Não seja a pessoa que fica repetindo “mas eu te disse!”
A que realmente serve esse lembrete?
Poucos fãs da animação Carros, da Pixar, sucesso na década de 2000, sabem que, ainda nos anos 70, os estúdios Hanna-Barbera haviam produzido uma animação com o mesmo mote chamada Carangos e Motocas (do original Wheelie and the Chopper Bunch), que trazia como personagem principal o simpático fusca Wheelie.
O fusquinha era apaixonado por Rota e, sempre que tentava conquistá-la, era atrapalhado por um grupo de motocicletas que produziam maldades para prejudicar Wheelie: Chapa, Avesso, Risada e Confuso. Este último era o mais jovem e ingênuo de todos e fazia advertências aos colegas de que não deveriam investir naquela maldade porque era errado, porque ele estava com medo, porque todos se dariam mal etc.
No fim, participava de tudo. Como a gangue sempre fracassava, Confuso dizia quando tudo dava errado: “Mas eu te disse! Eu te disse! Eu não te disse?”. Era assim:
Na vida real, há pessoas como Confuso que vivem lembrando aos outros quando tudo dá errado: “Mas eu te disse!”. Pessoas assim podem até ser vistas como mais conscientes e responsáveis. E provavelmente elas até querem que as coisas caminhem bem. E isso não vale só para atitudes maldosas…. também se aplica àquelas situações nas quais alguém tem uma ideia para resolver um problema ou começar um projeto ousado.
Mas será que o “eu te disse!” ajuda? A que serve esse lembrete? A primeira função que ele tem para a pessoa que fala é a de simplesmente deixar claro para os demais que ela já sabia das consequências observadas. É um jeito de se diferenciar, garantir um lugar ao sol e se mostrar como alguém que sabe mais que os outros sobre a realidade.
Agora… isso muda os resultados ocorridos? Não! Isso evita que aquela situação aconteça novamente? Tampouco. Porque o próprio resultado ruim é suficiente para deixar claro que aquilo não funcionou. “Eu te disse!” não passa, portanto, de uma exibição egocêntrica que em nada contribui para resolver uma situação e ainda atrapalha na formação de vínculos de confiança.
Mas há ainda um aspecto interessante mostrado no desenho animado. Não é curioso que Confuso, apesar de sempre alertar o grupo sobre os riscos de cada plano, participa de absolutamente todas as traquinagens de seus amigos? Esse é o pior tipo de comportamento eu-te-disse. A pessoa participa da ação e depois tenta se isentar de responsabilidade simplesmente porque tinha advertido os demais sobre os riscos.
Poucas atitudes são mais mesquinhas do que essa. Então, não seja a pessoa eu-te-disse do seu grupo. Se você advertiu previamente e não participou da ação que deu errado, não lembre ninguém daquilo que está óbvio pelos resultados ruins. Por outro lado, se você participou da ação, aí é que você não deve mesmo falar nada porque a coisa mais feia e desleal que você pode fazer é tentar se esconder atrás de uma dignidade de consciência dúbia e superficial como esta.
Responsabilidade pelos próprios atos e respeito aos seus limites em relação às escolhas dos outros, dois princípios que favorecem sentir paz e equilíbrio.