Prefeitura lança manual do centro histórico para orientar reformas
Documento é útil por facilitar conhecimento sobre prédios tombados, mas, segundo especialistas, é apenas um pequeno passo até a requalificação da região
Centro e degradado é um namoro daqueles que todos torcem para terminar logo. Mas, ao contrário de um casal comum, não basta uma das partes se cansar do flerte: o relacionamento abusivo, que começou nos anos 1970, por vezes parece infindável. Um documento elaborado pela Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento, lançado neste mês, tenta dar uma ajudinha: o Manual Centro Histórico — Manutenção, Conservação, Reforma e Restauro simplifica a compreensão dos procedimentos para a renovação de um prédio tombado.
Outra parte do estudo foca o chamado Triângulo Histórico, o núcleo original da cidade (formado pelas ruas Benjamin Constant, Boa Vista e Líbero Badaró), onde ficam prédios como o Edifício Martinelli e o Altino Arantes. Os vértices do triângulo correspondem às igrejas de Nossa Senhora do Carmo (1592), Mosteiro de São Bento (1598) e a Paróquia de São Francisco de Assis (1647).
“O trabalho começou em 2019. O objetivo é orientar os proprietários sobre como cuidar e recuperar as fachadas. Tivemos participação da SP Urbanismo, da Secretaria de Cultura e de uma equipe da FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo)”, diz o secretário municipal de Urbanismo e Licenciamento, Cesar Azevedo. Na parte sobre o Triângulo, o paulistano tem acesso a uma análise das 285 construções que ficam na área de 185 000 metros quadrados, além de informações históricas dos edifícios.
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Dentro do manual, regras da Lei Cidade Limpa, como o tamanho permitido para a logomarca do estabelecimento e procedimentos para qualquer alteração em um prédio tombado (ou em área envoltória de tombamento), ficam de fácil compreensão no material didático, voltado também para locatários.
“É uma iniciativa bem-vinda, que esclarece a respeito da legislação e das obrigações para a manutenção desses bens”, opina a representante do Instituto de Arquitetos do Brasil no Conselho Municipal do Patrimônio Histórico (Conpresp), Eneida de Almeida, que é também professora e pesquisadora da Universidade São Judas. A ação é um primeiro passo, mas está longe de resolver as questões práticas da degradação.
O advogado e membro do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico (Condephaat) Marcelo Manhães afirma que o material informativo é um ganho, mas a prefeitura precisa ir além: “Faltam aspectos importantes, como criar uma política de incentivos ao proprietário e locatário de bem tombado, como isenções tributárias e linhas de crédito para reformas, que custam uma fortuna. É preciso também uma legislação que incentive a reforma, o retrofit. As normas são pensadas para prédios novos, e não para um do século passado”, diz.
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“No bem tombado, o ônus sempre fica para o proprietário. Você demora dois anos para fazer a reforma. Só um manual não ajuda, os urbanistas do Conpresp e da SP Urbanismo acham que as pessoas vão fazer (a conservação) por ideal, mas os proprietários querem algo em troca”, comenta o empresário Fábio Redondo, 43, dono de imóveis na região.
“O manual é o primeiro passo. Temos uma segunda ação, que é fazer a requalificação do calçamento da região. A gestão Covas aprovou a Lei de Incentivo Fiscal, que agora passará por uma regulamentação, estamos discutindo um decreto para regulamentar isenções. Também planejamos um amplo programa (para o incentivo de) retrofit na região central”, explica o secretário Cesar Azevedo.
O estudo do Triângulo Histórico escancara outro problema clássico, o esvaziamento: dos 285 prédios, 91 estão com as portarias inativas e quarenta não possuem acesso pela rua aos pavimentos superiores — o que dificulta a diversificação de uso. “O centro acaba só existindo em horário comercial”, afirma Eneida de Almeida. “Com esse mapeamento você começa a identificar, por exemplo, que um prédio poderia ter a mudança de uso comercial para residencial”, explica Marcelo Manhães.
Com a discussão do Plano Diretor de 2014, que, apesar de válido até 2029, será revisto em 2021, abre-se a possibilidade de facilitar a transformação. “Uma das propostas que vamos colocar em discussão no processo participativo é como incentivar a troca de uso, para que os prédios passem a ser residenciais. (A requalificação) do centro foi um compromisso do Bruno Covas, e o prefeito Ricardo Nunes tem dito que esse e tantos outros serão honrados”, finaliza o secretário.
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Triângulo Histórico e arredores
A – Viaduto Santa Ifigênia
B – Largo de São Bento
C – Pátio do Colégio
D – Praça da Sé
E – Largo de São Francisco
F – Viaduto do Chá
G – Vale do Anhangabaú
Para acessar o manual, leia o QR code:
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Publicado em VEJA São Paulo de 26 de maio de 2021, edição nº 2739