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Montblanc aposta na redescoberta do prazer da mensagem manuscrita

Num mundo dominado por SMS, e-mails e Facebook, marca aperfeiçoa a tecnologia das canetas

Por Simone Esmanhotto
Atualizado em 5 dez 2016, 14h19 - Publicado em 2 jul 2014, 19h31
Montblanc
Montblanc (Jair Lanes/)
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Os anos 2010 vão entrar para a história como a década em que desenvolvemos a síndrome do polegar de BlackBerry — ou iPhone, dependendo do smartphone que o sujeito segura entre os dedos. Não há nada de novo nessa tendinite, identificada pelo suíço Fritz De Quervain em 1895 como o mal do esforço repetitivo, causado então pelo tricô, piano ou boliche. Mas a doença, em desuso na medida em que ninguém tricota ou toca piano como no século XIX, foi reativada pelo número de mensagens por celular trocadas por dia: só no WhatsApp, o maior aplicativo do gênero, são 50 bilhões de recados digitados diária e freneticamente por 430 milhões de usuários. “Nunca escrevemos tanto quanto hoje”, diz Christian Rauch, especialista em cultura da escrita da alemã Montblanc, a maior grife de canetas. De terno marinho, gravata e o modelo emblemático — a Meisterstück 149 — no bolso esquerdo do paletó, Rauch está no museu da fábrica da Montblanc, em Hamburgo. Aqui se vê a pretinha original, de 1924. O executivo poderia lamentar esta década em que a vida digital selou o museu como destino das canetas. No ano em que a Meisterstück 149 completa noventa anos, no entanto, Rauch credita justamente ao blá-blá-blá virtual — cuja digitação apressada corta acentos, elimina letras, aposenta a caligrafia — a sobrevida em alto estilo da arte de escrever a mão. E, por consequência, da caneta. “Quanto mais bobagem se digita, mais gente cultua o momento de pausa e reflexão que as mensagens eletrônicas, impessoais, não oferecem”, declara.

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Os 730 milhões de euros de faturamento da Montblanc em 2013 e uma nova leva de cientistas a favor da manuscritura como forma de combater o stress indicam que as canetas estão longe do anacronismo. Na proporção inversa à das mensagens digitais, elas (junto com a papelaria, um recente investimento para marcas como Louis Vuitton e Fendi) viraram objeto de culto. A Montblanc mantém uma lista pequena e fiel de colecionadores — 170 —, atentos às edições anuais e limitadas incrustadas de pedra e metais preciosos com custo de produção estimado em 200 000 euros (e preços que começam em 20 000 euros). “São joias de escrever”, afirma Sabine Bach, à frente de sessenta designers e artesãos responsáveis pelas criações, que dificilmente ultrapassam 100 unidades. É, no entanto, numa seção bem menos brilhante que a Montblanc se afasta da joalheria e se aproxima da relojoaria — a ponto de, entre os funcionários, as canetas não serem chamadas como tal, mas sim de “instrumentos de escrita”. No ano passado, a marca lançou a tinteiro retrátil Heritage, uma obra inédita da engenharia mecânica. “Levamos 100 anos para descobrir o mecanismo de pistão que torna isso possível”, diz Christian Rauch. É uma evolução da Meisterstück, que, antes das então concorrentes Parker ou Waterman, permitiu aos homens de negócio embarcar num avião com a tinteiro no bolso sem correr o risco de chegar ao destino com a camisa manchada. Rapidamente, virou a eleita para firmar contratos e leis. Entre os adeptos estão o primeiro-ministro britânico Winston Churchill e o escritor americano Ernest Hemingway. O episódio mais midiático se passou em 1963, dois anos depois da construção do Muro de Berlim. O chanceler alemão Konrad Adenauer deveria assinar o livro de ouro da cidade de Colônia — e estava sem caneta. Foi o presidente americano John F. Kennedy quem emprestou a sua Meisterstück, num gesto de cumplicidade entre dois líderes que mantiveram uma relação de desconfiança na Guerra Fria. 

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O coração da engenharia que seduziu os líderes segue no departamento de penas, em Hamburgo. Nele, apenas 38 funcionários, entre os 600 empregados da manufatura, se dedicam a transformar os instrumentos de escrita em um negócio de ponta. Das 100 etapas de produção de uma Meisterstück, 35 se concentram na pena da tinteiro, feita com 1,1 grama de ouro amarelo com banho de ródio para o contraste prateado (no dia da visita de VEJA LUXO, 3,5 milhões de euros do metal estavam guardados no cofre): da curvatura da chapa de metal ao corte central que controla o fluxo de tinta. “Variamos entre 0,2 e 0,6 milímetro, o que influencia o tipo e o conforto da escrita”, explica Stefan Friedrich, chefe da área. A ponta da pena pode ser redonda ou oblíqua, para acomodar a forma como cada um pousa a caneta no papel. A obsessão pelo conforto fez a marca desenvolver um software para analisar o traço e ajudar cada cliente a encontrar o melhor entre os oito tipos de pena disponíveis: da extrafina à extragrossa. Uma caneta eletrônica sobre uma tablet registra a pressão, a velocidade, o ângulo da ponta sobre o papel, a rotação do punho. Dez máquinas serão colocadas em lojas-chave pelo mundo. Uma delas, no Shopping Cidade Jardim, até o fim do ano. “Em último caso, podemos desenvolver uma pena sob medida”, comenta Friedrich. A saber: por 250 000 euros. Nenhuma tecnologia substitui o controle de qualidade, reservado à ponta dos dedos e aos ouvidos de quatro mulheres. Elas testam, sobre folhas de sulfite brancas e com tinta transparente, a capacidade de cada pena de deslizar com suavidade. Fazem silêncio para perceber o possível ruído do ouro arranhando a folha. “Nada pode interromper a fluidez do pensamento para a mão”, diz Rauch. “É o que torna cada bilhete, cartão ou carta únicos —  e não uma mensagem com outra dezena de destinatários em cópia.”

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