Subprefeituras têm grande número de coronéis da PM reformados
Das 31 regiões, 22 estão sob o comando de ex-policiais com a patente
A prefeitura de São Paulo deu novo sentido a uma velha prática da política brasileira: o coronelismo. Das 31 subprefeituras paulistanas, 22 estão sob o comando de coronéis da reserva da Polícia Militar, oficiais que se aposentaram no posto máximo da hierarquia da corporação. Juntos, eles gerenciam um território onde vivem cerca de 7 milhões de pessoas, ou 66% da população da capital. Estima-se que mais de sessenta coronéis aposentados componham os quadros municipais, tanto em subprefeituras como em secretarias. O total representa 10% da reserva do estado e se equipara ao total de coronéis na ativa (62).
Esse “coronelismo paulistano”, no entanto, não guarda nenhuma semelhança com aquele que atingiu o auge na República Velha, marcado pelo mando e desmando de chefes políticos atrasados. Pelo contrário: o poder dos subprefeitos-coronéis da metrópole é apenas gerencial. Com esfera de atuação e orçamentos minguantes, as subprefeituras se tornaram zeladorias, responsáveis por executar pequenos serviços como poda de árvores e conserto de buracos. “Os coronéis são experientes e competentes em seguir o que é proposto”, diz o secretário de Coordenação de Subprefeituras, Ronaldo Camargo. Contam a seu favor a pouca idade com que passam para a reserva, por volta dos 53 anos — um privilégio e tanto da PM —, e a experiência em gestão de pessoas, já que estavam à frente de batalhões com centenas e até milhares de subordinados. Financeiramente, é um bom negócio. Ao deixarem a corporação, eles recebem aposentadoria média de 9.000 reais. Como subprefeitos, acrescentam aos ganhos mensais o salário em torno de 6.000 reais.
Esses ex-oficiais se encaixam ainda nos planos do prefeito Gilberto Kassab de compor um governo centralizado. “Quisemos dar uma configuração técnica, com profissionais sem ambição política”, afirma Camargo. Apesar de vários deles já terem sido convidados a se candidatar a deputado ou vereador, se dizem desinteressados da política partidária e, afirmam, preocupados apenas em cumprir a missão que receberam. “Estou aqui para servir”, diz o antigo comandante do Corpo de Bombeiros Metropolitano, coronel João dos Santos de Souza. Antes de se tornar titular do Itaim Paulista, há um ano, enfrentou encrencas como o incêndio do Teatro Cultura Artística. Para compor seu estado-maior, trouxe mais dois coronéis e um major. Apenas da turma dele da Academia do Barro Branco, classe de 1979, há pelo menos mais dois subprefeitos, Izaul Segalla Junior, em Perus, e Ailton Araújo Brandão, em Santo Amaro. “Antigamente, era preciso pedir à PM que patrulhasse a região”, lembra Brandão, que tem outros dois ex-colegas em sua equipe. “Agora, eu mesmo faço isso.”
No dia a dia, há os que exigem ser tratados por coronel e os que evitam o título, para não intimidar. “Quero que o público se sinta próximo de mim”, diz Sergio Teixeira Alves, que, à frente de Santana e Tucuruvi, dispensa o tratamento oficial. O primeiro a assumir uma subprefeitura na atual administração foi Rubens Casado, destacado para a Mooca em 2008 com o objetivo de pôr fim a denúncias de corrupção de fiscais. A experiência abriu caminho para que outros fossem escalados, caso de Nevoral Alves Bucheroni, alçado de chefe de gabinete para subprefeito de Pinheiros e, agora, da Sé. “Estamos acostumados com desafios”, afirma.
Historicamente, as subprefeituras são peças do quebra-cabeça político municipal. Implantadas na gestão da petista Marta Suplicy (2001-2004) para substituir as administrações regionais, alvo de denúncias de corrupção no governo de seu antecessor, Celso Pitta (1997-2000), elas logo viraram moeda de troca entre Executivo e Legislativo. Quando José Serra (2005-2006) assumiu, colocou nos cargos ex-prefeitos do interior, que emprestaram sua experiência com a máquina pública e ajudaram a fortalecer a bem-sucedida candidatura do tucano ao governo do estado. Agora, além de não disputarem espaço sob os holofotes com o prefeito, os subprefeitos-coronéis têm outra atribuição. Servem para minar a presença em suas regiões dos vereadores do chamado Centrão, bloco que reúne parlamentares de vários partidos e dita o ritmo das aprovações legislativas. No regimento de Kassab, apenas um coronel comanda: ele próprio.