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Principal baile black de SP, Chic Show celebra cinquenta anos com festival

A história da festa que virou símbolo da cultura negra paulistana, e leva ao Allianz Parque shows de nomes como Lauryn Hill, Jimmy “Bo” Horne e Mano Brown

Por Tomás Novaes
Atualizado em 12 jul 2024, 10h26 - Publicado em 12 jul 2024, 07h00

Em 1974, Jorge Ben Jor subia ao palco do ginásio do antigo Estádio Palestra Itália para coroar a primeira edição do baile Chic Show.

Neste sábado (13), passadas cinco décadas, a festa retorna ao mesmo endereço, hoje rebatizado como Allianz Parque, para sua primeira edição em formato de festival.

Mais uma vez, o mais importante baile black da cidade trará grandes nomes da música do Brasil e do mundo, com destaque para a cantora e compositora americana Lauryn Hill.

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A cantora Lauryn Hill: show em São Paulo com participações especiais (Birgit Fostervold @knipselyst/Divulgação)

No principal show do dia, a artista contará com a participação de Wyclef Jean, ex-colega no trio Fugees, e seu filho, YG Marley, que estourou recentemente com a música Praise Jah in the Moonlight.

No line-up ainda brilham ídolos como o veterano Jimmy “Bo” Horne, grande nome da disco music, e os brasileiros Criolo, Mano Brown, Rael e Sandra Sá.

Além do local, outro ponto de interseção com aquele show de cinquenta anos atrás é o comando de Luiz Alberto da Silva, o Luizão, criador da Chic Show.

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O paulistano, que segue à frente da marca, é um guardião da cultura negra na capital paulista. Nasceu na Lapa, cresceu na Vila Madalena e depois se instalou com a família na região do Morumbi, cenário dos seus primeiros bailes, na adolescência.

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Luizão (à esq.) e Jimmy “Bo” Horne, nos anos 70: mais uma vez reunidos neste sábado (13), no Allianz Parque (Arquivo Chic Show/Divulgação)

“Tinha os LPs, tinha os amigos, e ali nascia a ‘discoteca do Luizão’. Reunia o pessoal da rua de cima e de baixo e, com uma vitrolinha de alça, eu saía tocando, e a galera dançando”, lembra.

A coisa ganharia outras proporções depois de Luizão pisar pela primeira vez no São Paulo Chic, salão da escola de samba Camisa Verde e Branco, na Barra Funda.

Nascia ali o título da festa tal qual conhecemos hoje. “Era um dos únicos lugares de samba da cidade, frequentado pelos estudantes da USP. Surgiu o convite para eu fazer um baile lá, das alas reunidas”, conta.

Depois de uma primeira experiência bem-sucedida, Luizão pediu um domingo para fazer sua própria discoteca, reunindo no mesmo espaço os amigos da Zona Sul e os da Zona Oeste. “Eu não tinha noção de que as pessoas ganhavam dinheiro com isso. A partir dali, nasceu a Chic Show, que era a domingueira do São Paulo Chic”, explica o anfitrião.

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Naquele início dos anos 70, seus bailes começaram a se multiplicar e se espalhar pela cidade. Durante uma formatura no ginásio da Sociedade Esportiva Palmeiras, Luizão teve a ideia de levar a sua festa para lá.

“A diretoria do Palmeiras precisava muito da grana do aluguel pelo espaço. Lá cabiam entre 19 000 e 20 000 pessoas, era um ginásio de esportes atrás do gol do Parque Antarctica”, explica o idealizador, que levou ninguém menos que Jorge Ben Jor para a edição de estreia, em 1974.

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Jorge Ben Jor em um dos bailes, no início dos anos 80: plateia de black powers no Palmeiras (Arquivo Chic Show/Divulgação)

Depois daquela noite, vieram tantas outras nas décadas seguintes, em diferentes espaços da cidade, que sacudiram a cena com atrações como James Brown, Betty Wright, Earth Wind & Fire, Roy Ayers, Zapp e Chaka Khan.

Aquela discoteca do Luizão virou uma grande empresa dedicada à cultura negra, que passou a organizar diversas festas pelo estado de São Paulo, mobilizando um grande público a cada semana. Assim criou-se um circuito de equipes de bailes concorrentes, que comandavam casas noturnas e seguiam o mesmo sistema de funcionamento, como a Zimbabwe, a Kaskatas e a Black Mad, entre outras.

Lançado em 2023, o documentário Chic Show, dirigido por Emílio Domingos e Felipe Giuntini, disponível no Globoplay, resgatou a história da festa. “A Chic Show sempre teve uma grande sensibilidade para a música da periferia e serviu de palco e até produtora para artistas. Não podemos esquecer que os bailes aconteciam em vários espaços, e a equipe tinha os seus próprios programas de rádio, então era uma grande divulgadora da cultura negra”, diz Emílio.

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A influência de todos esses braços não se limitou a um gênero musical. Nos seus cinquenta anos de história, a Chic Show participou ativamente de acontecimentos como a febre da soul music, a chegada do hip-hop e o fenômeno do pagode nos anos 90.

“Péricles, Salgadinho, Marquinhos Sensação, diversos músicos frequentavam. A Chic Show era o grande palco que eles podiam almejar”, diz o cineasta e antropólogo.

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Luizão, em 2023: lançamento do documentário Chic Show, no festival In-Edit Brasil (Arquivo Chic Show/Divulgação)

No caso do rap, por exemplo, a equipe também produziu discos, como a coletânea O Som das Ruas (1988), que reunia grupos como Sampa Crew e Os Metralhas.

“O rap começou a tomar forma com o breakdance. Até meados dos anos 80, as equipes de baile não davam abertura, porque as festas ficavam apinhadas de gente — como você vai abrir a roda para o cara rodar no chão?”, lembra o DJ Grand Master Ney, nome importante dos bailes black de São Paulo, que tocará no sábado (13).

Ney participou de diferentes fases da Chic Show. Desde frequentador com seu grupo de dança, na década de 70, até se tornar DJ residente, no final dos anos 80 — não faltam memórias inesquecíveis.

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“Lembro do primeiro show do James Brown, em 1978. Derrubaram o portão da entrada, e eu estava lá no meio. Quase morri, era muito franzino… só sei que entrei no baile depois, com a camisa toda aberta, cabelo desmanchado, olho vermelho pelo gás lacrimogêneo, mas, quando o homem subiu no palco, eu já estava na pista, dançando que nem louco (risos)”, recorda.

Dez anos depois, o rei do soul atenderia a mais um chamado da Chic Show e voltaria ao Brasil para outra apresentação, dessa vez com Ney abrindo a noite.

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O DJ Grand Master Ney, atração do festival: décadas de história com a Chic Show (On Hub Digital/Divulgação)

O DJ Preto Faria é outro nome escalado para o festival e representa a segunda geração de DJs do evento. O paulistano entrou na equipe da Chic Show no final dos anos 90, após iniciar a carreira acompanhando grupos e artistas de rap.

“O show que mais me marcou foi do DJ Cash Money, porque estávamos empolgados com esse lance de discotecar, e o vimos fazendo scratch, mixando ao vivo as músicas. Aquilo mexeu com a gente”, conta.

A efervescência de toda a cultura black na cidade resistia ao racismo e à repressão policial desde os primeiros bailes. “O jovem negro de São Paulo usava cabelos black power, armados com pentes. Me lembro que, na saída do Palmeiras, no caminho até os pontos de ônibus, os negros eram, de repente, abordados e revistados. Os policiais faziam pilhas de garfos black, jogavam no chão e não devolviam. Era uma fase difícil, com a ditadura e o começo da Rota, os policiais judiavam, batiam”, lamenta Luizão.

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Para o criador, pouco mudou desde então. “Eu, que tenho cinquenta e poucos anos com a Chic Show, não vejo nenhuma melhoria de lá para cá. O jovem negro de periferia neste país paga caro, é massacrado, desrespeitado e culpado por coisas que ele não faz”, afirma.

Se antes os bailes de soul reuniam, semanalmente, multidões de jovens, hoje esse público frequenta em peso os bailes funk. Para o diretor Emílio Domingos, é possível fazer uma correlação entre os movimentos.

“O fato de a Chic Show ser uma grande empresa de negros foi algo suficientemente forte para inspirar muitos. Podemos dizer que o Laboratório Fantasma, do Emicida, e a Boogie Naipe, do Mano Brown, são frutos disso. Acho que os bailes funk são herdeiros daquela geração — hoje, o que acontece com força são os fluxos”, diz.

Os bailes “nostalgia”, com trilha sonora dos anos 70 e 80, continuam vivos na cidade, com o mesmo público fiel que frequentava as festas nas décadas passadas. “O mercado cresceu. Antes, era um setor restrito, você não encontrava um baile a cada esquina, e o baile black era black, o baile branco era branco, não tinha mistura. Hoje, a música negra virou global, e são várias as casas e eventos para a galera dançar”, comenta Ney.

Para Luizão, o festival comemorativo, produzido em parceria com as empresas Music On Events e Magnetar, será a consagração de toda a importância da Chic Show, assim como o início de uma nova fase, com expectativa de repetir o evento nos próximos anos.

É mais um capítulo nessa história que passou por tantas transformações. “Estamos sempre nos modernizando. Chic Show é uma bandeira negra, é um movimento, e vamos continuar por muito tempo. Temos 50, mas queremos chegar aos 100.” Talento e força não faltam.

Allianz Parque. Avenida Francisco Matarazzo, 1705, Água Branca, ☎ 4800-6680. 16 anos. Sáb. (13), 13h45/23h15. R$ 280,00 a R$ 680,00. allianzparque.com.br.

Publicado em VEJA São Paulo de 12 de julho de 2024, edição nº 2901

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