Em Terapia Por Arnaldo Cheixas Terapeuta analítico-comportamental e mestre em Neurociências e Comportamento pela USP, Cheixas propõe usar a psicologia na abordagem de temas relevantes sobre a vida na metrópole.
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Como funciona o mecanismo do vício em nossas mentes

E ele não é só para drogas, pode ser também para jogo, celular, sexo...

Por Arnaldo Cheixas
Atualizado em 4 out 2017, 14h54 - Publicado em 2 out 2017, 16h18
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  • Estamos habituados a associar o conceito de dependência exclusivamente ao consumo de substâncias químicas como a maconha, o álcool, a cocaína etc. A razão para isso é que de fato a ciência assim a definiu até pouco tempo atrás.

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    A base para definir um quadro de dependência química dentro deste referencial é composta de quatro características que precisam estar presentes: o desejo pela droga, o consumo propriamente dito, a tolerância (necessidade de doses cada vez maiores para se obter a mesma sensação de prazer) e a síndrome de abstinência (efeitos fisiológicos desagradáveis desencadeados pela interrupção do consumo).

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    Acontece que as descobertas mais recentes alcançadas por diferentes grupos de pesquisa do mundo têm apontado para uma base única no estabelecimento de qualquer comportamento de vício, seja ele o consumo de uma droga ou outros. O jogo patológico, por exemplo, já é diagnosticado como um tipo de dependência, neste caso comportamental.

    O que há em comum entre todas as dependências é o mal funcionamento do sistema de recompensas do cérebro, principalmente no que pese a ação da dopamina, o neurotransmissor mais relevante para o estabelecimento do desejo incontrolável. A dependência parece se estabelecer quando a atividade dos neurônios que funcionam pela ação da dopamina se sobrepõe à atividade dos neurônios de centros cerebrais que produzem a sensação de prazer. Ou seja, a dependência se dá quando o prazer fica à mercê do desejo incontrolável.

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    De acordo com esta acepção mais moderna é possível inferir que qualquer evento do ambiente capaz de despertar a combinação patológica entre desejo e prazer possa caracterizar um tipo de dependência. Além dos já reconhecidos jogos de azar, podemos incluir nesta lista o acesso compulsivo à internet, a viciante checagem de notificações no celular, o sexo compulsivo, o mentir compulsivo e assim por diante.

    Refletir sobre os problemas humanos sob a perspectiva da evolução das espécies sempre nos ajuda a compreender melhor como alguns padrões se estabeleceram. Imagine que há apenas um século a expectativa de vida no Brasil era de 34 anos, saltando para 75 anos atualmente. Passamos a viver quarenta anos a mais se compararmos com nossos ancestrais de no máximo três gerações passadas.

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    Outras transformações relevantes foram a menor necessidade de esforço para se fazer qualquer coisa (em função da industrialização) e, mais recente e profundamente, a introjeção da informática em nossas vidas.

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    As funções mais primitivas de nossos cérebros são dedicadas a sobreviver e a procriar, sendo que o gatilho fisiológico da procriação é exatamente a combinação desejo-prazer.

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    Então a situação é a seguinte. Vivemos mais que o dobro de tempo que nossos ancestrais viviam e precisamos fazer muito menos esforço do que eles para permanecermos vivos. Ainda assim nossos cérebros buscam incessantemente a sensação de prazer e de satisfação dos desejos. Este quadro, combinado com a variabilidade genética, leva uma crescente quantidade de pessoas ao desenvolvimento de variados tipos de dependência (vício)… por drogas, por sexo, pelo jogo, por informação etc.

    O desafio para superarmos o problema do vício passa pelo desenvolvimento de intervenções que atuem diretamente nos centros de recompensa do cérebro e, paralela e principalmente, pelo desenvolvimento de condições de vida cada vez mais gratificantes e democraticamente distribuídas, pois é o vazio de gratificações de qualidade ao longo da vida que acaba produzindo as condições para a busca de gratificações mais imediatas ainda que danosas para a vida.

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