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Parque Augusta bate recorde de visitantes e vira “praia” paulistana

Um ano após a inauguração, local já recebeu 1,6 milhão de pessoas, que costumam usar o gramado para tomar sol de sunga e biquíni

Por Mattheus Goto
25 nov 2022, 06h00

Biquínis, sungas, cangas e cadeiras de praia sob o sol forte. A cena, tão típica do litoral, ultimamente pode ser presenciada em pleno Centro de São Paulo. O cenário é o Parque Augusta, inaugurado em novembro de 2021 na altura do número 200 da famosa rua paulistana. Nos feriados e fins de semana de sol, o espaço de 23 000 metros quadrados — equivalente a apenas três campos de futebol — fica cheio de visitantes com os mais diferentes perfis, mas principalmente de “banhistas sem mar” da capital.

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Pessoas deitadas e sentadas no chão e em cadeiras de praia tomam sol no Parque Augusta. A maioria usa roupas de praia
Sábado de sol em novembro: corpos à mostra na “prainha” (Mattheus Goto/Veja SP)

Nos dias de calor, quem chega pela entrada principal, na Rua Caio Prado, cruza o portal tombado do antigo colégio que funcionou ali e depara com um amplo gramado lotado de corpos à mostra. A área ganhou um justo apelido dos frequentadores: prainha. Nos dias mais concorridos, não é fácil encontrar espaço disponível para se acomodar. A concentração se reflete em números. No primeiro ano de funcionamento, o Parque Augusta foi o mais visitado da cidade por metro quadrado.

Recebeu 1,6 milhão de pessoas, segundo a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente, um contingente cinco vezes maior que o do Parque Buenos Aires (de 18 700 metros quadrados) e igual ao do Parque Aclimação (de 112 200 metros quadrados). Alguns domingos ultrapassaram a marca de 20 000 visitantes — quase uma pessoa por metro quadrado se estivessem todos ali ao mesmo tempo. A turma é diversa, mas majoritariamente formada por jovens adultos na faixa dos 20 ou 30 anos, em geral portando poucas vestimentas.

Paulistanos tomam sol e praticam esportes no parque Augusta, região central de São Paulo
(Joel Silva/Veja SP)

Ao redor da “prainha”, distribui-se o restante do parque: uma área para crianças, uma arquibancada onde acontecem atividades culturais, a Casa das Araras (outra construção tombada, dedicada a pequenas exposições), um cachorródromo e uma trilha arborizada de 700 metros.

Morador da região, o pesquisador Heitor Botan, 34, faz caminhadas matinais no parque durante a semana. Nos dias de folga, convida os amigos para tomar sol e jogar conversa fora em rodas regadas a drinques, cervejas e petiscos. “É o meu acontecimento do fim de semana”, ele conta, durante um sábado ensolarado de novembro, quando confraternizava com as amigas Elisa Evangelista, 35, Bruna Gallo, 34, Anita Stefani, 35, e Ana Luiza Rijo, 35.

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Crianças brincam em parquinho no Parque Augusta em um dia ensolarado
Parquinho: pequenos às vezes fazem fila para poder brincar (Joel Silva/Veja SP)

Na turma, é consenso que o local se tornou o principal — e talvez o primeiro — ponto de bronzeamento a céu aberto da capital. O ambiente arborizado e o público diverso, seja em cor, orientação sexual ou padrão estético, são os diferenciais. “Tem um pessoal que pega sol no Minhocão, mas ali não tem verde e o calor do asfalto é forte. No Ibirapuera e no Villa-Lobos, a galera não vai de biquíni”, diz Elisa. “Quando vim aqui pela primeira vez e vi gente de biquíni, entendi que é um espaço seguro”, completa Bruna, moradora de Perdizes. “No Ibirapuera, eu ia no máximo de top, sem mostrar a bunda”, comenta Ana. “Aqui pode mostrar a bunda”, concorda Anita.

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A alta popularidade é uma sonora resposta ao imbróglio que marcou a construção do parque. Entre 1907 e 1969, o espaço abrigou o Colégio Des Oiseaux e a Escola Santa Mônica, demolidos em 1974 — cujas ruínas foram parcialmente preservadas. Na época, a prefeitura encontrou uma declaração de utilidade pública da área e decretou a proteção do bosque e a fruição pública. Em 1989, uma decisão estadual considerou as árvores patrimônio ambiental.

Grupo de amigos toma sol no Parque Augusta
“Vi pessoas de biquíni e entendi que era um espaço seguro”, diz Bruna Gallo, 34, de vermelho na foto (Ligia Skowronski/Veja SP)

Em 2002, uma atualização do Plano Diretor permitiu a implantação de um parque no local, o que despertou o interesse de ativistas e moradores. Mas, em 2015, a maré virou. O Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental) aprovou a construção de três torres residenciais no espaço, com a condição de que uma área verde nos fundos fosse preservada. As construtoras Setin e Cyrela, proprietárias do terreno, pretendiam transformá-la em um parque privado. Ativistas de coletivos pró-parque chegaram a invadir o local e abri-lo ao público à força. A reintegração de posse ocorreu meses depois.

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Mapa com parques da cidade
(Arte/Veja SP)

Um dos principais argumentos dos manifestantes era que se tratava de uma raríssima área permeável na região central (veja o mapa abaixo). “Fizemos inúmeros estudos para contrapor as empresas. Queriam levantar prédios, mas dezenas de edifícios ao redor tinham apartamentos à venda. Depois quiseram fazer uma escola, mas havia quatro prédios escolares abandonados no entorno”, afirma a advogada Célia Marcondes Smith, 67, fundadora e vicepre sidente da Sociedade de Amigos e Moradores de Cerqueira César.

Show acontecendo no Parque Augusta
Arena (Joel Silva/Veja SP)
Cachorródromo
Cachorródromo (Ligia Skowronski/Veja SP)

DIVERSÃO E ARTE

As atividades esportivas (como a ioga) e culturais são oferecidas pela vizinhança e por artistas de rua. O espaço também é usado para eventos como a Virada Sustentável, que ocorreu na primeira quinzena de novembro. A arquibancada para as apresentações artísticas é chamada de “arena”

Em 2018, um acordo entre o Ministério Público, as construtoras e a prefeitura trocou a área verde por títulos de potencial construtivo no valor de 11 milhões de reais. Ou seja, as empresas receberam licenças para construir em outro lugar o que seria levantado no Parque Augusta. Em abril de 2019, enfim, o terreno foi transferido à prefeitura. O projeto foi aprovado pelo ex-prefeito Bruno Covas (PSDB), morto em maio de 2021 e homenageado com o nome oficial do espaço: Parque Augusta — Bruno Covas.

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Parque Augusta
“Não é só um lugar de paz e natureza: é para conhecer pessoas”, diz Rafael Sannini, 30 (Ligia Skowronski/Veja SP)

A localização central acabou por influenciar o perfil do público que frequentaria o parque. “Ele reflete o entorno. Como a Consolação tem uma presença forte da comunidade LGBTQIAP+, a área verde se tornou mais diversa. Mas tem muita gente que vem de bairros mais distantes”, diz o médico Renato Buarque, 33, outro assíduo visitante do espaço. “Há também a vantagem do horário estendido, que vai das 5h às 21h (o Trianon abre até as 18h e o Buenos Aires, até as 19h)”, ele afirma.

Paulistanos tomam sol e praticam esportes no parque Augusta, região central de São Paulo
“O parque reflete o entorno, que tem uma comunidade diversa”, diz Renato Buarque, 33 (Joel Silva/Veja SP)

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A fórmula faz sucesso inegável. “Não é só um lugar de paz, em meio às árvores: é para paquerar, trocar ideia, conhecer gente. É o burburinho”, diz o gerente de mídias sociais Rafael Sannini, 30, que vai ao parque uma vez por semana tomar sol e passar tempo com amigos, como a analista de marcas Isadora Campos, 30. “O público torna o lugar muito seguro; me sinto melhor aqui do que no Ibirapuera”, ele acrescenta.

Paulistanos tomam sol e praticam esportes no parque Augusta, região central de São Paulo
(Joel Silva/Veja SP)

O Parque Augusta, de fato, confirma a tese de que lugares com muita gente são mais seguros. Não houve nenhum registro de assalto, roubo ou furto no local ao longo do primeiro ano de funcionamento, segundo Heraldo Guiaro, gestor do parque na Secretaria do Verde e Meio Ambiente. “Procuramos manter uma boa relação com as pessoas em situação de rua da região”, ele explica — a maioria vive ao longo do polêmico muro que separa o parque da Rua Augusta. A limpeza também chama atenção. “Eu levava minha filha à Praça 14 Bis, mas ali fica sujo, não é legal. Prefiro aqui, tem bastante brinquedo e é mais bem cuidado”, diz a comerciante Sueli Santana, 45. Moradora da Avenida Nove de Julho, ela convida a pequena Isabella, 5, uma vez por mês para ir ao parque. “Gostaria de trazê-la todo fim de semana, ela vive me pedindo”, conta. O espaço para as crianças pode ficar tão movimentado como a “prainha” e chega a ter fila de pequenos esperando a vez.

Pessoa deitada em rede embaixo de árvore, no Parque Augusta
(Joel Silva/Veja SP)

A manutenção, porém, é um desafio da administração. Mesmo com apenas um ano de uso, alguns bebedouros apresentam vazamentos. Também existem relatos de conflitos com vizinhos, por culpa do barulho. “Temos feito adaptações para evitar esses problemas”, afirma Guiaro.

No momento, a comunidade do bairro se mobiliza para tirar do papel outro projeto: um boulevard que ligaria o parque à — também movimentada — Praça Roosevelt, localizada um quarteirão abaixo, pela Rua Gravataí. A proposta faz parte do acordo de implantação da área verde. Ela envolveria a reforma de calçadas e a renovação do paisagismo no caminho. A prefeitura afirma ter 250 000 reais reservados para a ideia. “Estamos em tratativas com condomínios da região para dar início à execução”, afirma a gestão municipal, em nota.

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A “praia” da capital, em pouco tempo, parece ter conquistado o coração de “banhistas” e paulistanos em geral. “O parque criou um novo espaço na cidade, mas também dentro das pessoas”, conclui Guiaro.

Muro que fica em volta do Parque Augusta
(Ligia Skowronski/Veja SP)

ALVO DE DEBATE

O projeto inicial previa a demolição de parte do histórico muro de tijolos na Rua Augusta. Ele impede a vista da área verde. Manter a construção, com os grafites e pichações feitos ao longo das décadas, foi uma reivindicação dos ativistas que lutaram pelo parque

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Publicado em VEJA São Paulo de 30 de novembro de 2022, edição nº 2817

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