Sou apaixonado pelas pequenas tradições. Gosto de levar flores quando visito alguém pela primeira vez. Adoro bolo de casamento. Por maior que seja o regime, eu me atiro nos brigadeiros e línguas de sogra das festinhas infantis. Natal tem de ter árvore com bolas e luzinhas coloridas. E, como em todos os anos, acabo de montar a minha.
Nada de pinheiros vivos. A gente se diverte e o coitadinho sofre em um canto da sala sem água nem luz adequada. De pois das festas, frequentemente acaba no lixo. Que falta de espírito natalino, o nosso! Há anos comprei uma árvore artificial, cujos galhos posso dobrar. Em épocas turbulentas, acabam espetados para todos os lados, como se tivessem passado por um tufão. Agora estão curvos, bem-comportados. E pesadíssimos! Ano após ano acumulo enfeites. Muitas bolas coloridas, ramos de azevinho, sinos, luzes piscantes e um anjo de asas brancas que a mãe de um amigo me deu. Está velhinha, mas lembro dela todo Natal, quando prendo o anjo na ponta.
Foi uma delícia abrir as caixas dos enfeites. Havia esquecido de muitos, desde que os guardei, há quase um ano! São lindos! Lembro de quando era menino e abria as caixas com minha mãe. Desembrulhávamos as bolas guardadas em papel de seda. Meu pai as dependurava em nossa velha árvore feita de penas tingidas de verde. Depois vinham luzinhas vermelhas. Caixas embrulhadas em papéis diferentes, com laços, embaixo, para simular presentes. Ainda acreditava em Papai Noel. Durante vários anos, na minha infância, insistia para que ele me trouxesse um cavalo de corrida. De brinquedo não! De verdade! Quando via a árvore montada, minha esperança se acendia. Finalmente ia ganhar meu cavalo!
As famílias vizinhas, na cidade do interior onde eu morava, montavam sua árvore. A da Heloísa, minha amiga, ostentava flocos de algodão dependurados, para simular neve. Sua mãe construía um presépio lindo, com terra e grama reais, um espelho simulando um lago e muitas imagens em miniatura. Não só de Cristo bebê, mas de ovelhas, burros, dos reis magos, muitos habitantes da região, caravanas do deserto. E no alto uma grande estrela de papelão prateada! Durante semanas, nós, as crianças, admirávamos as árvores, os presépios, os enfeites natalinos da redondeza e das vitrines das grandes lojas.
Mais tarde, tive uma fase rebelde. Rejeitei muito do que aprendi. Morei no exterior. Mas nunca quis abdicar da árvore de Natal. Certa vez, montei uma com pedaços de massa de espaguete cruzados. Em outra, arrumei as luzinhas em um vaso de folhagem. Já tive Natais tristes. Em um deles, morava sozinho, longe da cidade, numa chácara. Marquei com meu irmão: iria passar o Natal em Campinas, com minha mãe e os sobrinhos. Meu carro quebrou na noite de 24. Impossível arrumar quem consertasse. Preparei um jantar e comemorei solitário. Mas minha árvore de Natal estava lá. E eu me senti melhor!
Já ouvi dizer que sinos dourados e ramos de azevinho artificiais são o cúmulo da cafonice. Luzes piscando e bolas coloridas, nem pensar! Ao amadurecer, descobri que não me importo com rótulos. Podem me chamar de cafona. Também já disseram que esse meu entusiasmo é criancice. Considerei um elogio. Diante de minha árvore recém montada, sinto a mesma emoção de quando era menino. Quem admira sua árvore compartilha uma parcela de inocência capaz de atrair algo de bom. Nunca ganhei meu cavalo de corrida. Mas diante de minha árvore tenho a sensação de que algum sonho tão fascinante quanto esse ainda vai se realizar.
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