Moema cresceu impulsionada pela inauguração do Parque do Ibirapuera
Conhecido como Fazendinha no passado, bairro sofreu várias transformações ao longo dos anos
A chegada de operários ingleses e alemães para a obra da São Paulo-Santo Amaro, a primeira estrada de ferro entre o centro e a Zona Sul, foi o embrião do povoamento de Moema, a partir de 1882. Era uma área de córregos e terrenos alagados, onde chácaras de gado leiteiro garantiam o sustento das famílias. Em 1906, os trens a vapor deram lugar aos bondes elétricos, que partiam a cada quinze minutos da Praça da Sé até Socorro, incluindo três paradas na região. O local começou a ganhar forma de bairro em 1913, quando o engenheiro Fernando Arens Jr., diretor da Companhia Territorial Paulista, comprou 182 alqueires do Sítio da Traição, entre os limites da Vila Mariana e do Jabaquara. Ele havia vendido um terreno no litoral cedido pelos índios de Mongaguá em troca de presentes, e decidiu homenageá-los ao batizar as ruas do novo loteamento. Tendo como divisória a Avenida Rodrigues Alves, depois chamada de Ibirapuera, um lado ganhou nomes de tribos indígenas e o outro recebeu nomes das espécies de pássaros que cantarolavam ali.
A primeira grande via foi a Avenida Aracy, antes de tornar-se Avenida Indianópolis. “Morávamos, literalmente, onde o bonde fazia a curva. Parecia filme de faroeste, e o local era carinhosamente chamado de Fazendinha”, lembra Sérgio Palharini, no bairro há 71 anos. Batizado na Paróquia Nossa Senhora Aparecida de Moema, o comerciante aposentado construiu sua vida em torno da igreja, local em que trabalha como voluntário até hoje. A pequena capela de 1933 foi fundada pela Ordem dos Padres Salvatorianos, também oriundos da Alemanha, e financiada por Raul Loureiro, então procurador-geral do Fisco de São Paulo. A atual estrutura só ficou completamente pronta alguns anos após a inauguração, em 1937. Além da paróquia, Loureiro ainda construiu o primeiro casarão de Moema, onde morou, apelidado de “Castelinho”, atual sede da Pizzaria La Sorela.
A advogada aposentada Lygia Horta, de 81 anos, vive no bairro desde 1954. Co-fundadora e presidente da Associação dos Moradores e Amigos de Moema, criada em 1987, ela recorda o tempo em que, recém-casada, se mudou da Aclimação para a Fazendinha. “Morávamos na Avenida Cotovia e, quando chovia, tudo virava um lamaçal”, conta Lygia. “As pessoas iam de galocha até a estação dos bondes e depois colocavam sapatos melhores, a caminho do trabalho”, completa. Não eram poucas as dificuldades. Os moradores, por exemplo, tinham de se abastecer nos poços artesianos. Para cruzarem os córregos, eles usavam tábuas de madeira ou andavam por cima de canos. O progresso veio na carona da inauguração do Parque do Ibirapuera, em 1954, no bairro homônimo. Só entre 1958 e 1960 é que chegariam a água encanada e os postes de iluminação pública. A rede de esgoto é de 1965.
Com a extinção dos bondes elétricos, em 1967, a região começou a ganhar asfaltamento. E, em 1976, quando a velha fábrica da Tecelagem Indiana deu lugar ao Shopping Ibirapuera, as construtoras iniciaram a verticalização. A mudança do nome oficial do bairro, de Indianópolis para Moema, ajudou a alavancar o preço do metro quadrado. “Foi uma reivindicação dos moradores: a maioria já o chamava dessa forma. Até a praça ao lado da igreja era conhecida como Largo de Moema”, diz Lygia, que recebeu o então prefeito Jânio Quadros para o almoço de “batismo”, em 1987. Quatro anos depois, na gestão de Luiza Erundina, os limites do distrito foram ampliados, passando a englobar o Parque do Ibirapuera e bairros vizinhos como Jardim Lusitânia e Vila Nova Conceição.
A batalha pela troca do nome foi vencida há mais de duas décadas, mas a advogada ainda luta para diminuir o tráfego de aviões em Congonhas: mesmo localizado no distrito vizinho de Campo Belo, o aeroporto interfere no cotidiano de Moema.
DA II GUERRA PARA O CANECO
Além de manter a tradição do chope alemão em Moema, o restaurante Windhuk (Alameda dos Arapanés, 1400) carrega o nome do navio que viajava de Hamburgo para a África do Sul, em 1939, quando teve a rota desviada para o Porto de Santos por causa do início da II Guerra Mundial. Em 1942, o Brasil entrou no confronto e os marinheiros foram presos no interior do estado. Em 1948, já livre, o cozinheiro Otto Rückert abriu o estabelecimento. O ex-garçom Valfrido Kriegman comprou a casa em 1964 e a dirige ao lado do irmão Francisco. Em 1989, a casa promoveu um encontro entre os ex-tripulantes.