Aluguel de motor homes cresce como alternativa para viajar na pandemia
Em busca de menos burocracia e mais segurança, famílias procuram vans adaptadas para passar um tempo fora de casa
Cair na estrada sem passar por aeroportos, check-ins, táxis ou ficar restrito às dependências dos hotéis é um dos motivos que fizeram disparar as viagens em vans adaptadas com quarto, banheiro e cozinha, conhecidas como motor homes. Mais comum em países da Europa e nos Estados Unidos, a modalidade movimentou as empresas de aluguel desses veículos recreativos no estado de São Paulo. A Fifty Motorhome, na capital, e a Vandão RV Motorhome, em Salto, registraram aumento de quase 70% na procura em 2020. Na My Home sobre Rodas, de Campinas, só há datas disponíveis para reserva dos automóveis em março.
Para dirigir um motor home é necessário ter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) regularizada na categoria B (a mesma para os carros convencionais). Cada empresa coloca suas regras para permitir a locação. Na Fifty, o interessado precisa ter mais de dez anos de experiência de volante. Na Vandão são cinco anos e na My Home Sobre Rodas, o aluguel é feito apenas para casais acima de 30 anos e famílias com crianças. A locadora tem à disposição três furgões com cozinha, ar-condicionado, TV, água quente, sanitário e chuveiro em dois banheiros separados e máquina de lavar roupa. Ainda fornece roupas de cama, toalhas e utensílios de cozinha. Outros dois veículos estão ficando prontos para atender à demanda.
As diárias saem em média 530 reais nos veículos menores, com viagens mínimas de três dias. A Fifty consegue atender de dois a quatro viajantes, com diárias a partir de 815 reais. Para viagens em grupos, a Vandão RV Motorhomes disponibiliza carros com até três camas de casais. A empresa possui frota de dez veículos (cinco costumavam ser alugados na baixa temporada; neste ano, foram todos) e estacionamento sem custo para clientes.
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Os modelos mais procurados são os que acomodam até seis passageiros e o “Pacis”, para dois adultos e duas crianças. A diária varia de 600 a 1 000 reais e não há veículos disponíveis para viagens de mais de catorze dias até março. “A maioria dos nossos clientes teve voo cancelado e queria fazer algo com a família, respeitando o distanciamento”, conta Aline Frediani, diretora de marketing da Vandão.
Para atender o público, as lojas apresentam vídeos e aulas introdutórias presenciais que mostram o funcionamento do carro. “Ficamos disponíveis para atender os viajantes 24 horas por dia”, diz Regis Rigoleto, proprietário da My Home, em que 90% dos clientes estão estreando na modalidade. Os locatários também ajudam nas sugestões de roteiro. Os passeios favoritos entre aqueles que optam por três dias de viagem são Campos do Jordão e Capitólio, em Minas Gerais. Para os viajantes de mais de uma semana, costumam ser escolhidos destinos como as serras gaúcha e catarinense e as praias de Ubatuba e São Sebastião.
Vale lembrar que as paradas pelos países da América do Sul estão suspensas por causa da pandemia. “Aconselho não dirigir à noite e evitar estradas sem pavimento. É proibido entrar na praia com o veículo”, afirma Wagner Marques, proprietário da Fifty. Alguns dos furgões precisam carregar a energia em tomadas depois de um dia de viagem e não se pode esquecer de descartar os dejetos do sanitário. Os campings costumam ter estrutura para atender a essas necessidades.
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Alguns clientes usam o aluguel como test-drive antes de fazer o investimento da compra. A EstrellaMobil, fábrica de Santa Branca, no Vale do Paraíba, monta “casas” há dois anos e teve aumento na demanda. “Em 2019, foram nove veículos feitos e, neste ano, quinze entregues”, diz Julio Lemos, um dos sócios da empresa. Por lá, um projeto montado em um furgão sai em média 170 000 reais, além do valor do automóvel. Há ainda opções com carros menores, em que a montagem custa a partir de 60 000 reais. “As pessoas começaram a procurar viagens diferentes em vez de ficar no resort com a família. A pandemia acelerou essa mudança.”
Priscila Melo, 38, e Sandro Silva, 50
Viajante profissional, o casal paulistano criou a página Cacarecos de Viagem (@cacarecosdeviagem) para divulgar dicas de roteiros e destinos. Na pandemia, eles cancelaram uma viagem à Europa e o motor home foi a saída para que não ficassem parados durante as férias. Priscila alerta sobre o fato de nem todos os campings ter infraestrutura para descarte de água suja, mas isso não foi impeditivo para repetir a experiência. “Meus seguidores nem sabiam que dava para alugar esse serviço no Brasil.”
Celso Amâncio, 69
Aposentado, Amâncio passa mais tempo dentro do motor home do que na própria casa. Considera seu estilo de vida. Com o seu furgão, comprado em 2010, andou Brasil afora com a mulher, Maria de Lourdes. Já viajaram de São Paulo a Jericoacoara, no Ceará, passando noites em estacionamento de hotéis e pousadas pelo caminho. “O carro virava atração onde parava”, lembra. Os roteiros que o casal repete todos os anos são Socorro e Aparecida, no interior, e Ubatuba, no litoral paulista.
Família Quintaneiro
Morando em casas separadas, Thiago Quintaneiro resolveu reaproximar a família (pai, mãe e irmã) em uma viagem de sete dias com o furgão. O medo de não conseguir dirigir o veículo pesado passou nos primeiros quilômetros. “Hoje eles são mais sofisticados do que no passado. Tem até máquina de lavar”, diz. Os quatro integrantes se revezaram no volante até Foz do Iguaçu. “Se contarmos as passagens, a viagem convencional tem o mesmo preço com o motor home.”
Família Harkensee
“Em vez de uma casa em uma única praia, podemos ter uma em qualquer praia”, diz o analista de sistemas Alexandre Harkensee, 55, que decidiu trocar a compra do imóvel por um motor home para a aposentadoria, que sairá em breve. Em novembro, fez um “test-drive” com a mulher, Solange, e a filha, Sophia. Eles visitaram as cidades históricas em Minas Gerais e outras pelo caminho. “Tem aperto, o chuveiro é um pouco baixo, mas foi uma viagem confortável e compensou pela liberdade de roteiro.” O casal já comprou o furgão, modelo Sprinter, e está orçando os projetos do espaço. “Um deles disse que me entrega em outubro.”
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Publicado em VEJA São Paulo de 16 de dezembro de 2020, edição nº 2717