Martha Medeiros está em Londres. Em uma imersão total de inglês. Aulas em período integral, lições de casa e algum trabalho levado na bagagem ocupam seu tempo. É da escritora gaúcha, de 51 anos, o romance Divã, adaptado para o teatro, cinema e televisão, sempre com Lilia Cabral. Aliás, o teatro tem sido um parceiro inesperado de sua obra, apoiada nas reflexões em constante mutação do mundo feminino. Agora é a vez de a plateia paulistana conhecer e – quem sabe – endossar o sucesso de Doidas e Santas. Sob a direção de Ernesto Piccolo, Cissa Guimarães, Giuseppe Oristanio e Josie Antello protagonizam a comédia adaptada da coletânea de crônicas homônima que ficou em cartaz no Rio de Janeiro por dois anos e meio. Entre um homework e outro, Martha e eu trocamos alguns e-mails para essa entrevista.
Por que esse interesse tão grande por parte dos produtores em levar seus textos para o teatro e também do público em vê-los encenados?
Acho que tenho uma linguagem simples, leve e comunicativa. E isso facilita a troca com o público, claro. Além de eu falar de temas que são comuns ao cotidiano de todos, o que gera identificação e interesse. Ao mesmo tempo, não considero blablablá, são assuntos que mexem com as pessoas, que fazem refletir. Nem eu mesma imaginava que isso pudesse funcionar no palco. Nunca penso em desdobramentos quando escrevo, mas pelo visto funciona.
O público está mais voltado para as leituras intimistas, aquelas que refletem as relações humanas, as inquietações de cada um?
Temos recebido uma avalanche de informações, sabemos de tudo e sabemos sobre todos, mas nessa inquietude de estar sempre atualizado sobre o mundo, falta tempo para refletir sobre si mesmo. Acho que está existindo uma busca pelo “pensar-se”. Não sei… Na verdade, eu não teorizo sobre essas coisas, apenas sigo meu instinto quando trabalho e é através dele que descubro que minhas indagações íntimas repercutem em muita gente.
Qual seu grau de envolvimento quando um texto ganha adaptação para o teatro?
Sou totalmente desapegada. Entrego na confiança e só vou assistir ao espetáculo no dia da estreia. Entendo que, ao autorizar uma adaptação, o texto deixa de ser propriedade minha e passa a ser de um grupo, e logicamente sofrerá alterações. É um processo muito dinâmico e procuro não ficar tiranizando a equipe. Até agora deu certo. Nunca me arrependi de nada. Claro que tenho um olhar crítico sobre o que vejo, mas isso não impede que eu me comova e me divirta como qualquer outra pessoa na plateia.
A Cissa Guimarães tentou convencê-la de fazer a adaptação de Doidas e Santas. Por que não topou o desafio?
Só consigo escrever para ser lida em silêncio. Tenho dificuldade em escrever um texto para ser dito em voz alta, em criar diálogos. Mas não faço disso uma sina. Pode ser que, um dia, eu me aventure a criar uma peça de teatro, uma dramaturgia.
Depois do sucesso de Divã, que virou peça, filme e seriado de TV com a Lilia Cabral, você sentiu uma responsabilidade maior em relação ao que publica e à comunicação estabelecida com as pessoas?
Procuro não levar isso muito a sério, senão eu travo. Na verdade, continuo escrevendo para um único leitor, eu mesma. Se ficar pensando em quantas pessoas estão lendo ou o que cada um vai achar, eu perco a espontaneidade e a honestidade do texto. Ou seja, as coisas mudaram da porta da rua para fora, mas no meu processo íntimo absolutamente nada mudou. Tenho apenas mais experiência, só isso.
Como é retratar a mulher sem esbarrar no estereótipo e principalmente não se repetir? Como cronista, você se baseia no que observa ao seu redor ou tira elementos de sua própria experiência?
Se existe uma mulher retratada em meus textos, ela é um reflexo de mim mesma, não tenho a intenção de ser porta-voz de todas elas. De jeito nenhum. Aliás, escrevo para todos, para os homens inclusive. E o retorno que tenho tido deles tem sido incrível, mais frequente até que o das mulheres.
Imagino que hoje, na era das redes sociais, você tenha uma troca frequente com seus leitores – e espectadores. Como você se sente em relação a isso?
O retorno é sempre espontâneo. Quanto às redes sociais, eu sigo na Idade da Pedra. Não estou no Facebook e nem no Twitter. Mantenho contato por e-mail e olhe lá. Eu me estresso só de pensar em tanta interatividade. Cada vez mais, gosto de ficar na minha. Já tenho o privilégio de escrever colunas em jornais e ter leitores para meus livros. Não sinto falta de mais aproximação que isso. Preciso de tempo para minha vida privada. Todos nós precisamos.