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Borá: a cidade menos populosa do Brasil

Conheça a vida nesta cidade

Por Maria Paola de Salvo
Atualizado em 5 dez 2016, 19h33 - Publicado em 18 set 2009, 20h26

Enquanto os paulistanos convivem com as dores e delícias proporcionadas pelo gigantismo da metrópole, existe um lugar no estado de São Paulo em que as pessoas encontram-se em situação exatamente oposta. Trata-se de Borá, na região centro-oeste paulista, distante 520 quilômetros da capital, que aparece pelo décimo ano seguido no posto de o município menos populoso do Brasil. São 837 habitantes, segundo dados divulgados pelo IBGE no último dia 14 ? apenas 42 a mais que no último censo, em 2000. “Muitos dos meus antecessores tentaram mudar isso”, conta o prefeito Luiz Carlos Rodrigues (PT), o Luiz do Açougue, eleito em 2008 com 478 votos. A exemplo das gestões anteriores, a dele tem por objetivo sair da lanterninha demográfica. Sua principal promessa é a conclusão de 101 casas, cuja construção começou em 2004 e parou, no ano passado, devido a denúncias de irregularidades no projeto de engenharia. “Se eu conseguir, poderemos atrair 400 pessoas”, estima, empolgado. A escassez de moradia foi o principal obstáculo para o último grande salto que a cidade quase deu, em 2005. Naquele ano, uma usina de cana-de-açúcar e álcool instalou-se ali. Empregou 30% da população entre seus 1?600 funcionários. O restante viria de regiões próximas e parte se instalaria em Borá, mas não havia teto para todos.

É mais fácil achar um endereço pelo apelido do dono da casa que pela rua. As 22 vias, todas asfaltadas, têm nomes curiosos como Calada da Noite e Berço de Ouro. Trânsito, semáforos e faixas de pedestre não fazem parte do vocabulário. A frota de 101 carros se mistura às carroças. O marasmo incomoda até aposentados que se mudaram para o município em busca de sossego. “Os dias demoram a passar”, diz a dona de casa Maria Aparecida Marconato, que se instalou por lá em 2003 com o marido, João Augusto. Eles colocaram a casa à venda e planejam voltar para São Paulo. Inaugurada em 1994, a delegacia registra, quando muito, vinte ocorrências por ano. Quase sempre de brigas entre bêbados e pequenos furtos de enxadas e tábuas. Entende-se, daí, o choque dos moradores com o roubo da única agência bancária, em janeiro deste ano. O último homicídio, em 2002, ainda rende assunto. “Nossa cela nunca foi usada”, afirma o escrivão de polícia Jair Pereira de Souza, que, por falta de trabalho, passa os dias tomando café e vendo televisão. Delegado, padre e juiz vêm de cidades próximas. Paraguaçu Paulista, a 18 quilômetros, é o destino dos boraenses que precisam de consulta médica.

Com 119 quilômetros quadrados, Borá é uma ilha urbana cercada de sítios. Num deles mora um dos fundadores do município, o português Manoel Caldas. Cansado de consertar estradas de terra com as próprias ferramentas e de fazer as vezes de delegado, ele reuniu um grupo para reivindicar que o distrito fosse elevado à categoria de cidade em fevereiro de 1964. A fama de pequenina ajuda na hora de pedir verba ao governador – e olha que o orçamento anual é de 5,8 milhões de reais. A prefeitura é a segunda maior empregadora local, atrás somente da usina. Conta com noventa funcionários. É como se, na capital, Gilberto Kassab tivesse 1,1 milhão de servidores (são aproximadamente 150 000). Os nove vereadores (1% da população) se reúnem a cada quinze dias em plenário e recebem salário de 1 200 reais mensais.

A falta de lazer é a reclamação número 1 dos jovens, que se encontram nos bancos da Praça Santo Antônio, perto da igreja. “A paquera rola até meia-noite, depois tem show de viola em frente à lanchonete Esquinão”, conta Rudinei Pereira, vencedor do concurso Garoto Inverno, no ano passado. Nada mais natural que uma cidade assim tenha costumes antigos. Quando morre alguém, centenas de habitantes vão ao enterro, além de quase todos se conhecerem, lamentam o fato de ser um a menos nas estatísticas. As notícias correm rápido, até porque a população tem internet de banda larga gratuita, oferecida pela prefeitura. Outro mimo: uma horta comunitária, que fornece verduras sem custo nenhum às 200 casas. Dos quinze estabelecimentos comerciais, três são bares. O único restaurante vende dez refeições por dia, quando o movimento é bom. O cartório só abre quando alguém precisa. As duas vagas de estacionamento da rodoviária, inaugurada em 2008, nunca foram usadas. Não existem linhas diárias de ônibus. “A tranquilidade é, ao mesmo tempo, a melhor e a pior característica daqui”, resume a funcionária da creche local, Adriana da Silva Cruz, que sonha sair dali para andar de avião e conhecer o ator Reynaldo Gianecchini.

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