Ouvi certa vez a história de um tarimbado comediante paulistano que levou um jovem aspirante a um tradicional salão de humor no interior do estado. No momento de maior expectativa do evento seriam apresentadas piadas por renomados profissionais. O veterano e o aprendiz chegaram cedo ao auditório para garantir suas poltronas. Mas, para surpresa do novato, a primeira piada se resumiu à declamação do número 53. Um humorista de certa idade se apresentou ao microfone e disse tão somente estas palavras: “Cinquenta e três”. O mestre do jovem, o tarimbado comediante, sentado ao seu lado, riu com polidez, mas sem exagero, e bateu palmas.
O calouro não entendeu nada. Logo depois chega outro comediante ao microfone e diz, grave e pausadamente: “Setenta e dois”. O humorista mais experiente apresentou uma reação parecida à que teve com o número 53. O jovem continuou sem entender nada. Não fazia sentido aquilo. Enquanto buscava em sua cabeça uma explicação plausível, aparece um terceiro humorista, o grande astro da noite, segundo ouvira falar. O profissional diz ao microfone: “Noventa e três”. Ao contrário dos outros números, este provoca no mestre tarimbado um excesso de riso. Perde o controle. Quase cai da poltrona. Chega a se engasgar.
No táxi, no caminho de volta ao hotel, o jovem reúne coragem e pergunta ao velho comediante o sentido das apresentações a que acabara de assistir. “Não expliquei?”, pergunta preocupado o mestre. “Coitado! Você não deve ter entendido nada”, continua. “É simples. Como nós todos já conhecemosas piadas, resolvemos dar um número a cada uma. Assim não é preciso contá-las de novo. Economiza tempo.” O jovem, hesitante, comenta: “Ahh, tá”. Depois de mais alguns quarteirões, volta-se para o veterano e pergunta: “Mas, se é assim, porque o senhor deu tantas risadas com a 93?”. O humorista responde: “A 93? Essa aí eu não conhecia”.
Lembrei-me dessa piada,um dos poucos exemplos da escola surrealista de humor, ao mergulhar na edição de janeiro da revista americana Vanity Fair. A publicação traz o astro de Hollywood Judd Apatow, de Ligeiramente Grávidos e de Bem-vindo aos 40, prometido para breve em São Paulo, como editor convidado. Se você não conhece a figura, vale a pena procurar um dos seus filmes. Assisti ao trailer do novo longa e fiquei bastante curioso. Dá vontade de vê-lo imediatamente.
Quase tudo nesse número da Vanity Fair é hilário. Dá um pouco de inveja. Não bastava ser um ator, diretor e produtor de cinema talentosíssimo? Precisa também saber editar revistas? O meu artigo favorito é uma entrevistacom o comediante Chris Rock. Ele responde a uma pergunta que me é cara: como falar da família no texto ou no palco? É algo que tento fazer aqui na VEJA SÃO PAULO, por exemplo, sem nunca machucar ninguém. A teoria de Chris: “Piadas sobre seus filhos são sempre melhores do que piadas a respeito dos filhos do seu irmão”. E continua a argumentação, dando um exemplo sobre sua própria casa: “Gosto de dizer que há por lá minha senhora, que é uma mulher encantadora, mãe dos meus filhos. E há, também, a minha mulher das comédias, que é uma doida varrida”.
A revista discute, ainda, a aproximação do humor britânico com o americano, através da TV a cabo e da internet. Tenho uma tese de que a globalização da comédia pode poupar o mundo de guerras e conflitos desnecessários no futuro. Veja o vídeo hilário Gangnam Style, no qual o rapper sul-coreano Psy galopa um cavalo imaginário. O negócio rodou o planeta todo. Depois dessa pequena obra-prima da risada, não consigo imaginar um ato de agressão à Coreia do Sul. Todos diriam: é o país do Psy! Só o humor nos salva de nós mesmos.
Um ótimo 2013!
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