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Loucos por aviões fazem qualquer negócio para fotografar uma aeronave

Os spotters ganharam até um espaço próprio no Aeroporto de Cumbica

Por Nataly Costa
Atualizado em 5 dez 2016, 15h36 - Publicado em 7 out 2013, 13h46
GIanfranco Beting
GIanfranco Beting (Arquivo Pessoal/)
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Nada de escrever para o papai noel, para a professora da escola ou para a namoradinha de infância. Aos 10 anos, Luís Neves dediciu enviar uma carta para o comandante Rolim Amaro, dono da companhia aérea TAM. “Eu escrevi declarando meu amor pela empresa, pelos aviões que eles tinham. Meu sonho era viajar”, conta Neves, que hoje é agente de turismo e tem 34 anos. Garoto pobre de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, a essa altura ele já era conhecido na cidade como o “menino do aeroporto”: ia todos os dias para a beira da pista “namorar” o Fokker 27 da TAM, que pousava ali diariamente. Foi amor correspondido: além de uma caixa repleta de brindes da empresa, o menino recebeu em casa um envelope com uma passagem de ida e volta para São Paulo, com direito a acompanhante e uma carta assinada pelo presidente da companhia. 

A fascinação foi crescendo e hoje Neves faz parte de um grupo que tem o plane spotting – a prática de observar ou fotografar aeronaves – como hobby. Os spotters, como são chamados, fazem qualquer negócio para clicar uma cauda, uma asa, uma aterrissagem no pôr-do-sol ou uma decolagem em céu de brigadeiro. Na capital, são cerca de mil adeptos, divididos em vários grupos que se reúnem nos fins de semana e em eventos anuais. 

Se uma empresa lança uma pintura comemorativa de alguma aeronave, é uma festa. Quando uma companhia estrangeira faz seu primeiro voo para o Brasil, idem: eles lotam as cabeceiras da pista de Cumbica, sobem no “morrinho” (um local específico da favela Jardim Novo Portugal, próxima ao aeroporto) e alugam até quarto de hotéis próximos para fotografar. “A cobertura fica lotada, mas temos regras. Não pode subir com bebida e pelo menos uma pessoa do grupo tem de se hospedar”, conta Marcos Alves, gerente do Hotel Matiz, em Guarulhos. “Eles gostam de quartos específicos, sempre nos andares mais altos e os que têm terminação ímpar, porque ficam do lado direito e na rota das pistas. O 1531 é o mais procurado.” 

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“No Brasil, o hobby surgiu provavelmente em Congonhas nas décadas de 1960, 1970. É desse período que surgiram as primeiras fotos e registros das empresas como Varig, Cruzeiro, Sadia (antiga Transbrasil). O número cresceu muito nos últimos cinco anos com a chegada das redes sociais e com a vasta opção e variedade de câmeras digitais para todos os alcances”, explica o spotter Alexandre Polati. Congonhas ainda é um local importante para a prática, mas Cumbica é considerado o melhor aeroporto do Brasil para esse hobby por ter a maior variedade de aeronaves e companhias aéreas. 

Há pouco mais de um mês, a concessionária GRU Airport, que administra Cumbica, resolveu “presentear” os spotters com um local especialmente destinado ao hobby, no sétimo andar do edifício garagem. O mesmo aeroporto já teve um terraço dedicado à prática, fechado em 1991. Em quase todos os grandes aeroportos do mundo – Miami, Amsterdã, Zurique, Tóquio – esse espaço é garantido. “Nosso hobby precisa ser mais divulgado. Às vezes, somos expulsos dos lugares por simples desconhecimento, acham que a gente representa algum perigo”, diz o fotógrafo Rodrigo Cozzato, de 35 anos. 

Não à toa, eles acumulam histórias de perseguição por parte da polícia e de seguranças de aeroporto. “Já fui abordado pela polícia em uma praça do Jabaquara perto de Congonhas. Eles queriam saber o que a gente estava fazendo ali, achavam que a gente queria derrubar o avião com nossas câmeras”, conta o sushiman Benito Latorre, de 37 anos, que quando não está fazendo sashimi em um restaurante de Pinheiros, está “correndo atrás de avião”, como ele mesmo diz. 

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Guru

Um dos mais antigso spotters em atividade no Brasil é Gianfranco Beting, de 49 anos, hoje diretor de marketing da Azul. Publicitário de formação, ele costumava frequentar Congonhas com uma câmera analógica e um filme de 24 poses, que custava caro para revelar depois. Hoje, tem um arquivo gigantesco com mais de 530 mil registos e já publicou oito livros de fotos de aviação. Só de aviões comerciais, já fotografou 27 mil. Desse arquivo, 200 mi fotos são digitais, o restante é em papel e em slide.

 

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Panda, como Gianfranco é conhecido no meio, é citado como o “guru” dos spotters. Mesmo com a agenda cheia, nunca deixa de fotografar. Como viaja muito a trabalho, aproveita as brechas para fazer cliques das aeronaves mais diferentes, em diversos aeroportos do mundo. “A regra número um do spotter é nunca sair sem câmera. Uma única vez desafiei essa regra. Estava no aerporto de Amsterdã, na sala de embarque, e apareceu um avião africano que eu queria fotografar há anos. Fiquei louco. Corri no free shop, comprei uma máquina e cliquei. Cheguei no Brasil e dei a câmera de presente”, conta.

Ele acha que os aeroportos locais deveriam estar mais preparados para receber o spotter e até criar espaços pagos, com lanchonete e banheiro, para oferecer melhor infraestrutura para esse público. “Seria mais uma fonte de receita. Enquanto os caras estão lá sem conforto nenhum na cabeceira da pista, poderiam estar dentro do aeroporto consumindo nos restaurantes, comprando revista. Sem contar que, se existissem mais espaços assim, voltaria um velho hábito familiar de antigamente, que era ir para o aeroporto observar os aviões.”

Como todo spotter, Panda coleciona boas histórias. “No México, saí para fotografar sem passaporte pois estava com medo de ser roubado. Acabei preso porque não tinha documentos! Também levei um ‘guenta’ na Itália depois de ter ficado sete horas em um lamaçal para pegar um avião israelense. Também já fui fotografar dentro de um cemitério nos Estados Unidos”. 

                                                                                                                                                                                        

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