Especialista defende uso de cannabis medicinal no tratamento de ansiedade
Psicóloga Maria Klien conta sua história com o transtorno e a "revolução" da cannabis em sua saúde mental
Desde a adolescência, a ansiedade foi uma constante em minha vida. Mesmo tendo a sorte de morar em uma cidade praiana, não houve mar suficiente para curar a dor da minha alma, porque o meu refúgio, que é o nosso corpo sagrado, estava em carne viva. Não tinha espaço para mim dentro de mim mesma, um nível de sofrimento que só quem já teve sabe reconhecer. O desespero de não se sentir seguro dentro de si.
Aos 23 anos, as crises de pânico diárias se tornaram um obstáculo intransponível, levando-me a suspender meus estudos universitários. Esse momento crítico marcou o início de uma jornada em busca de serenidade: ali eu entendi que ou eu renascia ou morreria em vida.
Anos mais tarde, a descoberta da cannabis medicinal emergiu como uma revolução pessoal, trazendo paz após longos períodos de turbulência interna. Essa transformação não apenas redefiniu minha vida pessoal, mas também redirecionou minha carreira. Passei a dedicar-me ao estudo aprofundado dos efeitos terapêuticos dessa planta, e também de outras medicinas que são encontradas na natureza, com a esperança de que, ao expandir o conhecimento, eu pudesse fazer com que mais pessoas pudessem recuperar a autonomia e bem-estar.
Os desafios são grandes mestres, e a minha experiência com o transtorno do pânico me tornou uma pessoa mais empática, uma qualidade que considero fundamental para que se pratique a psicologia atenta ao indivíduo. Ao aceitar a ansiedade como uma parte inerente de quem sou, consegui transformá-la em uma força positiva, em busca de uma vida plena.
Com foco atual no acesso ao tratamento com cannabis no sistema de saúde pública, dou especial atenção a famílias em situação de vulnerabilidade econômica. Inspirada pelos progressos observados em países pioneiros como Israel, antecipo um futuro promissor para essa modalidade de tratamento no Brasil, que já vem alcançando vitórias importantes, beneficiando milhares de pacientes com as mais variadas condições, um sinal encorajador do potencial dessa abordagem.
Defendo a prática responsável no uso da cannabis, enfatizando a importância do acompanhamento médico. Estou convicta de que, tratada com o devido rigor e seriedade, a cannabis medicinal pode transformar a saúde pública, oferecendo alternativas terapêuticas inovadoras para um amplo espectro de patologias.
A curadoria dos autores convidados para esta seção é feita por Helena Galante. Para sugerir um tema ou autor, escreva para hgalante@abril.com.br.
Publicado em VEJA São Paulo de 15 de março de 2024, edição nº 2.884.