Tradutora leva ensino gratuito de libras para comunidades de SP
Projeto atende regiões leste e norte da capital com foco em pessoas ouvintes
Contam as boas línguas (e mãos) que um professor surdo francês foi chamado por Dom Pedro II para fazer uma língua nova no país. Ernest Huet, inventor da Libras, a língua brasileira de sinais, criou e ensinou o alfabeto utilizado até hoje. Falada por milhões de brasileiros — de acordo com o IBGE, existem aproximadamente 10 milhões de surdos no território nacional —, o trabalho de possibilitar a comunicação dessas pessoas continua.
Uma das seguidoras de Huet é Gyanny Xavier, de 32 anos, criadora do Libras na Quebrada, projeto que divulga e ensina a cultura e a linguagem surda nas periferias da Zona Leste e Norte da capital paulista. A tradutora profissional teve seu chamado em 2009, quando trabalhava na Galeria do Rock e atendeu seu primeiro cliente surdo. “Ele teve que me dar o alfabeto e pegar um papelzinho para se comunicar. Na época, eu não entendia o mundo surdo, mas vi naquele momento que ele deveria ser atendido como qualquer outra pessoa”, conta.
Depois de aprender Libras e ter experiência como assistente pedagógica, decidiu divulgar Libras para mais mãos nas quebradas paulistanas. “Nosso projeto, além de ensinar Libras, tem uma parte social. Temos oficinas que ensinam mais do que só a língua de sinais, mas sim o mundo surdo, o tato e o acolhimento à comunidade.”
Embora tenha como foco ouvintes, o Libras na Quebrada recebe outras demandas. “Como é um projeto aberto ao público, vem surdos que querem conhecer mais sinais ou familiares que querem aprender como socializar melhor”, ela explica.
Agora, o projeto conta com apoio de um edital da prefeitura e tem uma média de cinquenta alunos em quatro turmas: duas na Casa de Cultura Casarão da Vila Guilherme, na Zona Norte, e outras duas no Centro Cultural da Penha, na Leste. Recentemente, tiveram que ser realocados por problemas estruturais e só uma turma conseguiu transferência para a Biblioteca Álvares de Azevedo, também na Zona Norte. Gyanny sonha ensinar em outras periferias. “Queremos chegar em mais zonas, mas precisamos de convite das casas de cultura.”
Publicado em VEJA São Paulo de 29 de setembro de 2023, edição nº 2860.