A pesquisadora paulista que virou referência internacional em moda
Estudos de Hanayrá Negreiros abordam as ligações do universo com a arte, a diversidade e a religião
De Osasco para o mundo. Um dos nomes mais proeminentes dos estudos da moda no Brasil vem do município da Grande São Paulo. A pesquisadora Hanayrá Negreiros, 32, ganhou destaque com seus recortes e costuras sobre o tema, que vão desde as ligações com as artes visuais até a perspectiva racial e histórica, como as origens nas religiões de matriz africana.
Ela acaba de escrever um texto que fará parte de um livro do Instituto de Tecnologia da Moda (FIT), de Nova York, com publicação prevista para o início do próximo ano, e foi anunciada como uma das curadoras do Biennale of Fashion, do State of Fashion, uma organização da Holanda. Em diálogo com o evento principal, que acontece na cidade de Arnhem, a bienal de moda realizará ações simultâneas em São Paulo, Nairóbi (Quênia) e Bangalore (Índia) entre maio e junho de 2024 — por aqui, coordenadas pela pesquisadora.
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Esse caminho de sucesso começa logo na infância. Hanayrá é de uma família de costureiras e alfaiates, o que lhe possibilitou ter um contato próximo com o universo da moda desde cedo. “Fui aquela típica criança que fazia roupinha para boneca. Aprendi a fazer croquis de maneira autodidata”, ela conta. “Cresci na casa da minha avó costureira, com as inúmeras ferramentas dela.”
Quando chegou a hora de ingressar no ensino superior, teve todo o apoio da família quando optou por cursar Negócios da Moda, na Universidade Anhembi Morumbi. “Durante a graduação, a pesquisa veio naturalmente, gosto de escrever e fazer investigações”, diz. Formou-se em 2013 e teve que encarar uma difícil realidade. “Na época, o mercado não estava preparado para me receber, uma mulher negra na moda”, afirma. Sua aposta foi seguir de vez o campo de atuação da pesquisa, em diálogo com outras áreas.
Foi nas Ciências da Religião que ela se debruçou mais a fundo, em seu mestrado na PUC-SP. Seu objeto de pesquisa foi a relação entre indumentárias, memórias e o terreiro de candomblé. “Esses assuntos foram costurados de forma orgânica, sempre me interessei por estéticas negras, por causa da minha ancestralidade”, explica Hanayrá.
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O retorno foi positivo: “Descobri que as pessoas se interessavam pelos assuntos que eu trabalhava na academia. Fui convidada para cursos, palestras, e fui gostando de dar aula”. O viés precursor da pesquisa a fez alçar grandes voos, incluindo chegar ao cargo de curadora-assistente do Masp, em uma parceria do museu com a marca Renner, para a criação de roupas por duplas de artistas e estilistas, que terminou em 2022. A colaboração foi tão frutífera que Hanayrá continua dando aulas no Masp Escola.
Para a pesquisadora, a moda tem mais do que apenas uma relação com a arte. “Entendo a moda como uma linguagem artística, especificamente o trabalho autoral e manual, de costureiras, alfaiates. Essas pessoas são artistas”, afirma.
Além do Masp Escola, será possível aprender mais com Hanayrá em um curso e uma palestra com a sua participação no Sesc Pompeia neste sábado (25), às 14h30 e 19h, respectivamente.
Publicado em VEJA São Paulo de 24 de novembro de 2023, edição nº 2869