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CASACOR 2021: Conheça 9 projetos que carregam lições da pandemia

Arquitetos incorporam o que aprenderam com a crise de saúde e apostam no conforto; evento deste ano tem novo endereço

Por Tatiane de Assis Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 27 Maio 2024, 19h33 - Publicado em 17 set 2021, 06h00
A imagem mostra os arquitetos participantes da CASACOR 2021. Eles estão distribuídos em dois sofás e alguns em pé.
Projeto: parte dos profissionais da mostra (Leo Martins/Veja SP)
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A CASACOR 2021 tem um novo endereço: o Parque Mirante, anexo ao Allianz Parque, aberto especialmente para o evento (a inauguração está prevista para 2022). O tema dos 58 projetos é A Casa Original e selecionamos nove deles que buscam lições da crise de saúde e apontam na direção do conforto

A MEDIDA DO CORAÇÃO

Na residência que a arquiteta Melina Romano, 37 anos, montou nesta edição da CASACOR, os visitantes receberão um smartwatch para medir as batidas do coração, os passos dados e o tempo gasto em cada ambiente. Parece coisa da série Black Mirror, e é mesmo. O resultado da análise tecnológica, feita em parceria com empresa de tecnologia, é traduzido em um texto que informa os cantinhos e objetos que mais chamaram a atenção das pessoas monitoradas. São pistas para pensar em uma morada mais aconchegante.

O projeto de Melina tem ambientes divididos por cortinas de fios: sala, escritório, quarto, banheiro e uma cozinha com uma mesa de tora de madeira de 2,8 metros de largura (foto abaixo). Sugere que o isolamento social deixou uma importante lição: reunir pessoas é bom demais. A falta de divisórias mais sólidas é também aprendizado da pandemia: tudo está à vista e os ambientes se comunicam, reduzindo aquela sensação de uma leve claustrofobia.

A imagem mostra o ambiente da cozinha, divido por cortinas de fio.
Cozinha: mesa de tora de madeira de 2,8 metros de largura (Leo Martins/Veja SP)
A imagem mostra Melina sentada em um assento em forma de U acolchoado.
Melina Romano: cozinha para reunir foi lição da pandemia (Leo Martins/Veja SP)

NA COMPANHIA DA CERÂMICA

A Casa Olaria, criada pelo arquiteto Nildo José, 33 anos, traz a sensação de “pé no chão”. É preciso tirar os sapatos para sentir a textura do piso, feito com blocos de cerâmica originados da extração e queima de argila. Se você não se sentir à vontade para estar descalço, pode também passar as mãos pelas paredes feitas do mesmo material. Só não vale subir em uma das cadeiras para sentir o revestimento no teto.

Brincadeiras à parte, é importante destacar as referências que o profissional baiano trouxe e diluiu a seu modo. O teto quadriculado da sala nos lembra a cobertura da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, feita por Vilanova Artigas (1915-1985) e usada por Paulo Mendes da Rocha (1928-2021) na reforma da Pinacoteca e no Museu da Língua Portuguesa — se os ilustres pares preferiram concreto e metal, Nildo optou pela madeira.

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O minimalismo cromático da cozinha leva à arquitetura japonesa. Um de seus expoentes, o renomado Tadao Ando, marcou o debate sobre a relação entre luz e sombra, que norteia a iluminação da residência. Ainda na cozinha, a cadeira Girafa, criada por Lina Bo Bardi (1914-1992), traz a ítalo-brasileira para bailar ao lado de quarenta artistas espalhados pela casa, como o pernambucano Nado, autor de algumas das cerâmicas em exibição na sala de estar.

A imagem mostra Nildo sentado em uma poltrona. Ao fundo, peças de cerâmica de seu ambiente.
Nildo José: peças em cerâmica e mesa que lembra a terra (Leo Martins/Veja SP)
A montagem mostra duas fotos. À esquerda, uma mesa simples, com duas cadeiras tripés e encosto mínimo. À direita, a foto de algumas peças de cerâmicas, com um vaso com plantas dentro.
Cozinha minimalista: luz, sombras e a cadeira Girafa, criada por Lina Bo Bard (Leo Martins/ MCA Estúdio/Veja SP)

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VISÃO AO REDOR

Léo Romano, 50 anos e veterano da CASACOR São Paulo, com seis participações, revela o súbito encanto do horizonte em tempos de pandemia. A estrutura do espaço que criou, a pedido da Deca, traz ripas de madeira carambá. O espaçamento entre elas favorece a ventilação e, de quebra, propicia uma bela vista das chaminés da Casa das Caldeiras, estrutura remanescente das Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo, marco da industrialização da cidade.

“Meu projeto é uma espécie de ateliê (coletivo), com um lounge cercado por estações de trabalho, que imaginei serem ocupados por profissionais de áreas como perfumaria, artes plásticas e por aí vai”, detalha Romano. Ele tornou o vestiário, com dezesseis chuveiros, em um espaço de contemplação. Junto a cada um deles, o arquiteto exibe um vídeo em looping com dois bailarinos em uma coreografia de dança contemporânea, idealizada por Henrique Rodovalho, diretor da premiada companhia Quasar.

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A atmosfera criativa, acredita Romano, tem a ver com questionamentos feitos durante a crise pandêmica: “Antes, o cliente comprava uma poltrona de 15 000 reais simplesmente porque era bonita, mesmo sem usar muito. Após ficar em casa, ele agora olha para o conforto”, diz o arquiteto. É de Romano, ainda, o mobiliário que os visitantes vão ver por lá. Ele desenhou sofás com encostos e assentos feitos com boucle de algodão (foto abaixo) e braços de madeira do tipo liptus. “Cada vez mais, os arquitetos parecem querer ter o domínio completo do projeto, o que vai além de criar os conceitos dos ambientes”, diz Livia Pedreira, presidente do Conselho Curador da CASACOR.

A imagem mostra uma sala com sofás e estruturada majoritariamente com madeiras, como em seus corrimões.
Projeto: estrutura com ripas de madeira carambá e sofás autorais (Leo Martins/Veja SP)
A imagem mostra Leo Romano de braços cruzados em um ambiente com estrutura de madeira.
Léo Romano: veterano da CASACOR São Paulo (Leo Martins/Veja SP)

CASA PARA DOWNLOAD

Dois palitinhos, mais um como telhado e, em cima, um triângulo. O desenho, tão básico, lembra a estrutura replicável da Casa LG ThinQ (foto ao lado), do escritório Guto Requena em parceria com o Pax. Arq, de Victor Paixão e Paula Sertório. O projeto está aberto na internet para ser baixado e modificado.

São dois pórticos de metal com faces de vidro. A eles se somam, por encaixe e sucessivamente, chapas de madeira do tipo pínus cortadas em uma máquina CNC (tecnologia de altíssima precisão). Para finalizar a armação, telhas de fibras vegetais na cor marrom, impermeáveis. O custo da construção, não revelado pelos escritórios, é maior do que no método tradicional.

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“A economia se dá a longo prazo, já que a madeira tem maior durabilidade e há redução da emissão de CO2 durante o processo”, aponta Ludovica Leone, 36, sócia de Guto Requena. A morada tem em percurso contínuo sala, cozinha e quarto, no qual vemos a Cama Sonhadora (foto), que combina de modo ondulado chapas de madeira.

A imagem mostra Ludovica Leone setando em uma cama.
Ludovica na Cama Sonhadora e os arquitetos da reportagem: madeira cortada em máquina CNC (Leo Martins/Veja SP)
A imagem mostra uma série de pessoas à frente da casa tecnológica.
Casa LG ThinQ: economia a longo prazo (Leo Martins/Veja SP)

BOLO DE CHOCOLATE

Gabriela de Matos, 35 anos, nasceu na região do Vale do Rio Doce, em Minas Gerais. Têm conterrâneos famosos, como o fotógrafo Sebastião Salgado e o líder indígena Ailton Krenak. Assina o lounge Agô, que está no térreo, um dos ambientes abre-alas da CASACOR 2021. É a primeira arquiteta, autodeclarada negra, em 25 anos de evento, segundo a organização. “Sério?”, pergunta ela sobre o dado. “Fico feliz de esta edição estar aberta a outras criações e espero que haja mais profissionais negros aqui no futuro.”

Em seu ambiente, há três bancos que parecem fatias generosas de bolo de chocolate. “Eles remetem à técnica da taipa de pilão, das construções do período colonial, com origem também na África”, explica ela. “Nossos antepassados não foram, como dizem, somente mão de obra, eles também trouxeram seus conhecimentos para o Brasil”, conclui a arquiteta.

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A imagem mostra uma sala com três cadeiras em forma de pedaços de bolo de chocolate.
Lounge Agô: inspiração em técnica afro-brasileira (Leo Martins/Veja SP)
A imagem mostra Gabriela sentada sobre uma cadeira em forma de bolo de chocolate.
Gabriela de Matos: criadora do lounge Agô (Leo Martins/Veja SP)

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O SABOR DA MISTURA

A catarinense Ana Weege, 35 anos, é direta: “Não queria que ficasse parecido com um showroom”. A arquiteta não teve medo de mesclar texturas e cores vibrantes na sala que criou, o Living Galeria Perspectiva.

O sofá com formas orgânicas, tons de verde e encosto com referência sessentista leva a assinatura de Weege. “Chama-se Marc”, ela diz. O tapete é da marca Punto e Filo, produzido a partir da reutilização de redes de pesca. O divertido banco em formato de milho mordido? Aí o jeito é ir para Nova York fazer um garimpo: a arquiteta trouxe o móvel de lá. O espelho retorcido, anti-selfie, é do artista Vinicius Meio.

A imagem mostra Ana Weege, em pé em cima de um sofá verde, com a mão apoiada sobre uma das pratilheiras do ambiente.
Ana Weege e o living colorido: “Não queria um showroom” (Leo Martins/Veja SP)
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A imagem é uma foto aberta do ambiente construído por Ana Weege, mostrando ao fundo o espelho anti-selfie.
Living Galeria Perspectiva: mescla de texturas e cores vibrantes (Evelyn Muller/Divulgação)

CONVITE A UM CAFÉ

A Casa Ninho, um estúdio de Fabiana Silveira e Patricia De Palma, 35 anos, tem quase 50 metros quadrados e parece sussurrar: entre, tome um café. As paredes externas formam uma rede de tijolinhos, que ajuda a não se sentir sufocado. Na cozinha, as banquetas de madeira jequitibá têm o assento feito de palhinha, uma tendência da CASACOR 2021. São fundas e confortáveis, boas para um papo longo.

No chão, um cuidado que pode passar despercebido: as arquitetas desenharam em terracota o padrão da cerâmica. “As linhas são referência a esse ninho, que foi o norte da nossa criação”, explica Fabiana. Junto com Patrícia, a dupla da SP Estudio Arquitetura realizou o desejo de estar perto da natureza, ao projetar um escritório repleto de plantas — para uma personagem fictícia chamada Helena, que tem no verde sua fonte de pesquisa, trabalho e descanso.

A imagem mostra a entrada de madeira da Casa Ninho.
Casa Ninho: um convite a um café (MCA Estúdio/Divulgação)
A imagem mostra Fabiana Silveira e Patricia De Palma, a primeira sentada e a segunda em pé, sorrindo para a câmera em seu ambiente.
Fabiana Silveira e Patricia De Palma: aconchegante, mas sem perder a personalidade (Leo Martins/Veja SP)

HALL ANTIDOENÇAS

Aos 42 anos, Kika Tiengo estreia na CASACOR com um ambiente sintonizado aos tempos atuais: o Hall Abluo. “Por incrível que pareça, é uma palavra em português, que significa purificação”, explica a arquiteta, nascida em Serra Negra (SP), com altitude de 930 metros.

O espaço funciona como uma transição entre a rua e a casa. Ali os moradores podem deixar sapatos e casacos, além de lavar as mãos em uma pia, protegendo a si e sua família de uma infecção pelo coronavírus, por exemplo. Os tons terrosos dão um toque invernal, que é acolhedor. Esse ponto se liga às memórias afetivas de Kika.

“Quando penso no tema A Casa Original, penso na minha família. De alguma forma, trouxe referências de onde minhas avós viviam”, diz a arquiteta, que olhou para a sustentabilidade ao usar tacos feitos com madeira de demolição. “Nesse pós-pandemia, a casa é repensada, o hall, que era incorporado ao espaço interno do apartamento, agora volta como uma área de transição, que serve à desinfecção”, diz Livia Pedreira.

A imagem mostra o hall, com espelho e pequenas cadeiras ao fundo.
Hall Abluo: ambiente sintonizado aos tempos atuais (Renato Navarro/Divulgação)
A imagem mostra Kika sentada sobre a entregada do Hall Abluo. Há uma pia ao seu lado.
Kika Tiengo: espaço para lavar as mãos e deixar os sapatos (Leo Martins/Veja SP)

TENREIRO E COMPANHIA

A calma e a sobriedade têm endereço: a Casa Alva, idealizada pela BC Arquitetos, de Bruno Carvalho, 44 anos, e Camila Avelar, 49 (representados pelo arquiteto Daniel Dornelles na foto de capa desta edição). As paredes, diferentemente do que se possa imaginar, não são brancas, mas bege, em tom de areia fina. O desvio do monocromatismo surge na madeira, em móveis assinados por nomes como Sergio Rodrigues (1927-2014) e Joaquim Tenreiro (1906-1992), autor da cadeira da foto ao lado, com palhinha no assento, no pequeno escritório. “Não queríamos somente móveis novos”, aponta Camila, defensora do design brasileiro e sua história.

A imagem mostra o ambiente da Casa Alva, predominado por cores claras.
Casa Alva: calma e sobriedade (MCA Estúdio/Divulgação)
A imagem mostra Camila e Bruno, de pé, sorrindo em um fundo branco.
Camila Avelar e Bruno Carvalho: exaltação do design brasileiro (Leo Martins/Veja SP)

> CASACOR Parque Mirante, anexo ao Allianz Parque, Rua Padre Antônio Tomás, 72. No térreo, sexto e sétimo andares. Terça a domingo, 12h às 20h. R$ 80,00, o dia (terça a quinta); R$ 100,00, o dia (sexta, sábado, domingo e feriado). Comprovante de vacinação de Covid-19, com ao menos uma dose, é obrigatório.. A compra deve ser realizada em: casacor.byinti.com. Do dia 21 de setembro a 15 de novembro.

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Publicado em VEJA São Paulo de 22 de setembro de 2021, edição nº 2756

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