Procuro um sapato novo há três semanas. Não é tão fácil quanto parece. Subi a Rua Teodoro Sampaio, no bairro de Pinheiros, da Avenida Brigadeiro Faria Lima até a Rua Henrique Schaumann, a pé, sem resultado. Comprei dois livros no sebo e cortei o cabelo. Mas sapato que é bom, nada.
Os obstáculos são diversos. O maior deles talvez seja a minha própria frescura. Acho sapato masculino feio. É difícil encontrar um que me agrade, diferente de tênis, bem entendido. Há uma farta oferta de calçados atléticos bacanas no mundo de hoje. Aliás, estão aí duas coisas que melhoraram muito do meu tempo de escola para cá: os tênis e os computadores. A humanidade dedicou boa parte do seu tempo a esses dois produtos nas últimas décadas, me parece. Mas os sapatos não tiveram a mesma atenção.
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Durante um bom tempo resolvi o problema em Franca, para onde me levou a estrada do amor. Para quem não conhece, fica no interior de São Paulo, a mais de 300 quilômetros de distância da capital. Lá é bom de sapato. Sempre que eu ia para a cidade dava um jeito de dar uma passadinha nas lojas de fábrica. Os descontos são robustos, da ordem de 50% ou mais.Um sapato que saía por, digamos, 340 reais num shopping de São Paulo lá era vendido a 140. Levava logo três, quatro, até cinco pares. No ônibus me confundiam com sacoleiro.
Tamanha economia me livrava da tirania da escolha. Acabava usando apenas um ou dois dos muitos sapatos que comprava por viagem. Como dizia, sou fresco para calçados. Mas resolvia meu problema. Não passo mais por Franca, no entanto. E ir para lá só para fazer compras me parece desmedido.
Na semana passada, resolvi procurar o produto no Shopping Iguatemi. Vamos logo num lugar caro e chique, pensei. Lá deve ter uns sapatos bacanudos. Tinha marcado de almoçar com meu amigo Reinaldo, ao lado. Não me custava nada dar uma passadinha no centro de compras antes. De repente me dão um desconto para pagamento à vista, quem sabe?
Descobri que os preços, no Iguatemi, são, de fato, salgados. Comecei a procurar na faixa dos 500 reais e fui subindo. Esqueci de dizer que, além de fresco, sou pedestrianista. Ando a pé para cima e para baixo. Isso dificulta a escolha de calçados. Os do shopping pareciam feitos para quem pisava pouco, sobretudo em ambientes carpetados. Dificilmente aguentariam mais de uma ida de trem até a Arena Corinthians, por exemplo. Mas não desanimei. Na faixa entre 1 000 e 1 500 reais não vi nada que me agradasse. Ainda bem que não sou mulher, pensei. Calçado feminino traz outro nível de complexidade, percebi ali dentro.
Lá em cima, perto do andar do cinema, achei uma botinha linda, no fim. Robusta, também. O preço? Mais de 3 000 reais. Não tive coragem nem de entrar na loja, muito menos de iniciar uma barganha para conseguir uma pechincha em cima desse valor.
No almoço conto a história para o Reinaldo. Digo que penso em voltar lá e levar a bota. Pelo menos resolve. Talvez possam me dar algum desconto, quem sabe? A resposta dele é imediata. “Por esse preço, você passa o fim de semana em Buenos Aires”, diz ele. “Com passagem, hotel, café da manhã, churrasco e vinho bom à vontade, e ainda traz um sapato melhor.” Ele tem razão. Continuo à procura de um bom sapato.
matthew@abril.com.br