Paulistanas perennials: mulheres com mais de 40 anos longe de estereótipos
Elas formam grupos de conversa sobre desafios, negócios e sexo sem tabus
Quaisquer rótulos associados a estagnação, crise ou ansiedade, antigamente ligados à chegada dos 40 anos, passam longe das mulheres perennials. O termo foi usado em 2016 pela empreendedora de tecnologia californiana Gina Pell para definir pessoas que não se limitam aos padrões da idade. Uma das características dessa turma ageless — sim, a linguagem em inglês faz parte — é a abertura para compartilhar ideias e buscar apoio em quem passa pelas mesmas experiências. Na capital, multiplicam- se os grupos femininos que se reúnem para falar sobre assuntos tão diversos quanto empreendedorismo, formas de fugir da rotina e sexualidade. Em comum, um combinado: tudo rola sem julgamentos.
Há encontros que são pagos, caso do The Women, criado no fim de 2017 pela empresária Thereza Moraes, a Theka. “Reconhecemos nossas carências e, de certa forma, buscamos supri-las com os eventos”, afirma. Cada reunião custa entre 250 e 400 reais e acontece sempre num lugar-surpresa (o cenário já foi um restaurante e até um motel). Na última reunião, o filósofo Carlos Florêncio falou sobre energias renovadas a um grupo atento de 35 integrantes. Para a próxima edição, agendada para 28 de março, os temas são cura, autoconhecimento e espiritualidade.
Ali, o clima fica no meio do caminho entre o bate-papo e a terapia. Ouvem-se frases como “Você não sabe amar”, que causam espanto e reflexão. “Essa troca enriquece muito, ajuda a encontrar nosso rumo”, revela a professora Suselei Beltrame, de 55 anos. Já a diretora de marketing Kátia Tavares, de 49 anos, frequenta o The Women para espairecer. “Assim posso sair do contexto corporativo e conhecer mulheres de diferentes rotinas e experiências”, conta Kátia.
De pegada mais de negócios, a Confraria Mulheres Inspiradoras, na ativa desde 2016, reúne superpoderosas de diversos segmentos do Brasil. “Eu nunca tinha visto nenhuma confraria de mulheres líderes”, lembra a fundadora, Geovana Quadros. A cada 45 dias, atrizes, diretoras e presidentes de pequenas e grandes empresas como Sephora, Magazine Luiza e Onodera se juntam em salões requintados como o do hotel Tivoli Mofarrej. Para participar, é preciso ser indicada e passar por um comitê de gestão, que analisa o perfil das interessadas levando em conta diversos requisitos, do faturamento médio à atuação pessoal em causas que envolvem o universo feminino. “O intuito é juntar empreendedoras que inspiram umas às outras para elas continuarem o bom trabalho”, completa Geovana.
Participante, a atriz Cristiana Oliveira, de 55 anos, divide sua carreira com a administração de seus negócios e acredita que ainda há um longo caminho a ser percorrido. “Nós estamos infinitamente longe de alcançar o que merecemos, ainda estamos engatinhando. Mas, olhando para o passado, a gente sabe quanto já conquistou”, afirma Cristiana. Ana Fontes, de 52 anos, criadora da Rede Mulher Empreendedora, que capacita mulheres em situação de vulnerabilidade social, analisa como fundamental o propósito de motivar umas às outras. “Não é só a questão do empoderamento, da liderança. Precisamos falar para a mulher que há um caminho e que ela pode percorrê-lo”, diz Ana, cheia de confiança.
Nessa toada de renovação, quarentonas poderosas estão deixando suas áreas de formação para empreender em prol da evolução feminina. É o caso de Cintia Almeida, que abandonou a carreira de publicitária aos 41 anos e se especializou em saúde e educação sexual. Criou o Sala Secreta e o No Sofá com Cintia Almeida, para realizar encontros privados e abordar o tema da sexualidade sem tabus. “Trabalhamos com a mulher real, que precisa se redescobrir depois dos 35, 40 anos. Nessa faixa etária elas chegam à conclusão de que os problemas pelos quais passam não são só delas”, conta Cintia.
Também aos 41 anos, a jornalista e modelo Bel Mota criou o Rota 4.0. O projeto inclui palestras e um podcast que lida com a questão da chegada da idade sem drama. “Quero me tornar uma referência do envelhecer saudável”, afirma Bel. Para a neuropsicóloga da Faculdade de Medicina da USP Tatiana Serra, a expansão dos grupos de perennials é um sinal de fortalecimento da mulher na sociedade, capaz de gerar mudanças positivas para todos. “É uma bola de neve no sentido positivo. Os grupos se identificam, se mobilizam e se espalham. Uma mulher impulsiona a outra”, diz.
Publicado em VEJA SÃO PAULO de 13 de fevereiro de 2019, edição nº 2621.