Países do Oriente Médio, da Ásia e o Brasil consomem mais produtos de luxo
Estudos mostram que as vendas mundiais devem ter um aumento médio de 4% neste ano — impulsionadas principalmente pelos países emergentes
Com faturamento global de 153 bilhões de euros (352 bilhões de reais), o ano passado foi considerado o pior de todos os tempos para o mercado mundial do luxo — em relação a 2008, houve queda de 8% nos ganhos. Mas as grifes enfrentaram a crise sem perder a pose. Apesar de ter diminuído a marcha na Europa e nos Estados Unidos, o consumo acelerou como uma Ferrari no Oriente Médio e na Ásia, principalmente na China. No continente asiático, as vendas registraram um crescimento de impressionantes 10%, de acordo com relatório divulgado em abril pela empresa de consultoria Bain & Co e pela Altagamma Fondazione, que representa as grifes italianas preferidas dos endinheirados. O mesmo estudo mostra que neste ano as vendas mundo afora devem ter um aumento médio de 4%. E a China? Sozinha, deve crescer 15%.
Segundo Elisabeth Ponsolle des Portes, diretora de desenvolvimento do Comité Colbert, que representa 75 marcas francesas de luxo, a crise afetou o setor tanto do ponto de vista econômico quanto psicológico. “Mesmo podendo pagar, muitos consumidores não se animavam a comprar”, explica. Para os membros do Colbert, Europa, Estados Unidos e Japão continuam mercados importantes, mas tem havido uma demanda por produtos franceses cada vez maior em novos territórios, como China, Rússia, Índia, Oriente Médio e… Brasil, claro.
De acordo com especialistas na atividade do luxo, a aposta é que no Brasil a elevação das vendas chegue a 20%. “Tivemos um ano excelente no país, com um crescimento de 21% no faturamento da butique própria, na Rua Haddock Lobo, e de 12% nas concessionárias entre abril de 2009 e março de 2010, em relação ao mesmo período do ano anterior”, afirma a diretora de marketing da Cartier no Brasil, Véronique Claverie. Ela não fala em cifras, mas o resultado animou a empresa a abrir mais uma loja em São Paulo ainda neste ano ou, no máximo, em 2011. A única certeza é de que será em um shopping. “Queremos um local com maior tráfego de pessoas e volume de vendas de produtos como canetas, chaveiros e acessórios.” São peças de preços, digamos, mais módicos, como a caneta Diabolo com banho de platina, de 840 reais, ou a carteira de couro colorido da coleção Les Must, de 825 reais. Por aqui, a taxa de conversão (pessoas que vão à loja e efetivamente fecham uma compra) fica em torno de 40%. “É um número incrível, porque no mercado de luxo um índice de 15% já pode ser considerado bom”, diz Véronique. Alguns desses clientes entraram na fila de espera para adquirir uma das peças mais cobiçadas da marca: o relógio feminino de ouro rosa da linha Ballon Bleu, de 65 880 reais.
Público para peças como essas — e outras ainda mais caras — não falta. O Brasil tem dezoito pessoas entre os bilionários da lista anual da revista americana ‘Forbes’, divulgada em março. Juntas, somam uma fortuna de 90,3 bilhões de dólares (o equivalente a cinco vezes o PIB da Bolívia). O empresário Eike Batista responde, sozinho, por boa parte desse total — na oitava posição geral na lista de 1 011 nomes, ele acumula cerca de 27 bilhões de dólares. Segundo relatório do banco de investimentos americano Merrill Lynch, o Brasil tinha 131 000 milionários em 2008. A pedido de VEJA SÃO PAULO, a consultoria MB Associados calculou, com base nos dados do IBGE, quantas são as famílias da chamada classe AAA, aquelas que ganham a partir de cinquenta salários mínimos mensais (25 500 reais): 173 981, com renda média de 33 211 reais. Desse total, 50 930 estão no estado de São Paulo e 32 518 na Grande São Paulo. “A crise forte no fim de 2008 e em 2009 afetou todas as classes de renda, mas a mais alta sofreu apenas parcialmente e não deixou de consumir”, explica o economista-chefe da MB, Sérgio Vale.
Em 2008, o setor de luxo movimentou cerca de 5,99 bilhões de dólares no país, de acordo com pesquisa realizada pela MCF Consultoria e Conhecimento e pela GFK Brasil. “Só a cidade de São Paulo representa em torno de 70% desse mercado”, afirma Carlos Ferreirinha, presidente da MCF. “Pela primeira vez vi o Brasil numa posição confortável em meio a uma crise mundial”, diz o professor Silvio Passarelli, diretor do MBA em gestão do luxo da Faap. “Não foi uma marolinha, mas também ficou longe de um tsunami, como nos Estados Unidos e na Alemanha.”
Exclusividade e excelência. Esses dois ingredientes ajudaram algumas marcas de luxo a se manterem mais preservadas na turbulência que afetou o setor no ano passado. Aquelas que massificaram produtos ficaram mais sujeitas aos efeitos da instabilidade econômica. “Essa é a lição da crise”, conta Alejandro Pinedo, diretor-geral da consultoria Interbrand. Em um levantamento do valor das marcas da consultoria, divulgado em 2009, a Hermès foi a única grife de luxo a registrar um aumento (de 1%) em relação ao ano anterior. “Assim como a Ferrari, ela tem a ver com a origem do desejo”, afirma Pinedo. “As duas produzem peças em escala muito limitada.” Caso oposto, explica, ocorreu com a Armani, que buscou alcançar um consumidor um pouco menos abonado, com iniciativas como a Armani Exchange. “Ela teve uma queda de 6%.”
O diretor mostra outros aspectos relevantes na valorização. “A origem da marca é importante. As mais antigas estão explorando isso, como a Bulgari, que celebrou seus 125 anos em 2009, e a relojoaria Vacheron Constantin, com a campanha 1755, ano da fundação da empresa.” Outra tendência é mimar os clientes fiéis. Valem convites para descobrir uma loja escondida em Tóquio ou para ir a bares secretos de Nova York onde acontecem festas para poucos e bons. Canais diferenciados para ver e comprar também ganham espaço. “A Dior tem um aplicativo do iPhone, o Lady Dior, que transmite desfiles pela internet apenas a quem tem acesso especial.” Afinal, para aqueles que estão dispostos a gastar pequenas fortunas em bolsas, relógios, joias e afins, gentileza nunca é demais.
O BRASIL E O LUXO
Dezoito brasileiros são bilionários
90,3 bilhões de dólares é a fortuna desse grupo
173 981 famílias têm renda mensal de mais de cinquenta salários mínimos (25 500 reais) no país – 30% delas vivem no estado de São Paulo
6,45 bilhões de dólares é a estimativa de faturamento anual do setor de luxo no país – 70% na cidade de São Paulo
A VISÃO DO PAULISTANO
Com exclusividade para VEJA SÃO PAULO, o instituto Análise, Pesquisa e Planejamento de Mercado (APPM) entrevistou, em abril, 100 pessoas com renda acima de 10 000 reais mensais. A ideia é conhecer alguns hábitos desses paulistanos e saber como eles enxergam as grifes mais bacanas do mundo.“Num primeiro momento, o luxo foi qualificado como escesso, superficialidade, vaidade, exibição…” conta Antonio Prado, diretor-geral da APPM. “Depois, acabou descrito como apuro na qualidade dos produtos e objetosm prazer, glamour, conforto e status.” A seguir, algumas das conclusões:
68% dos entrevistados estiveram no exterior nos últimos doze meses
26% visitaram os Estados Unidos em sua última viagem
77% afirmaram que viajaram a lazer
58% dizem ser fundamental comer somente em bons restaurantes quando estão fora do país
63% aproveitam para comprar em maior quantidade quando viajam para o exterior
19% acham a Chanel a marca de perfumes mais luxuosa do mundo (a grife também está à frente entre as de moda, com 16% da preferência)
24% apontam a Mercedes-Benz como a fábrica de automóveis que mais admiram
35% consideram a Rolex a marca de relógios top
16% citaram as joalherias H. Stern e Tiffany como as mais luxuosas
66% acreditam que Paris é o lugar mais chique do mundo
50% acham que a gastronomia paulistana é comparável à das melhores cidades
15% sonham conhecer a Grécia
AS DEZ MAIORES MARCAS DO MUNDO…
1ª Coca Cola – 68,7 bilhões de dólares
2ª IBM – 60,2 bilhões de dólares
3ª Microsoft – 56,6 bilhões de dólares
4ª GE – 47,7 bilhões de dólares
5ª Nokia – 34,8 bilhões de dólares
6ª Mcdonald’s – 32,2 bilhões de dólares
7ª Google – 31,9 bilhões de dólares
8ª Toyota – 31,3 bilhões de dólares
9ª Intel – 30,6 bilhões de dólares
10ª Disney – 28,4 bilhões de dólares
…E A POSIÇÃO DAS PRINCIPAIS GRIFES DE LUXO NO RANKING
16ª Louis Vuitton – 21,1 bilhões de dólares
41ª Gucci – 8,1 bilhões de dólares
59ª Chanel – 6,0 bilhões de dólares
68ª Rolex – 4,6 bilhões de dólares
70ª Hermès – 4,5 bilhões de dólares
76ª Tiffany & Co. – 4,0 bilhões de dólares
77ª Cartier – 3,9 bilhões de dólares
87ª Prada – 3,5 bilhões de dólares
89ª Giorgio Armani – 3,3 bilhões de dólares
98ª Burberry – 3,0 bilhões de dólares
Fonte: Consultoria Interbrand