“Que tal chamar pessoas diferentes de você para dançar?”
João Paulo Pacifico fala sobre a contratação de pessoas com síndrome de Down e os ensinamentos que a inclusão traz para as empresas
INCLUSÃO DE VERDADE Imagine esta cena. Você é convidado para uma festa superlegal. Ao chegar, percebe que todos estão felizes mas mal olham para você. Todos estão dançando, você tenta se aproximar deles e não consegue. Talvez você nunca tenha passado por isso, mas não ser considerado, viver de modo praticamente invisível, é uma realidade para muitas pessoas. Há um ditado que diz: “Diversidade é chamar para a festa, inclusão é convidar para dançar”.
VISÃO ALÉM DOS PRECONCEITOS Por ter sido criado na bolha do mercado financeiro, demorei para entender os preconceitos velados nas empresas. Com o passar do tempo, percebi que ser mulher é um complicador na carreira, negros têm de se esforçar bem mais, LGBT+ muitas vezes devem esconder quem são, pessoas com mais de 50 anos enfrentam mais dificuldades de emprego e deficientes normalmente só são contratados para o cumprimento das cotas.
FELICIDADE GENUÍNA COM O CRACHÁ Você já viu alguém levar a uma festa o crachá da empresa para mostrar com orgulho o novo local de trabalho? Eu presenciei essa cena há alguns anos e fiquei intrigado. Onde, nos dias de hoje, encontramos alguém com tanto orgulho da sua empresa? Pois essa pessoa é o meu primo Thomaz, que tem síndrome de Down e desde então trabalha em uma grande rede de drogarias.
IMPACTO POSITIVO PARA TODOS A McKinsey & company desenvolveu um índice para medir a saúde organizacional, o Organizational Health index (OHi), que concluiu que pessoas com síndrome de Down impactam positivamente cinco dos nove itens considerados. São eles: liderança, imagem externa, motivação, cultura e clima.
HABILIDADES BEM-VINDAS Na pesquisa, 83% dos entrevistados disseram acreditar que os supervisores diretos dos Down se tornaram mais habilitados para resolver conflitos, pois passaram a ter uma atitude mais humana e menos autoritária. A presença de uma pessoa com Down deixa o ambiente mais colaborativo e o grupo mais unido, segundo 88% dos entrevistados.
EXPERIÊNCIA PRÓPRIA Com base nessas observações e dados, no fim de 2012 resolvemos contratar um profissional com síndrome de Down. Fazendo uma longa história curta: já se passaram mais de seis anos, e o luis Octávio, comigo na foto acima, é uma das pessoas mais queridas e comprometidas da Gaia, chega todos os dias sorrindo, torna o ambiente mais feliz e TRABALHA!
NA FUNÇÃO IDEAL Cabe aqui uma dica: assim como não se deve colocar alguém com perfil comercial para fazer auditoria, quem tem síndrome de Down deve exercer uma função adequada às suas habilidades. como qualquer profissional, nem sempre a pessoa vai se adequar. Após a bem-sucedida performance do Luis Octávio, resolvemos contratar um segundo funcionário com Down, a querida Tathi. Depois de alguns meses e várias conversas com ela, optamos por desligá-la da empresa. Com muita honestidade e dignidade, ela aceitou e até hoje mantém contato conosco. Postura bem diferente de tantas outras que já presenciei.
UM NOVO CONVITE Conviver com o diferente nos traz inúmeros ensinamentos. Por isso, fica aqui meu convite: que tal chamar pessoas diferentes de você para dançar?
João Paulo Pacifico (à esq.), fundador do Grupo Gaia, acredita que a gentileza e a inclusão podem engrandecer as relações, aprimorar a cultura das empresas e mudar o mundo. No perfil @joao_pacifico, aborda assuntos importantes como saúde mental e desenvolvimento pessoal.
Publicado em VEJA SÃO PAULO de 27 de novembro de 2019, edição nº 2662.