“Não existe mais vida on-line e off-line: é uma só vida”
Christian Gebara, CEO da Vivo defende o investimento de grandes empresas em instituições culturais e reflete sobre o consumo consciente de celular

Com mandato como CEO da Vivo recém-renovado até 2028, Christian Gebara, 52, lidera a transformação digital da maior operadora de telecomunicações do país. No comando da empresa desde 2019, sua atuação tem ampliado o escopo da marca com serviços de saúde digital, projetos educacionais, iniciativas sustentáveis e políticas de diversidade.
Uma de suas bandeiras é a aposta na cultura, com investimentos na cena teatral paulistana e patrocínios de grandes museus, entre eles Masp e Pinacoteca, e festivais, como Lollapalooza e The Town. Crítico do uso excessivo de celular, o executivo também promove campanhas que incentivam o equilíbrio entre o tempo on-line e a vida fora das telas e aposta em programas voltados à inclusão digital, com foco no letramento e na ampliação do acesso à tecnologia.
Qual é o critério de escolha das ações culturais patrocinadas pela Vivo?
A gente colocou um foco maior no teatro, pela tradição do Teatro Vivo, que já existe há 21 anos. Reformamos o espaço, trouxemos um novo curador e cedemos o local para as obras, além de usar as leis de incentivo para levantar as peças. O investimento é nosso, então abrimos espaço aos artistas sem cobrar nada da bilheteria ou da produção. Em seguida vêm os museus, para os quais temos um aporte grande. Aqui em São Paulo estamos no Masp, na Pinacoteca, no MAM, no MIS, no Museu Afro, na Osesp, na Bienal e na SP-Arte. Fora isso, estamos nos grandes festivais, como Lollapalooza e The Town. Também temos o Vivo Música, série de festivais gratuitos feitos em várias cidades. E agora entramos na Orquestra Sinfônica Brasileira, no Rio de Janeiro, e no Grupo Corpo (na capital mineira), que necessitava de ajuda.
Quais são os resultados desse investimento em cultura?
Não vendo mais porque faço cultura. A aposta no setor é, primeiro, responsabilidade de uma empresa do nosso tamanho em um país culturalmente carente. E isso conecta a marca com a classe artística e com as pessoas que vão ao teatro. Quando você vai para algo maior e ajuda um museu, uma exposição ou um festival, leva ainda mais nossa visão. A aposta na diversidade é outro intangível relevante na história da empresa, assim como a aposta no esporte e no cuidado com o meio ambiente.

Você tem planos de investir em instituições menores ou em artistas com menos visibilidade?
Em artistas não investimos diretamente, é difícil a Vivo entrar em um investimento pequeno. Mas mesmo os grandes precisam de ajuda, e o orçamento dessas instituições vive de aportes como os nossos.
Quais são suas metas principais para a empresa nos próximos anos?
O principal é aumentar a digitalização do país. Hoje cobrimos 97% da população com 4G e 62% com 5G. Vamos levar o 5G a muito mais gente. E hoje nossa rede de fibra passa por 30 milhões de domicílios, mas queremos aumentar porque o país tem pelo menos 60 milhões de lares que poderiam ter esse tipo de conexão. Estamos na metade do caminho. Outra meta é o letramento digital: o Brasil se gaba de ser um país que passa nove horas conectado, em média, na internet, mas quase metade da população não sabe enviar um e-mail com anexo porque o letramento digital é muito baixo.
Como surgiu o conceito de “desconexão” dentro da empresa?
Em 2018, começamos a debater internamente o uso excessivo do celular. A discussão envolvia aquela hora em que as pessoas estavam nos restaurantes olhando o smartphone em vez de conversar, ou dirigindo e olhando o aparelho. Em 2023, com as coisas melhores (após a pandemia), transformamos esse debate na campanha Tem Tempo pra Tudo. Não era mais “ou um ou outro”. Não existe mais a vida off-line e a vida on-line, é uma única vida, mas tem tempo para tudo. Isso culminou em um encontro com Denise Fraga, que estava falando sobre o tema, e cocriamos um filme de fim de ano em que ela dizia: “Chega de acelerar os áudios e olhar sua vida todinha em uma timeline”. Agora estamos lançando uma websérie em quatro capítulos com ela, gravada no centro de São Paulo. No começo deste ano, demos um passo além e fomos mais críticos sobre o uso tóxico do celular, que controla sua vida, seu padrão de beleza, que faz você se comparar com outras pessoas o tempo inteiro.
E como é a sua relação com o celular? Você tem quanto tempo de tela?
Tenho muito tempo de tela, talvez eu não seja o melhor exemplo. Uso como fonte de informação e, profissionalmente, o LinkedIn, o Instagram e o WhatsApp. O tempo deveria ser menor, mas acho que a tolerância das pessoas para uma resposta no celular diminuiu drasticamente. Agora até nos voos tem wi-fi, mas descarto a opção nesse caso e tento me controlar nos fins de semana, ir ao cinema, ao teatro e sair para jantar. Quando posso, escapo para o campo e também faço muitas viagens a trabalho. A Madri, onde morei mais de dez anos, vou com frequência. E gosto muito de ler.
O que está lendo agora?
Geralmente gosto de ler mais romances que saem do meu dia a dia, mas agora estou lendo Sincronicidade (de Joseph Jaworsky), sobre um cara que resolveu fazer uma mudança importante de carreira. Recentemente li vários dos novos autores brasileiros, os da Carla Madeira e do Raphael Montes.
Como você aplica sua experiência internacional na Vivo hoje?
Esse olhar para o equilíbrio entre trabalho e bem-estar e lazer é algo que aprendi com a visão europeia. O europeu não abre mão de momentos como a refeição ou um encontro social. Sempre com esse olhar mais cultural, que eu trouxe muito forte para a Vivo. Já tinha, mas reforçamos com a minha chegada.
Como surgiu a ideia de criar uma revista própria da marca?
Temos 116 milhões de acessos conectados às nossas redes, mais ou menos 60 milhões de clientes de todos os tipos, e tínhamos a necessidade de um canal de comunicação com eles, algo que pudesse falar de cultura, tecnologia, bem-estar e viagens dentro do propósito da empresa, digitalizar para aproximar. E entramos nesse mundo em que tudo é conteúdo rápido e de redes sociais, mas acredito que as revistas voltaram a ter protagonismo, sejam elas digitais ou físicas. Assim decidimos lançar a Velvet e já estamos na 17ª edição bimensal. Em breve falaremos sobre a Bienal de São Paulo com o novo curador, temos falado das galerias, de vários artistas que estão em Inhotim, e já foram capa as nossas embaixadoras, como Taís Araujo e Fernanda Lima. A próxima será Camila Pitanga.
Publicado em VEJA São Paulo de 30 de maio de 2025, edição nº 2946