Protesto de estudantes termina em confronto na República
Ato, que seguia de forma pacífica, pedia a revogação definitiva da reorganização de ciclos de ensino na rede estadual. Agências foram depredadas
Protesto de estudantes contra a reorganização das escolas estaduais terminou em confronto na região central da cidade na noite de quarta (9). A reforma foi suspensa por um ano na sexta (4), mas parte dos alunos quer a revogação total do projeto.
O ato, que começou no vão livre do Masp por volta das 17h, ocupou os dois sentidos da via. Das 18h até 21h, os cerca de 2 000 estudantes (números da Polícia Militar) marcharam de forma pacífica até a Praça da República, onde fica a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. Apesar de gritos de guerra contra o governo, não havia violência, até que se ouviu uma explosão. Não há registro de imagens que revele de onde tenha partido. “Os black blocs começaram e a polícia reagiu”, diz o estudante Ka-el Reis, que integra a ocupação da escola Fernão Dias Paes, em Pinheiros, presente no ato.
Manifestantes estouraram rojões e policiais tentaram dispersar a multidão com bombas de gás lacrimogêneo, de efeito moral e gás de pimenta. O vídeo acima mostra essas cenas e também o momento em que um policial militar faz dois disparos em meio à confusão. “É de borracha”, disse ele à reportagem de VEJA SÃO PAULO, ao ser questionado sobre o tipo de munição utilizada. A Secretaria da Segurança Pública disse que apuraria a informação, mas ressaltou que a atuação foi correta dentro do contexto. “A SSP ressalta a necessidade da avaliação do cenário completo, para que se perceba que os policiais militares estavam sendo atacados por pedras e rojões e adotaram o correto procedimento de dispersão, com tiros para o alto.”
O perito Ricardo Molina afirma não ter dúvidas de que se trata de uma arma de fogo. “Embora existam pistolas para balas de borracha, são bem maiores, e coloridas. A usada nas imagens corresponde à pistola padrão usada pela PM, que é letal.”
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A polícia diz que houve dez pessoas detidas, mas ninguém terminou preso. Abaixo, a nota oficial enviada a VEJA SÃO PAULO:
A Secretaria da Segurança Pública informa que foi absolutamente necessária a intervenção da PM ao final do protesto dos estudantes e demais movimentos, nesta quarta-feira (9), na Praça da República, após diversos manifestantes iniciarem depredação ao patrimônio público, agressões contra policiais, com pedras, paus e rojões, destruição a propriedade privada e atos de vandalismo explícito, como demonstram fotos e gravações que estão à disposição de toda a mídia, pela assessoria de imprensa da SSP.
A atitude de grupos de manifestantes deixou clara a motivação política e criminosa dessa quarta, com diversos black blocs com o rosto encoberto, integrantes da Apeoesp e pessoas ligados a partidos políticos, vestidos com camisetas da Juventude Comunista. Os agressores incitavam agressões e insultos à PM, tendo causado ferimentos em oitopoliciais, que precisaram ser medicados no PS Vergueiro.
Foram quebradas inúmeras vidraças de condomínios residenciais e estabelecimentos comerciais, além de lixeiras e telefones públicos. Caçambas de entulho foram reviradas na Rua da Consolação para interditar a passagem das pessoas e usar o resto de material de construção para atacar os PMs. Também foi ateado fogo em sacos de lixos nas vias públicas, colocando em risco os demais transeuntes.
DEPREDAÇÃO
Algumas pessoas atearam fogo em lixo e duas agências bancárias (Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal) foram depredadas. Viaturas e carros foram apedrejados, lixeiras e orelhões, depredados. De acordo com o jornal O Estado de S. Paulo, um estilhaço feriu seu repórter fotográfico, Tiago Queiroz, que não precisou de atendimento médico.
Três estudantes em fuga buscaram abrigo dentro de um teatro e foram seguidos por policiais. “Eles foram jogando as motos contra os meninos. Entraram na bilheteria atrás deles e bateram com socos e cassetetes”, disse o diretor musical do Núcleo Bartolomeu de Depoimentos do Teatro de Arena, Eugênio Kusnet, que fazia uma aula no local sobre violência policial, com base em caso dos panteras negras nos Estados Unidos. O teatro pertence à Fundação Nacional de Artes (Funarte), do governo federal.
Um dos garotos ficou ferido na face durante a operação da PM e foi encaminhado de ambulância para a Santa Casa de Misericórdia, no centro. No meio do confronto, estudantes discutiram com black blocs por discordar da estratégia de violência adotada pelo grupo minoritário.
Começo pacífico
A manifestação começou pacífica no vão livre do Masp. Na Avenida Paulista, o grupo decidiu manter as invasões dos colégios – segundo a pasta, 136 unidades estavam tomadas por alunos ontem; o movimento chegou a ocupar 196 escolas no Estado. O movimento seguiu da Avenida Paulista para a 9 de Julho, passando pelas Praças 14 Bis e da Bandeira, Viadutos Maria Paula e do Chá, até chegar à Praça da República.
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No percurso, o clima foi de protesto contra a política educacional de Alckmin – o governador pretendia fechar no próximo ano 93 escolas, transformar 754 em ciclos únicos e transferir 311 mil alunos, mas suspendeu a reorganização para “dialogar” com pais e alunos. “Tem de haver um planejamento de como será essa discussão nas escolas. Porque, até agora, o que vimos foi uma imposição”, afirmou Victor Pinheiro, de 16 anos, aluno do 2.º ano da Escola Estadual Moacyr Campos, na zona leste. A unidade chegou a ser ocupada, mas os estudantes já deixaram o prédio.
Para a estudante Munique Millian, de 17 anos, não há sinais de que o governo esteja disposto a abandonar totalmente o projeto de reorganização. “Quando começarem os debates nas comunidades, nas escolas, quando houver uma agenda de debate, a gente começa a acreditar”, disse a aluna do 3.º ano da Escola Estadual Salvador Rocco, na Vila Carrão
Desocupação
A desocupação dos colégios tem acontecido aos poucos. Na Caetano de Campos, da Aclimação, na Zona Sul da capital, os estudantes entregaram na quarta-feira (8) as chaves à diretoria. Nesta sexta, as aulas voltam ao normal. Segundo a Secretaria de Educação, 126 escolas continuam ocupadas no Estado – eram 196 na semana passada. Ou seja, de sábado até hoje (quarta), setenta instituições foram “devolvidas”.
Na homônima Escola Estadual Caetano de Campos, que fica na Praça Roosevelt, no centro, os alunos devem permanecer até sexta-feira. “Ganhamos uma luta, mas ainda tem uma grande batalha pela frente no ano que vem”, disse o estudante Lucas Mesquita, de 18 anos, que cursa o 2º ano do ensino médio.
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A Escola Estadual Brigadeiro Gavião Peixoto, em Perus, na Zona Norte, foi desocupada pelos alunos na terça (8). É a maior instituição estadual na capital, com 3 200 matriculados. Na Professor Sílvio Xavier Antunes, no Piqueri, na Zona Norte da capital, e na Maria Petronila Limeira dos Milagres Monteiro, na Zona Sul, os alunos também já saíram.
O mesmo ocorreu no interior e na Região Metropolitana, em cidades como Jundiaí, Campinas, Sorocaba e Osasco.
Impasse
No entanto alguns colégios importantes, como o Fernão Dias Paes, em Pinheiros, continuam tomados. “Queremos uma garantia que a projeto foi cancelado e que nenhuma escola será fechada”, diz Karina, de 16 anos, aluna da Escola Estadual Maria José, no Bixiga, centro de São Paulo. (Com Estadão Conteúdo)