Caixa Cultural exibe trabalhos do capixaba Dionísio del Santo
Retrospectiva que reúne 51 obras do artista busca inspiração na dualidade do deus Jano, da mitologia romana
O deus romano Jano, que batiza o mês de janeiro, caracteriza-se na mitologia por possuir duas cabeças: uma delas olha para o passado, a outra, em direção ao futuro. Essa dualidade inspirou a historiadora da arte Maria Alice Milliet a pensar em uma retrospectiva do capixaba Dionísio del Santo (1925-1999), em cartaz a partir de quinta (3) na Caixa Cultural do Conjunto Nacional. Uma das 51 obras recorre justamente à divindade. Trata-se de “Jano Bifronte — Senhor do Tríplice Tempo: Passado, Presente, Futuro”. A analogia veio à mente da curadora ao constatar o aspecto híbrido e transitório da produção do gravador e pintor. Filho de imigrantes italianos muito pobres, ele começou criando, nos anos 50, xilogravuras de viés expressionista, repletas de figuras retiradas da infância na lavoura.
A convivência com o movimento concretista, no Rio de Janeiro, o influenciou, e Dionísio logo passou a explorar ângulos retos e composições matemáticas, marcadas por repetições de formas e variações de cores. Mas carregava algumas diferenças. “Eu o vejo como um ponto fora da curva daquele período”, diz Maria Alice. “Não chegou a promover uma ruptura brutal ou uma adesão completa à abstração.” De fato, em meio às linhas aplicadas com rigor, não é difícil notar alguma discreta figuração. Particularidades assim, e também o interesse por astrologia, colaboraram para sua pequena fama em comparação aos contemporâneos, embora em vida fosse admirado por críticos do gabarito de Mário Pedrosa e Walter Zanini. “Os colecionadores demoraram a aceitar a tendência ao místico em um ambiente artístico considerado tão racional”, complementa a historiadora. Curiosidade: na década de 80, o artista deu aulas na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio, para Beatriz Milhazes, entre outros nomes.