Luccas Papp: do SBT ao drama intenso
Com apenas 27 anos, o ator e dramaturgo se destaca com a peça 'O Ovo de Ouro', sobre judeus no Holocausto, escrita por ele aos 21
Em um tempo em que as revelações teatrais, na média, ultrapassam bem os 30 anos, o ator e dramaturgo paulistano Luccas Papp, de 27, chama atenção não apenas pelo talento, mas como um artista versátil e em plena atividade nos últimos sete anos. Teve treze textos montados em São Paulo desde 2012 e, pelas suas contas, atuou em trinta peças.
Ele é o autor do drama O Ovo de Ouro, que encerrou temporada no Sesc Santo Amaro no dia 15 e volta ao cartaz em 31 de janeiro no Teatro Porto Seguro. Os ingressos estão à venda por 50 e 70 reais. Trata-se da história de um velho judeu (interpretado por Sérgio Mamberti) que, no Holocausto, serviu ao sonderkommando, unidades que reuniam prisioneiros para trabalhar nas câmaras de gás e nos crematórios de Auschwitz.
A escolha pelo tema denso surpreende mais quando se sabe que a dramaturgia foi criada por Papp aos 21 anos, inspirado nas ideias do trabalho de conclusão de curso da faculdade de filosofia da USP. “Guardei a peça na gaveta porque acreditava no seu potencial e sonhava vê-la como uma grande produção, que contasse com atores reconhecidos e atingisse plateias numerosas”, explica ele, que, no palco, defende o papel de Mamberti na juventude.
Foi na porta do produtor Ricardo Grasson que Papp bateu para viabilizar o projeto. “O que me impactou, além da saudável ambição de um jovem, foi ler um texto que imediatamente criou uma série de imagens na minha cabeça, próximo de uma linguagem cinematográfica”, afirma Grasson, também responsável pela encenação. Os espetáculos previstos para 2020 são tratados como realidade. Em março, o artista divide o palco do Teatro Itália com a atriz Fabi Bang em O Canto de Ninguém, que terá direção de Kleber Montanheiro e coordenação musical de João Carlos Martins. No segundo semestre, pretende contracenar com a atriz Luisa Arraes e um elenco numeroso em Pais, outro de seus dramas, comandado por Flavio Tolezani.
Luccas Papp poderia ser mais uma criança bonitinha e extrovertida que se perde na poeira. Aos 7 anos, depois de figurar em campanhas publicitárias, virou participante fixo do programa infantil Pequenos Brilhantes, apresentado por Moacyr Franco no SBT. Por lá, trazia na ponta da língua respostas a perguntas sobre futebol, outra paixão de sua vida, e entrevistou os técnicos Luiz Felipe Scolari e Vanderlei Luxemburgo. Sua mãe, Débora Papp, largou o emprego em um banco para agenciá-lo. “Ele se queixava de sono e fome durante as filas para os testes, mas enfiei na cabeça que tudo daria certo e não desanimei, mesmo quando atravessamos quase um ano sem receber propostas de trabalho”, conta ela.
O registro de ator profissional veio aos 16 anos e, na esteira, Papp passou a dar aulas de teatro na Fundação Bradesco, em Osasco, cidade onde se criou e vive até hoje. “Em 2020, quero dar entrada em um apartamento para morar em São Paulo”, revela ele, que dirige uma BMW 2012 comprada com o “próprio dinheiro”. “Meu pai é bancário e nunca faltou nada lá em casa, mas também não sobrou”, completa.
Com o início das gravações da novela infantil As Aventuras de Poliana, em outubro de 2017, Papp viu a agenda apertar e pediu demissão da Fundação Bradesco. Criou, então, uma oficina de interpretação, que conta com 65 alunos e lhe permite horários flexíveis. Seu personagem no folhetim do SBT, o Mosquito, é um trombadinha em fase de redenção. “Meu papel tem crescido nas últimas semanas, mas acho difícil levar os telespectadores ao teatro”, reconhece.
O sucesso da trama, que ainda está no ar, deve render uma segunda temporada e, se Papp for mantido no elenco, gerar a renovação de seu contrato. Enquanto isso, ele finaliza um projeto dramatúrgico corajoso, a adaptação teatral de Incidente em Antares, romance de Erico Verissimo. Ambicioso esse rapaz.
Publicado em VEJA SÃO PAULO de 25 de dezembro de 2019, edição nº 2666.