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José Serra, o poeta da Mooca

O perfil do candidato do PSDB à prefeitura

Por Daniel Bergamasco
Atualizado em 5 dez 2016, 16h44 - Publicado em 19 out 2012, 16h36

Em um campinho de futebol às margens da Represa de Guarapiranga, na Zona Sul, no domingo (14), José Serra decidiu bater um pênalti diante dos fotógrafos. “Dessa vez, eu me concentrei bastante para não fazer cara feia na foto”, conta, em referência ao já célebre clique de campanha no primeiro turno no qual arregala os olhos ao chutar uma bola com tanta força que até seu sapato voa para dentro da trave (veja a entrevista ao final da matéria). Passa das 2 da madrugada quando um assessor lhe mostra no iPad o resultado do esforço. Decepção. “Ficou pior ainda!”, conclui, caindo na risada e tentando levar na brincadeira as caretas involuntárias desses flagrantes indesejados. Em outra cena bem comentada, uma jovem atirada o cercou durante uma caminhada e tascou-lhe um beijo na boca. “Disseram que fiquei sem jeito, mas queriam o quê? Que eu tivesse retribuído?”

+ Os candidatos por trás do paletó

Conhecido por ser um homem culto e por sua longa carreira na vida pública, com feitos como a aprovação da Lei Antifumo e a criação dos remédios genéricos, Serra se empenha em mostrar que, além de ter uma reconhecida experiência política e administrativa, é um sujeito informal, “sem se levar 200% a sério”. Tanto que o assanhado selinho foi aproveitado em um vídeo preparado por sua equipe de marketing para veiculação exclusiva na internet, enquanto no programa de TV uma eleitora o chama de “carequinha gente-fina” — tudo com o propósito de enfatizar a aproximação com o público e relembrar, quando possível, que o candidato é um paulistano como tantos outros, nascido em família de classe média baixa na Mooca (hoje, seu patrimônio declarado é de R$ 1,5 milhão). “Pensam que meu pai era rico”, diz.

Veja 10 curiosidades sobre o TUCANO:

1- Foi bom aluno, mas recebeu suspensão diversas vezes, uma delas por chutar objetos. “Eu era tremendo, muito sapeca mesmo!”

2- Ator na juventude, protagonizou a peça Vento Forte para Papagaio Subir, de José Celso Martinez Corrêa

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3- No exílio no Chile, morou com a família por seis meses em uma sala da embaixada italiana. Ao deixarem o país rumo aos Estados Unidos, todos foram escoltados por soldados do ditador Augusto Pinochet. “Luciano, que era bebê, tinha uma arma apontada para a cabeça.”

4- Adora poesias e frequenta saraus com atores na casa do diretor Ivam Cabral, onde atravessa a noite recitando versos de autores como Fernando Pessoa

5- Há cerca de cinco anos, gravou um CD no qual declama poemas de Castro Alves

6- Na porta do quarto, tem uma balança na qual se pesa com frequência

7- Defensor da alimentação saudável, dá puxão de orelha se a equipe de campanha encara uma pizza de madrugada

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8- Tem dificuldade em comprar chapéus que lhe sirvam

9- Quando governador, por vezes servia, ele mesmo, água e refrigerante aos convidados do Palácio dos Bandeirantes

10- “Adora uma farmácia”, conta a filha, Veronica. “Se alguém diz que tem dor de barriga, ele descreve um remédio de última geração, cita até o princípio ativo”

Francisco, imigrante italiano, do qual Serra é filho único, vendia frutas no Mercado Municipal. Bom aluno em português e matemática, mas com notas vermelhas em comportamento (“Bati o recorde de suspensões”), ele descobriu sua vocação política quando estudava engenharia na Escola Politécnica da USP. Em 1962, aos 20 anos, elegeu-se presidente da União Estadual dos Estudantes (UEE) e em seguida assumiu a presidência da União Nacional dos Estudantes (UNE). Devido à militância, acabou exilado em 1964, primeiro no Chile, onde conheceu a bailarina e psicóloga Monica Allende, com quem se casou e teve os filhos Veronica e Luciano. Continuava a denunciar torturas que aconteciam no Brasil e, com o golpe militar que levou o general Augusto Pinochet ao poder, em 1973, passou a ser perseguido. A família chegou a viver seis meses em uma sala da Embaixada da Itália em Santiago. De lá, todos saíram escoltados para o aeroporto e foram morar nos Estados Unidos. Só retornariam ao Brasil em 1978. Depois de alguns anos como professor da Unicamp, elegeu-se deputado e senador. Mais tarde, foi ministro do Planejamento e da Saúde na gestão Fernando Henrique Cardoso. Eleito prefeito em 2004, deixou o cargo em 2006 para se candidatar a governador, saindo vitorioso no primeiro turno. Em 2010, candidatou-se pela segunda vez à Presidência da República e, como em 2002, perdeu no segundo turno.

 

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Nas passagens pelo Executivo seus hábitos notívagos se tornaram lendários. Uma das diversões de seu secretariado era fazer apostas sobre quem havia recebido e-mail dele em horário mais avançado — os “vencedores” falavam em 4, 5, 6 da manhã. “Conforme o dia passa, eu vou acendendo”, admite. O amigo Andrea Matarazzo, recém-eleito vereador, é testemunha dessas sessões coruja. Uma vez, os dois voltavam do cinema às 2 da madrugada quando avistaram um rapaz pichando um muro. Serra, então prefeito, desceu do carro e puxou conversa com ele para tentar saber o que o levava a fazer aquilo. “Ele se empolgou e a conversa durou mais de meia hora”, recorda Matarazzo.

É também enquanto a noite avança que Serra cultiva outra de suas paixões, a poesia. Ele costuma ir aos jantares-saraus promovidos pelo diretor de teatro Ivam Cabral. Esteve em um deles com Alexandre Schneider no dia 30 de junho, quando o anunciou como vice em sua chapa. “Serra recita longos poemas de cor, de autores como Fernando Pessoa, e faz amizade com os atores jovens, de 20 e poucos anos”, conta Cabral. O candidato é ainda conhecido entre os amigos pela patrulha em favor da comida saudável. “Ele ficava horrorizado quando via a equipe comendo pizza às 3 da manhã, e então recomendava que comessem uma fruta”, relata Soninha Francine, coordenadora das plataformas de internet na campanha presidencial de 2010 e concorrente à prefeitura pelo PPS no primeiro turno de 2012. Serra confirma a fama. “Controlo o que vai no prato, mas não deixo de comer. Mais do que sono ou cansaço, a fome me tira do sério”, diz ele, com uma ressalva: mesmo quando não almoça direito, o mal-estar passa assim que pisa no estúdio para gravar os programas da eleição, da qual, acredita, sairá vencedor. “Estou muito confiante.”

  • A São Paulo do TUCANO

 

“Sou mais bem-humorado do que as pessoas imaginam”

Qual é o grande orgulho de sua carreira política? Ter conseguido fazer muitas inovações na vida pública. Por exemplo: quando deputado, a criação do Fundo de Amparo ao Tra balhador (financiador do seguro-desemprego e do abono salarial), uma ideia da economista Beatriz Azeredo. Ou, como ministro da Saúde, os medicamentos genéricos, sugeridos pelo ex-deputado Ronaldo Cezar Coelho. Tenho carinho especial pela Rede Lucy Montoro (de reabilitação de pessoas com deficiência), pois foi uma ideia de fato minha, assim como o Instituto do Câncer (Icesp), ambos no período em que fui governador. Às vezes, enquanto estou dormindo, projetos assim surgem durante um sonho.

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Em qual aspecto seu vice, Alexandre Schneider, é melhor do que o senhor? Brinco que ele é mais bonzinho, afável 100% do tempo, não se irrita. Eu tendo a ser veemente em uma discussão, uma argumentação, pois acredito muito no poder da razão, de explicar para convencer.

Qual é a maior qualidade de Fernando Haddad? (Longa pausa) Não me considero dono das virtudes, e certamente o Fernando tem virtudes. Época de campanha é tumultuada para avaliar com objetividade. Eu o achava um homem simpático, mas a eleição produz uma nuvem de poeira quente na visão dos candidatos entre si.

Por que Celso Russomanno subiu tanto nas pesquisas de intenção de voto e por que caiu tão rapidamente? Acho que cresceu devido à grande exposição na Rede Record, ao traquejo na televisão e por estabelecer um diálogo muito direto com as pessoas. E caiu pela necessidade de ter respostas mais elaboradas, além do pouco tempo de que dispunha no horário eleitoral gratuito.

Qual foi o pior dia da campanha até agora? O primeiro debate do primeiro turno, na Band, foi chatíssimo. Não por causa da emissora, mas porque eu estava ruim da garganta e havia oito candidatos, com aquela estrutura rígida. Debates com tanta gente devem ter a maior densidade de mentiras no mundo. E você não tem condição de desmenti-las, não tem nem o TRE para recorrer. Eu ficava entediado em alguns desses encontros.

Dos pedidos que recebeu na eleição, qual foi o mais inusitado? É frequente ouvir coisas que não estão ao meu alcance, alguém pedindo uma casa, ou com demandas da esfera federal, como problemas de aposentadoria. Mas entendo: a pessoa está desesperada e vê em você um homem público. Quando possível, tento ajudar, dar a orientação correta, ligar para algum secretário, agilizar o que for possível.

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Que foto mais o constrangeu? Ah, isso tem aos montões. Na do futebol, quis compensar a falta de técnica colocando toda a força no chute, para impressionar a garotada. Aí o sapato foi junto (risos). Doeu na hora e fiz careta, mas tive uma boa surpresa com a altura atingida pela perna e com a torção do corpo, que ficou perfeita. A foto em que quase caio do skate também, obviamente, não é uma cara boa. O Eduardo Paes, prefeito do Rio, chegou a cair de fato no chão numa situação semelhante, mas com uma cara melhor do que a minha. Sou mais bem-humorado do que as pessoas imaginam.

Que palavra melhor define sua reação ao passar para o segundo turno: alívio ou desforra? Nenhuma delas. O resultado mostrou que minha percepção sobre a eleição estava correta.

Em caso de vitória, de que forma pretende comemorar? Em geral celebro com o partido, a família, nada especial. No dia seguinte, quero passar bastante tempo com meus netos, o que não tenho feito nesta época tanto quanto gostaria.

Se não vencer, como será a primeira semana pós-eleição? Não penso nisso.

Onde São Paulo é menos São Paulo, para o bem ou para o mal? Responder me faria perder votos.

Qual é sua cidade predileta no exterior? Buenos Aires. Mas, pensando em metrópoles que funcionam bem, citaria Londres e Paris.

Quando chorou pela última vez? Acho que as lágrimas não chegaram a cair, mas me emocionei muito no santuário do padre Marcelo Rossi ao ver dom Fernando Figueiredo (bispo de Santo Amaro). Ele visitou minha mãe, Serafina, antes de ela morrer, já na fase de agonia, a pedido de minha tia, que não contou se tratar da mãe do governador, meu cargo na época (2007).

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