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Com bons preços e opções, zona cerealista passa por transformação

Apesar do potencial para atrair milhares de pessoas, a região ainda é suja e caótica, com a acessibilidade prejudicada e, aos domingos, quase tudo fecha

Por Mônica Santos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 8 fev 2019, 09h10 - Publicado em 8 fev 2019, 06h00
Início da Rua Santa Rosa, no Largo do Pari, também conhecido como a Praça do Coco: a fruta é vendida dia e noite a 2,20 reais a unidade (Ligia Skowronski/Veja SP)
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Localizada no Brás, a pouco mais de 300 metros do Mercado Municipal e do outro lado do Rio Tamanduateí, a zona cerealista paulistana vem passando por uma lenta transformação nos últimos anos. Ela é resultado da reforma, ampliação e abertura de lojas e, principalmente, da diversificação de produtos para o consumidor final.

Na Rua Santa Rosa, na Avenida Mercúrio e em suas adjacências, contam-se quase cinquenta empórios que vendem grãos, farináceos, temperos, frutas secas, oleaginosas, chás e suplementos alimentares hidrolisados, tudo a granel, além de produtos industrializados naturais, orgânicos, veganos, funcionais… Sobretudo nos itens que passam pela balança (e, portanto, não carregam o custo do envasamento), os preços costumam ser bem menores que os praticados em outras áreas da capital.

Casa de Saron
Casa de Saron, na Avenida Mercúrio: caixas acrílicas, comuns a todos as lojas da região, permitem visualizar os produtos (Ligia Skowronski/Veja SP)

Para efeito de comparação, o valor do pacote de 1 quilo de arroz integral do tipo 1 gira em torno de 4,50 reais na rede Pão de Açúcar. Na zona cerealista, o produto a granel sai por 2,90 reais. Em alta entre os nutricionistas, o açúcar de coco pode ser encontrado por lá a 24,90 reais o quilo — produto similar é vendido também a granel por 55,20 reais no supermercado Super Saudável, aberto no Alto de Pinheiros no fim do ano passado.

A abertura da zona cerealista para o varejo deu seus primeiros passos no final da década de 70. Até então, ali reinavam os armazéns de feijão, batata e cebola, cujos lotes eram arrematados no atacado e, depois, distribuídos para comércios menores e feiras Brasil afora. Com a descentralização do abastecimento do país, a tecnologia e o surgimento dos grandes supermercados atacadistas, que compram diretamente do produtor, os armazéns perderam força. Investir no varejo foi uma saída natural para aumentar o faturamento.

Cláudio Fernandes – Zona cerealista
O empresário Cláudio Fernandes: ele abriu o Empório Santa Rita no ano passado (Ligia Skowronski/Veja SP)

Há 35 anos na zona cerealista, o empresário Cláudio Fernandes é testemunha e agente dessa transformação. Ele e o irmão dão continuidade à venda de batata, alho e cebola na Rua Santa Rosa, em um negócio que herdaram do pai, Augusto Fernandes. No início do ano passado, porém, eles abriram no imóvel ao lado o Empório Santa Rita, onde se comercializam mais de 200 itens a granel. “Devo tudo o que tenho ao meu pai e à zona cerealista, mas as vendas do armazém vêm diminuindo ano após ano. Seguir a tendência foi uma questão de sobrevivência”, diz Cláudio.

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Zona Cerealista
Cenas da zona cerealista: a Rua Santa Rosa no início da manhã, cheia de caminhões (Ligia Skowronski/Veja SP)

Outro incentivo para o fortalecimento da zona cerealista é que os paulistanos, a exemplo do que acontece nas grandes capitais do mundo, estão cada vez mais preocupados com alimentação de qualidade e bem-estar. Atento a isso, o empresário Vincenzo Capotorto decidiu dobrar o tamanho do seu Empório do Arroz Integral na Avenida Mercúrio seis anos atrás, anexando a ele uma área de 140 metros quadrados dedicada a suplementos industrializados nacionais e importados — em alguns itens, a economia em relação ao preço praticado por lojas do ramo pode chegar a 50%.

Os preços, a grande oferta de produtos e também a rapidez com que os “alimentos da moda” aparecem por lá garantem lojas cheias, sobretudo aos sábados e às vésperas de datas festivas, como Natal e Páscoa. Ainda assim, há muito paulistano que não quer nem saber de passar perto da zona cerealista.

Vinicius Carvalhal
Vinicius Carvalhal, gestor da Casa Flora: “A união dos comerciantes é um ponto fundamental para melhorar a infraestrutura da região e atrair mais pessoas” (Ligia Skowronski/Veja SP)

No centro, a área tinha tudo para ser um charmoso grande mercado, com calçadas agradáveis, espaços de descanso e fácil acesso (como Barcelona e Lisboa têm a granel). Em vez disso, o trânsito é caótico, são poucos os estacionamentos e a estação de metrô mais próxima, a Pedro II, está a cerca de 800 metros da esquina da Rua Santa Rosa com a Avenida Mercúrio. Uma distância curta mas penosa para quem caminha em meio a uma região malcuidada, com calçadas sujas e muitas sacolas de compra. “Há planos para que o metrô chegue ao Pari, o que facilitaria o acesso à região”, acredita Vinicius Carvalhal, gestor da Casa Flora, a loja mais gourmet da área. A estação a que ele se refere faz parte da futura Linha 19, ainda em fase de estudos e sem previsão, de acordo com o Metrô.

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Carvalhal e Capotorto estão entre as pessoas que vêm, nos últimos tempos, se esforçando para unir os lojistas e, assim, ganhar força para ações de melhoria do entorno. Alguns problemas, contudo, poderiam ser resolvidos só com conscientização. Segundo a Subprefeitura da Mooca, o serviço de limpeza da área é realizado três vezes ao dia, em ações que incluem coleta, varrição, lavagem com jatos de água e limpeza de boca de lobo.

A região conta também com um ecoponto, e a Lei de Limpeza Urbana determina que estabelecimentos que gerem mais de 200 litros de detritos por dia devem contratar coleta privada. Ainda assim, há lojistas que insistem em descartar o lixo incorretamente ou fora de horário, ambulantes que descascam alho na rua e vendedores de coco e outras frutas que, no fim do dia, vão embora deixando para trás e de qualquer jeito o lixo orgânico produzido. Aos que vão às compras, e isso inclui chefs e donos de restaurante, resta desviar.

Zona Cerealista
Vaivém dos funcionários do Andorra, que levam produtos do depósito para a loja ao longo de todo o dia (Ligia Skowronski/Veja SP)

Apesar dos perrengues, a nutricionista funcional, esportiva e materno-infantil Fernanda Granja faz parte do time que frequenta a zona cerealista regularmente e também indica a região a seus pacientes. “Quando não tenho tempo de ir, compro de algumas lojas de lá pela internet.” Para garantir produtos de qualidade, uma de suas estratégias é escolher lojas em que eles têm alta rotatividade. “Isso evita levar para casa alimentos com mofo ou fungos”, explica. Se houver dúvida sobre a procedência, a nutricionista sugere ao comprador pedir o laudo técnico dos produtos. Alguns deles chegam às lojas com esse documento, e em muitos casos as informações também podem ser consultadas na internet.

Além disso, Fernanda reforça que o consumidor deve ficar de olho nas condições de higiene e ceder à tentação de comprar todo tipo de chá baseando-se nas indicações descritas em plaquinhas ou seguindo a recomendação dos atendentes. “Às vezes, a erva serve para uma coisa e atrapalha outra. Seu uso deve sempre ser recomendado por nutricionista ou médico.” No mais, é colocar um sapato confortável, pegar a sacola e ir às compras. “A variedade de produtos é muito grande e a economia compensa”, diz ela.

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Personalidades da Zona Cerealista

Vicenzo Capotorto e Faustão
(Ligia Skowronski/Veja SP)

VINCENZO CAPOTORTO E FAUSTÃO

Onde quer que vá, o empresário é seguido de perto por Faustão, um belo e dócil cão que apareceu por ali oito anos atrás. “Ele é famoso em toda a região, mas me adotou. No fim da tarde, vai sozinho para o nosso armazém de mercadorias. É aí que começa o expediente dele, como cão de guarda.”

Silvio de Araújo Barbosa
(Ligia Skowronski/Veja SP)

SILVIO DE ARAÚJO BARBOSA

Mineiro de Itanhandu, ele chegou a São Paulo em 1951 junto com os fundadores da Casa Flora. “Naquela época, o lixo aqui da rua era recolhido de carroça”, recorda-se o funcionário de 88 anos, morador do Brás e que trabalha na loja desde a sua inauguração.

Amancio Aparecido Pouzzati
(Ligia Skowronski/Veja SP)
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AMANCIO APARECIDO POUZZATI

Aos 60 anos, o carregador filho de italianos começa o expediente às 5 da manhã em uma distribuidora de alho, cebola e batata.“Trabalho na região há 45 anos e só vou para casa para dormir. Tenho uma família aqui.”

 

Oito endereços para encher a sacola

Zona Cerealista
Queijos de produção própria do Camanducaia (Ligia Skowronski/Veja SP)

Andorra Alimentos e Laticínios Camanducaia

Ficam lado a lado, pertencem ao mesmo grupo e, juntos, atendem 60 000 clientes por mês. Funcionários costumam dizer que “o Andorra é para emagrecer e o Camanducaia, para engordar”. A piada interna justifica-se: o primeiro exibe uma oferta maior de itens a granel, o que inclui chás, farináceos de todo tipo, produtos orgânicos, veganos… O Camanducaia, por sua vez, tem jeito de supermercado e vende também gulodices, itens industrializados, embutidos e queijos. Do último grupo, parte vem do laticínio próprio, localizado em Vianópolis (GO), e tem preço atrativo. A mussarela da marca sai a R$ 17,50 o quilo, enquanto o queijo frescal passa na balança a R$ 5,70. A linha inclui ainda ricota (R$ 6,30 o quilo) e manteiga com ou sem sal (R$ 24,50 o quilo). Dica: às sextas, os queijos da casa são vendidos com desconto. Andorra: Rua Santa Rosa, 175, ☎ 3312-3505. 7h/18h (sáb. 7h/14h; fecha dom.); Camanducaia: Rua Santa Rosa, 187, ☎ 3312-7555. 6h/18h (sáb. 6h30/14h; fecha dom.).

Armazém São Vito

Está no time dos mais concorridos. A oferta por quilo inclui glutamina (R$ 83,43) e colágeno hidrolisado em pó (R$ 45,14), petiscos como banana chips salgada (R$ 29,70), guloseimas como bala de goma Fini Amoras (R$ 29,20), além de grãos, farinhas, oleaginosas e frutas secas. Nas prateleiras e freezers encontram-se produtos orgânicos, congelados veganos e até papinha orgânica pronta. Avenida Mercúrio, 180 e 222, ☎ 3227-3020. 8h/17h30 (sáb. 7h/16h; fecha dom.).

Armazém Santa Filomena

Além da concorridíssima loja na Rua Santa Rosa, foi inaugurado, três meses atrás, outro ponto na Avenida Mercúrio. A espera é amenizada por assentos na entrada. Os funcionários atendem, em média, 1 000 pessoas por dia no endereço principal. Cardamomo em pó (R$ 117,30), amêndoa torrada defumada (R$ 48,80), leite de coco em pó (R$ 34,50), damasco turco (R$ 21,60) e arroz arborio (R$ 13,50) estão entre os produtos vendidos por quilo. No site, os mesmos itens custam um pouco mais. Rua Santa Rosa, 100, ☎ 3122-0000; Avenida Mercúrio, 166, ☎ 3228-9699. 8h/17h (sáb. 7h/14h30; fecha dom.). www.armazemsantafilomena.com.br.

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Casa Flora

É a loja mais gourmet da região e também abastece, como importadora, endereços como Casa Santa Luzia e Empório Santa Maria. O consumidor final tem à disposição 6 000 itens, muitos deles difíceis de encontrar ou de importação exclusiva, a exemplo da fava de baunilha (R$ 30,00) e do presunto Pata Negra Ibérico com sessenta meses de cura, que custa R$ 1 038,00 o quilo. É também um bom lugar para comprar azeites, massas, queijos e bacalhau de qualidade — as peças ficam longe das mãos dos clientes, em ambiente refrigerado. Metade da loja é dedicada exclusivamente às bebidas, sobretudo vinhos, que chegam a 2 000 rótulos. Rua Santa Rosa, 197, ☎ 2842-5199. 8h/17h30 (sáb. até 1h; fecha dom.).

Casa de Saron

Ali são dispostos cerca de 1 400 itens vendidos a granel entre grãos, farinhas, frutas secas, azeitonas e temperos. O arroz 8 grãos (R$ 7,90 o quilo), está entre os itens mais requisitados, ao lado de oleaginosas como a castanha-do-pará large (R$ 46,90 o quilo). Vegetarianos encontram alternativas inusitadas, caso da feijoada, mistura de feijão, proteína de soja e temperos (R$ 20,50 o quilo) pronta para ir à panela. Produtos diet, orgânicos e suplementos também estão nas prateleiras. No site, a oferta é menor e os preços saem, em média, por 5% a mais. Avenida Mercúrio, 146, ☎ 3229-7864. 8h/17h (sáb. até 14h30; fecha dom.). www.lojacasadesaron.com.br

Empório Arroz Integral: sessão de alimentos
Empório Arroz Integral: sessão de alimentos (Ligia Skowronski/Veja SP)

Empório do Arroz Integral

É um dos mais movimentados da Avenida Mercúrio e ocupa dois imóveis vizinhos. Um deles expõe prateleiras repletas de produtos alimentícios, freezer com congelados veganos e centenas de caixas acrílicas com ingredientes a granel. Só de granola, há treze variações (de R$ 9,10 a R$ 19,20 o quilo). Uma passagem leva ao prédio ao lado, dedicado exclusivamente a suplementos. Ali, a turma da academia conta com a ajuda de consultores para escolher entre os mais de 1 000 produtos de marcas nacionais e importadas. Há, por exemplo, clara de ovo desidratada (R$ 49,99 o quilo), variações de pastas de amendoim (a partir de R$ 11,99 o pote de 1 quilo), whey protein (a partir de R$ 38,00, com 900 gramas) e aminoácidos em cápsulas (a partir de R$ 20,00, com 100 unidades). Avenida Mercúrio, 86, ☎ 3313-2053. 7h/17h30 (sáb. 6h/16h; fecha dom.).

Empório Santa Rita

Aberto há menos de um ano, o estabelecimento exibe uma oferta de produtos a granel menor que a dos vizinhos. Mas compete em preços e tem filas menores. Açúcar de coco (R$ 24,90), hibisco em flores (R$ 14,00), linhaça dourada (R$ 6,90) e grão-de-bico de 9 milímetros (R$ 6,99) estão entre os 200 produtos à venda por quilo. Rua Santa Rosa, 74, ☎ 3227-0797. 8h/17h (sáb. 7h30/14h; fecha dom.)

Publicado em VEJA SÃO PAULO de 13 de fevereiro de 2019, edição nº 2621.

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