Continua após publicidade

Flecha no alvo

Por Walcyr Carrasco
Atualizado em 5 dez 2016, 18h28 - Publicado em 12 nov 2010, 23h26

É incrível o número de pessoas sem rumo na vida. Há três meses cruzei com um amigo na rua, de short e tênis. Mal me cumprimentou e se despediu, com pressa. Era o horário da corrida. Aos 40 anos, decidira manter a forma física. Fazia duas semanas, trotava no Pacaembu no mínimo uma hora por dia. “Em breve estará bem magro” — invejei. Que nada! Dali a algum tempo o vi com a barriga inflada de cerveja.

— E o exercício?

— Parei. Resolvi retomar o piano.

Detalhe: havia deixado a música aos 14, 15 anos. Não entendi a urgência. Da próxima vez, seria outra novidade. Garimpa de emprego em emprego com a mesma falta de estabilidade. Já vendeu antiguidades, foi bancário, ensinou dança de salão, fez pesquisa de mercado. Não é o único caso. Um amigo já entrou em cinco faculdades. Nunca terminou nenhuma. Está no fim do segundo ano de um curso de arte dramática que dura três. Resolveu desistir.

— Quero fazer psicologia.

Continua após a publicidade

— Decidiu ser psicólogo agora?

— Não, é para me ajudar a entender os personagens.

— Se quer representar, por que não termina arte dramática?

— Com a psicologia vou atuar melhor.

Continua após a publicidade

Que argumento usar contra esse tipo de raciocínio? A pessoa que muda sempre de carreira ou mesmo de atividade não cresce profissionalmente, nem cria laços. É levada pelos ventos da vida. Nem sempre encontra trabalho. Um outro conhecido já foi vendedor de loja chique, produtor de eventos e candidato a deputado estadual nas últimas eleições. Perdeu. Sente-se um injustiçado.

— Não fiz uma boa campanha porque não tive apoio.

— Mas que apoio ia ter, se nunca fez política, nunca trabalhou em movimento social? Nada!

Um olhar ofendido me varou a testa. Há uma semana, na academia, um dos recepcionistas me contou: fez curso de enfermagem, tentou ser cantor sertanejo, estudou arte dramática, mas pensava tentar veterinária. Fui direto ao ponto.

Continua após a publicidade

— Você atira para muitos lados de uma só vez. Quem não tem grana de família precisa de foco!

Uma pessoa tem o direito de escolher o próprio caminho, ainda que o preço seja alto. Mas há quem viva pulando de galho em galho, mesmo depois de ter família. Uma conhecida pede algum emprestado todo fim de mês. Alguém sempre acaba dando uma força, por causa das crianças. Ela promete: em breve iniciará um grande negócio. De fato: perdeu uma grana tentando criar chinchilas, quando garantiam que isso faria fortunas. Antes tentou um restaurante vegetariano. Ultimamente receita florais de Bach, mas são poucos os clientes. A terapia anda fora de moda. Seu diploma de assistente social está guardado.

— Por que não tenta um emprego, presta um concurso?

— Ah, eu não sei trabalhar para os outros.

Continua após a publicidade

O pior é que, para si própria, sabe menos ainda! Frequente em uma grande cidade como São Paulo, esse tipo fascina-se pelo brilho de todas as profissões, negócios, atividades. Vive migrando. E o tempo passa. Hoje eu encontro amigos cheios de criatividade na juventude que se tornaram pessoas amargas, vivendo de trabalhos abaixo de sua capacidade.

Ainda acredito que na vida moderna é preciso ter foco. A vida tem milhares de possibilidades, mas é necessário apostar em uma. Muitos jovens se deixam atrair por modismos. Há algum tempo milhares queriam trabalhar com eventos. Antes foram os modelos. Agora, há um tsunami de candidatos a DJ. Principalmente nessa época em que tantos se preparam para iniciar uma faculdade, é essencial optar por uma carreira e ser firme na decisão. Com a mira de um guerreiro que atira a flecha e acerta no alvo.

Publicidade

Essa é uma matéria fechada para assinantes.
Se você já é assinante clique aqui para ter acesso a esse e outros conteúdos de jornalismo de qualidade.

Semana Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

Impressa + Digital no App
Impressa + Digital
Impressa + Digital no App

Informação de qualidade e confiável, a apenas um clique.

Assinando Veja você recebe semanalmente Veja SP* e tem acesso ilimitado ao site e às edições digitais nos aplicativos de Veja, Veja SP, Veja Rio, Veja Saúde, Claudia, Superinteressante, Quatro Rodas, Você SA e Você RH.
*Para assinantes da cidade de São Paulo

a partir de 35,60/mês

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.