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Queda de viaduto na Marginal expõe o péssimo estado dos elevados de SP

O problema na estrutura de 1978 escancara os problemas de manutenção nas obras de engenharia viária da capital, com orçamento cada vez menor

Por Sérgio Quintella Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Mariana Rosario Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 22 nov 2018, 15h11 - Publicado em 22 nov 2018, 15h00
Pista fechada ao lado do Parque Villa-Lobos (Luiz Guarnieri/Divulgação)
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O viaduto que ruiu na Marginal Pinheiros na madrugada do dia 15 oferece um curso intensivo sobre o esfarelamento das contas públicas e a debilidade do Poder Executivo. Na última década, o orçamento para a manutenção de viadutos minguou: o então prefeito Gilberto Kassab gastou, em valores corrigidos, 31 milhões de reais entre 2009 e 2012, dos quais 22 milhões no seu último ano de mandato. Fernando Haddad despendeu 15 milhões em 2013 e nenhum centavo nos três anos seguintes. João Doria desembolsou mísero 1,5 milhão de reais no ano passado, e a gestão Bruno Covas, 2,4 milhões neste ano. Nesse ritmo, a cada mandato, tal verba cai à metade. Apenas os custos da previdência municipal já consomem o equivalente a 87% da arrecadação do IPTU hoje.

Agora, a prefeitura pretende utilizar o colapso estrutural como gatilho para verificar a situação de 185 obras de engenharia erguidas na metrópole. A decisão ocorre uma década depois de a municipalidade ter se comprometido com o Ministério Público a fazer a manutenção preventiva nas estruturas. Sem cumprir o acordo, a cidade responde na Justiça a uma ação de indenização que pode custar mais de 55 milhões de reais aos cofres públicos — valor suficiente para reformar dez viadutos.

Em setembro de 2017, uma reportagem de VEJA SÃO PAULO mostrou um estudo do Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco) que analisava as condições de setenta viadutos e pontes da capital. Em graus diferentes, todos exigiam algum tipo de intervenção imediata. No mesmo mês, a gestão João Doria anunciou um plano de recuperação dos dezoito locais mais deteriorados. O viaduto que caiu no feriado da Proclamação da República não estava entre eles.

Viaduto Aricanduva
Viaduto Aricanduva: árvores comprometem o elevado de concreto (Marcelo Justo/Veja SP)

A empreitada, no entanto, esbarrou em questionamentos do Tribunal de Contas do Município (TCM), que apontou diversas irregularidades na licitação. Até hoje a (tímida) proposta não saiu do papel. A novela da paralisia é clássica: licitações muitas vezes mal redigidas, brecadas pelos órgãos de controle, habitualmente em maior número (e com equipes mais preparadas e com mais recursos que as do Executivo).

Agora, a mesma prefeitura quer sentar-se com auditores do órgão para que uma concorrência emergencial contemple a análise das 185 estruturas propostas. Ainda que com o possível aval do tribunal, esse trabalho referes-e apenas à verificação de anomalias, não aos efetivos consertos. Ou seja, em menos de um ano a situação não deve ser corrigida. “Também não adianta fazer todas as obras de uma vez e depois parar”, afirma o engenheiro Gilberto Antonio Giuzio, responsável pelo levantamento do Sinaenco. “É preciso haver uma continuidade para que a remediação não saia mais caro que a prevenção.”

“Independentemente das previsões passadas, não vai faltar dinheiro para que a gente resolva a situação de uma vez”, diz o prefeito Bruno Covas. “Se for preciso, recorreremos aos governos federal e estadual para obter as verbas necessárias.”

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No caso atual do viaduto na Marginal Pinheiros, a prefeitura estuda a possibilidade de um erro no projeto ter causado o acidente. Especialistas, no entanto, afirmam que a falta de vistorias e manutenções costuma ser a grande vilã. Há inclusive exemplos de locais, como o Viaduto Aricanduva, em que árvores crescem livremente pelo meio das estruturas, comprometendo concreto e ferragens.

Catão Ribeiro
O engenheiro Catão Ribeiro, projetista da Ponte Estaiada (Ricardo D’angelo/Veja SP)

Na terça (20), a CET interditou mais um trecho problemático, na Ponte do Limão, por causa de uma rachadura — pela fenda era possível ver o tráfego na Marginal Tietê, abaixo. “Basta observar outras pontes na cidade para perceber partes enferrujadas, concreto rachado e manchas de umidade”, diz o diretor da Associação Brasileira de Engenharia e Consultoria Estrutural, Eduardo Millen. De acordo com a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), cada construção do tipo deveria passar por análises profundas a cada cinco anos, o que está longe da realidade. Um exemplo disso é a Ponte Estaiada Octavio Frias de Oliveira, que não recebeu manutenção desde sua inauguração, em 2008. “Ela tem partes cheias d’água, está enferrujando”, diz o engenheiro responsável pelo monumento, Catão Francisco Ribeiro. “A obra que eu me orgulho de ter projetado vai para o vinagre”, lamenta.

No ano passado, a construção recebeu apenas demãos de tinta e teve a iluminação restabelecida durante o programa de zeladoria Cidade Linda, promovido por João Doria, a um custo de 900 000 reais, bancados pela iniciativa privada. Procurado, o secretário de Infraestrutura Urbana, Vitor Aly, confirmou a falta de atuação da prefeitura, mas culpou o próprio projetista. “Até hoje não recebemos o caderno de manutenção, primordial para que possamos analisar os estais.” Ribeiro afirma não ter sido questionado sobre a documentação e isenta-se ao argumentar que as normas de manutenção de pontes estaiadas são padronizadas internacionalmente. “É desculpa de incompetente”, diz Catão Ribeiro.

No exterior, há dedicação maior ao cuidado de construções do tipo para evitar desastres. Nos Estados Unidos, a taxa de pontes problemáticas caiu de 12% para 9% em uma década. “Em outros países, como Noruega e Japão, existe um interesse ativo do governo na inspeção das pontes”, diz o engenheiro civil Matheus Marquesi, professor da PUC-SP.

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São Paulo 22 de setembro 2017Foto Alexandre Battibugli
Teto de viaduto sobre a Avenida Pacaembu com ferragens à mostra: anos de falta de manutenção (Alexandre Battibugli/Veja SP)

A consequência imediata do colapso no viaduto da Marginal Pinheiros foi sentida no tráfego de veículos. Como nos períodos de pico passam cerca de 7 500 carros por hora pela pista expressa, a via local ficou imediatamente responsável por absorver esse trânsito. No primeiro teste de fogo, realizado na quarta-feira (21), após seis dias de feriados e suas emendas, o congestionamento foi grande, mesmo depois de a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) montar operações em avenidas paralelas, como a Gastão Vidigal e a Professor Fonseca Rodrigues. Nesses locais, o tempo dos semáforos foi alterado e faixas reversíveis devem ser criadas. “Ainda assim, sabemos que a capacidade total da pista interditada não será absorvida nas vias próximas, também já saturadas”, afirma o secretário de Transportes, João Octaviano Machado Neto. “A nossa cidade depende das marginais.”

Esta não é a primeira vez que a cidade põe à prova sua “Marginal dependência”. Em 2011, uma corrida da Fórmula Indy realizada em plena segunda- feira na pista local da Marginal Tietê deu um nó no trânsito. Para quem estuda a área, priorizar obras que facilitem a mobilidade coletiva, caso de metrô e corredores de ônibus, seria uma solução para um grande número de paulistanos optarem por vias alternativas. “Em dez ou vinte anos, seria possível criar uma grande operação de BRT na cidade”, propõe Horácio Figueira, engenheiro de trânsito.

Ponte do Limão
A Ponte do Limão, na Zona Norte: rachaduras (WertHer santana/Estadão Conteúdo)

Inaugurado em 27 de outubro de 1978 pelo então prefeito Olavo Setubal, o viaduto que ruiu ao lado do Parque Villa-Lobos, no Jaguaré, possui 500 metros de extensão e não tem nome oficial. A obra faz parte do prolongamento do Cebolão, a ligação entre as marginais. Construída sobre a linha férrea da atual Companhia Paulista de Transportes Metropolitanos (CPTM), a passagem fez com que os carros não precisassem mais aguardar a circulação dos trens toda vez que quisessem atravessar o trecho. “Agora teremos de adequar esses projetos antigos à nossa realidade, mais moderna”, diz o secretário Vitor Aly, que tentava localizar o projeto de execução da construção nos dias seguintes ao acidente. “O aço usado mudou com o passar dos anos e o concreto de hoje é mais moderno que o de antigamente.”

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Isso se houver uma mudança na cultura pública local, que sempre privilegiou os gastos em obras novas em detrimento dos mais modestos com manutenção. A receita disponível para investimentos caiu de 11,3% para 5,3% do orçamento municipal na última década.

DRAMA SUSPENSO

Outros problemas em viadutos e pontes da capital

Ponte dos Remédios, onde uma parte da mureta de proteção desabou.
Ponto dos Remédios, onde uma parte da mureta de proteção desabou (Fernando Moraes/Veja SP)

Remédios, 2011

A ponte, sobre o Rio Tietê, permaneceu interditada por seis meses após a queda de 15 metros da mureta e da calçada.

Pompeia, 2012

Um incêndio no barracão da escola de samba Mocidade Alegre afetou a estrutura do viaduto, na Zona Oeste, e provocou a queda de 40 metros da calçada.

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Orlando Murgel
Incêndio na Favela do Moinho (Sergio Quintella/Veja SP)

Orlando Murgel, 2012

Outro incêndio, dessa vez em barracos da Favela do Moinho, deixou um morto e atingiu o viaduto, que liga as avenidas Rio Branco e Rudge, no centro.

Tamanduateí
Ponte sob o Viaduto Grande São Paulo, desabou sobre o córrego (Rede Globo / Reprodução/Veja SP)

Tamanduateí, 2015

Ponte sob o Viaduto Grande São Paulo, entre os bairros de Vila Prudente e Ipiranga, desabou sobre o córrego.

Santo Amaro, 2016

O viaduto ficou seis meses fechado e teve a estrutura comprometida depois que dois caminhões bateram, provocando um incêndio.

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