semestre deste ano em comparação ao mesmo período de 2014. A Cidade Universitária conta hoje com um esquema de segurança baseado em 75 câmeras, 47 guardas particulares e 25 policiais militares, contingente muito pequeno para cuidar de uma área equivalente a 365 campos de futebol.
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Na tentativa de melhorar a segurança de estudantes, funcionários e professores, um plano entrará em operação neste semestre. Até o fim do ano que vem, a universidade ganhará 450 câmeras, seis vezes mais que a quantidade atual. As imagens serão transmitidas a partir de uma sala de monitoramento para o Centro de Operações da Polícia Militar, na Luz. A Superintendência de Prevenção e Proteção da USP também criará núcleos de direitos humanos para atender vítimas de violência e lançará um aplicativo no qual os próprios alunos comunicarão ocorrências.
A principal mudança, no entanto, envolve um sensível aperfeiçoamento do patrulhamento da Polícia Militar. A corporação vai inaugurar um prédio vizinho à reitoria, onde passará a comandar até 120 agentes. Todos usarão colete fluorescente, com os símbolos da USP e da PM, e terão o apoio de quatro motos e dois carros, o dobro da frota atual. Esse novo grupo está sendo formado principalmente por jovens, vários deles universitários, treinados em conceitos de “polícia comunitária”, considerada menos agressiva.
Em aulas de direitos humanos, por exemplo, os cadetes analisaram casos de abuso de autoridade, como o do ex-policial Otávio Lourenço Gambra, o Rambo, acusado de torturar e matar um homem na Favela Naval, em Diadema, em 1997. Antes de começarem a atuar, eles serão apresentados pessoalmente a professores, funcionários e em centros acadêmicos. “A intenção é que seja uma polícia amiga da USP”, diz o superintendente de prevenção e proteção da universidade, José Antônio Visintin.
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Como sempre ocorre quando se discute a possibilidade de soldados reforçarem a patrulha, certas alas da comunidade universitária criticaram o plano. Alguns parecem querer discutir seriamente o assunto. “A PM cumpre um papel mais como órgão de repressão do que de segurança”, reclama Julia Forbes, uma das integrantes do Diretório Central dos Estudantes. Em maio, durante protesto contra o corte de verbas na universidade, uma aluna foi agredida por um policial, com spray de pimenta e um soco. O episódio acabou registrado em vídeo. Segundo a cúpula da PM, o caso representou uma exceção, e o responsável foi afastado. “Não vamos inibir nenhuma forma de expressão social ou política, e sim prevenir crimes”, garante o coronel Kenji Konishi, responsável pelo policiamento na área. Entre os estudantes e funcionários envolvidos no debate, além dos ingênuos de plantão, há a turma de interessados na manutenção da baderna e da permissividade no consumo de drogas, comum no local.
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Muitos alunos não fazem ressalvas à chegada do reforço. Eles esperam que casos como o do estudante Bruno Meller não voltem a se repetir. Ele sofreu uma tentativa de assalto, em junho, ao caminhar pelo câmpus à noite. Um homem de bicicleta aproximou-se, levantou a camisa como se fosse sacar uma arma e pediu que ele passasse o celular. Nervoso, o jovem fugiu. Desde então, tem voltado para casa correndo: “Passo o tempo todo olhando para os lados. Isso precisa melhorar”.
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