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Narizes envenenados

Na contramão dos rótulos grifados dos free shops, uma geração de perfumistas arrisca combinações de ingredientes pouco convencionais em frascos de cristal — não raro, com nomes impronunciáveis

Por Consuelo Blocker, de Florença e Roma
Atualizado em 5 dez 2016, 16h06 - Publicado em 20 abr 2013, 01h00

Em janeiro, a dois meses de ter Greta, a estilista Frida Giannini estava às voltas com outro nascimento: o do eau de parfum Gucci Museo (100 mililitros, 200 dólares). Feito em parceria com o perfumista Lorenzo Villoresi, leva íris cultivadas em Florença, bergamota, lavanda e patchouli. É encontrado no site, nas lojas e no Museu Gucci, não muito longe da fábrica número 1 da marca florentina. A fórmula difere daquela do Gucci by Gucci, disponível em 18 000 endereços e fabricado pela área da Procter & Gamble — responsável por aquecer o mercado de 30 bilhões de dólares dos perfumes “de prestígio” com rótulos como Dolce& Gabbana. Na penteadeira de Frida, o Museo divide espaço com os frascos comprados na Campomarzio70, um dos seus lugares favoritos em Roma por ser “uma butique moderna que reúne aromas do mundo”. De 1996, a multimarcas da família Di Liello oferece setenta nomes — da francesa Mad et Len à italiana Petra, da suíça Vero Profumo à sueca Agonist. Em alguns casos, os vendem com exclusividade na Itália (frascos únicos chegam a 17 000 euros). “Buscamos a pureza dos ingredientes, as embalagens excepcionais e os perfumistas comprometidos com as próprias paixões”, diz Valentino Di Liello, da terceira geração de comerciantes. Em outras palavras, a loja se destaca no ramo dos chamados perfumes de nicho, um setor que há dez anos preenche frascos de cristal com um conteúdo que passa ao largo de tendências.

A prova está na Fragranze, feira em Florença promovida pelos organizadores da Pitti Uomo e Bimbo, referências no lançamento de moda masculina e infantil. Na edição de 2012, mais de 1 500 compradores farejaram aqui as novidades de 213 marcas — um crescimento de 30% em relação a 2011. A consagração do gênero veio com o FiFi Awards, o Oscar da perfumaria concedido pela Fragrance Foundation. Depois de quarenta anos de premiação, a instituição, fundada em 1949 por Elizabeth Arden, Coty, Helena Rubinstein, Guerlain, Chanel e Parfums Weil, inaugurou, em 2012, a categoria “indie”. Os critérios estabelecem que os concorrentes devem existir há no mínimo dois anos, ser independentes de grandes grupos e vender em até cinquenta pontos de venda nos Estados Unidos. O primeiro vencedor foi o 06 Amanu (100 mililitros, 125 dólares), da nova-iorquina Odin EDP. O perfume indie de 2013 é Amber Oud (50 mililitros, 295 euros), da Kilian, uma mistura de âmbar e óleo da madeira de agar, a mais cara do mundo. Herdeiro da casa de conhaques que leva seu sobrenome, Kilian Hennessy brilha no metiê em que o autor do Gucci Museo é estrela. Lorenzo Villoresi começou em 1990. Das viagens pelo Oriente Médio, trazia aromas. O hobby virou um ateliê no último andar de um prédio do século XV em Florença. A partir de 1 200 essências, Villoresi elabora fragrâncias sob medida. É necessário reservar uma hora com três semanas de antecedência e esperar outras três pelo resultado. “Minha liberdade de criação é o objetivo de cada frasco”, diz. Outro nome de prestígio é o do inglês Simon Brooke, que em 2009 reativou a Grossmith, fundada por seus antepassados em 1835. Ele adequa fórmulas registradas em livros antigos ao que está disponível aqui e agora.

Talvez por não ser um formulador de aromas, Brooketem uma visão particular da distribuição em freeshops das “niche fragrances”. “Elas são o ponto de partida para muitos apreciadores sofisticarem o olfato”,diz. No extremo oposto está o alemão Thorsten Biehl, desde 2006 à frente do que define como “galeria olfativa”, em Hamburgo. “Não acredito em perfume para massas”, afirma o dono da biehl. Seis narizes — como são chamados os perfumistas — elaboram aromas exclusivos para a perfumaria alemã, que produz edições limitadas. Entre eles está Geza Schoen, um rebelde na profissão. Ele assina os quase inodoros Molecule 01 e Escentric 01, feitos com a molécula artificial Iso E Super. Por cinco anos, foram os mais procurados na Harvey Nichols. Em 2007, veio a série The Beautiful Mind — uma resposta aos lançamentos de celebridades como Paris Hilton. “Produtos de larga escala não têm alma”, diz. Schoen chamou Christiane Stenger, campeã de concursos de memória, para colaborar — daí o nome do volume 1, Intelligence & Fantasy. O segundo deve sair neste ano. “Não precisamos de nada além dos melhores ingredientes.” Apoiada na raridade, na qualidade e na originalidade, essa geração quer manter viva a alma da haute parfumerie. E, apesar dos objetivos soberbos, os narizes são modestos em seus desejos. Villoresi quer explorar íris, louro, lavanda, rosa e jasmim sem arredar o pé de sua cidade natal. Schoen espera a vitória da Alemanha na Copa do Mundo e virar pai. É para realizar esses sonhos que eles insistem em ser donos do próprio nariz.

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