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Bairro de reinvenções: um guia cultural e gastronômico do Bom Retiro

Conheça a efervescência coreana, boliviana, judaica e, claro, paulistana da região, que terá a festa de rua Eruv no próximo dia 24

Por Tomás Novaes
Atualizado em 16 ago 2024, 12h45 - Publicado em 16 ago 2024, 06h30
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Yara Hwang, sócia da Aigo Livros: novidade especial na região (Roberto Setton/Veja SP)
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Sair a esmo pelos caminhos do Bom Retiro, onde nasceu o fotógrafo Bob Wolfenson, pode levar você a cenários que mais parecem Seul do que São Paulo. Ou, quem sabe, La Paz. Até Atenas, alguns diriam.

Bem, não é de hoje que o bairro é multicultural, mas novidades não param de transformar a região que, no próximo dia 24, estará em festa com a terceira edição do Eruv, evento com mais de trinta iniciativas locais e programação aberta e gratuita, na rua.

Um dos lugares recentes mais especiais da vizinhança, aberto em julho de 2023, é a Aigo Livros. “É a primeira livraria do bairro em quarenta anos”, diz Yara Hwang, 38, sócia ao lado de Agatha Kim e Paulina Cho. As proprietárias são filhas de pais coreanos e a curadoria tem como foco justamente histórias de imigrantes, das mais variadas culturas.

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A fachada da livraria: lugar único no bairro (Roberto Setton/Veja SP)

“Fazemos um mapeamento de tudo que é publicado em relação a livros diaspóricos, além daqueles que recebemos das editoras e, claro, indicações de clientes”, explica Yara.

O espaço simpático fica no Centro Comercial do Bom Retiro, que também abriga um raro brechó bom- retirense, o Telúrica Vintage. “O meu pai é coreano e a minha mãe é paraguaia, eles se conheceram em Assunção e vieram para o Bom Retiro”, conta Gina Kim, 33, que criou o negócio há cerca de nove anos, e, desde 2022, tem sua loja física.

“Na infância, não era muito fácil, porque era muito comercial. Sentia que era lugar de passagem, mas percebo que hoje as pessoas estão vendo mais como uma opção de moradia”, diz.

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Caminhando pelas ruas, são muitos os cafés por quarteirão, em grande parte tocados pela comunidade coreana, como a Um Coffee Co. Outra cafeteria na região, a Go Coffee é contígua à loja Two Two 4 U, que vende pôsteres e cadernos temáticos de bandas de K-pop e atores coreanos.

Perto dali, o mercado Otugui é o maior estabelecimento para comprar itens importados, e parada obrigatória para quem visita o bairro pela primeira vez. Também vale passar pelos restaurantes clássicos, como o grego Acrópolis e o judaico Shoshana Delishop.

Esse, inaugurado em 1991, ganhou nova gestão e foi reaberto em 2022, pelas mãos de Arthur Hirsch, Inês Mindlin Lafer e Benjamin Seroussi, junto de um grupo de investidores. “Quando soube que iria fechar, na pandemia, reuni 25 pessoas e compramos. É um lugar carregado por toda uma comunidade”, conta Benjamin, 44, curador e gestor cultural francês que mora em São Paulo há vinte anos.

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O proprietário também é um dos diretores da Casa do Povo, que fica a poucos passos dali. O centro cultural foi inaugurado pela comunidade judaica em 1953 e, há cerca de dez anos, passa por um momento de renovação.

“O espaço é ligado a uma corrente judaica progressista, secular, que veio reinventar o mundo perdido. Um centro cultural, um teatro que virou palco da cena experimental, uma escola construtivista. O lugar foi se reinventando, e nós continuamos isso hoje”, diz Benjamin.

Atividades das mais variadas acontecem semanalmente no edifício, como aulas de boxe e ioga não convencional. “Pessoas gordas podem fazer ioga, é uma filosofia de inclusão. Mas só vemos corpos magros, brancos, padrões”, diz Vanessa Joda, 44, fundadora da escola Yoga para Todes, que existe desde 2016 e hoje ocupa o prédio às terças e quintas.

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“Se ioga é para todo mundo, então vamos fazer um espaço onde as pessoas se sintam à vontade para se entregar à prática. Nas aulas, temos uma diversidade muito grande de pessoas, a galera trans, preta, gorda”, conta Vanessa.

A Casa do Povo também abriga a cooperativa de costura Flor de Kantuta, formada por mulheres bolivianas. “É um símbolo da Bolívia, uma plantinha que cresce em toda terra e estação. E a gente, como imigrante, também se adapta a qualquer lugar”, explica Jeovanna Huanca, 46, integrante do coletivo, que trabalha em diferentes frentes, inclusive em colaboração com artistas plásticos.

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Jeovanna Huanca, da cooperativa Flor de Kantuta: coletivo de mulheres bolivianas (Roberto Setton/Veja SP)

A vizinhança ainda abriga espaços como o Arquivo Histórico Municipal, o Sesc Bom Retiro e o restaurante paraguaio Tembi’u, que estarão entre os mais de trinta representantes bom-retirenses da festa de bairro Eruv.

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“O nome é um conceito judaico ligado ao dia de descanso, que propõe um território temporário entre público e privado. A gente atualiza isso em algo não religioso, para pensar uma festa cujo mote é a desaceleração e a presença”, explica Caio Lescher, responsável pela programação da Casa do Povo, que organiza a terceira edição do evento.

As atividades vão ocupar as calçadas e parte das ruas Três Rios e Correia de Melo, com almoço coletivo, competições de xadrez, bingo, demonstrações de boxe e sumô e apresentações musicais, das 9h às 19h do sábado (24). É a ocasião perfeita para conhecer ou redescobrir esse bairro cosmopolita. ■

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Fotografia de Bob Wolfenson, de 1971: registro em longa exposição da varanda do prédio onde morou, na Rua Afonso Pena (Bob Wolfenson/Divulgação)

Publicado em VEJA São Paulo de 16 de agosto de 2024, edição nº 2906

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