Continua após publicidade

Alguns começos

Por Ivan Angelo
Atualizado em 5 dez 2016, 17h27 - Publicado em 20 jan 2012, 23h50

Tem uns começos que são muito bons, e o do ano é um deles. Não pelas festas que tivemos. O champanhe, os abraços, a comida, os fogos e o beijo fazem parte, mas não são a coisa principal, que vem chegando desde o fim do ano, insinuando uma nova atitude, ali um projeto, aqui uma retomada, mais para a frente uma ousadia, e mostra o oportuno espaço para uma abertura, a hora certa para uma concessão, o modo de reaproximação para selar a paz. É essa coisa que nos põe em estado de fraternidade, digamos assim. Poderíamos chamá-la esperança, não estivesse essa palavra tão gasta. É o desejo de nos refazermos em mais gostáveis criaturas. De fazermos a coisa certa para chegar aonde queríamos. De realizarmos afinal coisas que fomos deixando para trás. O começo de ano torna a gente melhor pessoa, pelo menos em intenção.

+ Melhores peças em cartaz na cidade

+ Crônica de Matthew Shirts: “Férias em família”

Outra delícia que se acrescenta ao começo dos anos é termos a cidade só para nós, os que nos deixamos ficar; um mês inteiro sem aquele milhão de automóveis que saíram por aí e o milhão de pessoas que nos deixaram mais confortáveis nos ônibus, trens e metrô.

Há outros bons começos, alguns de coisas tão simples que o pequeno e encantador prazer que nos proporcionam se torna quase inexplicável. Mas é real, porque várias pessoas e gerações o experimentam.

Continua após a publicidade

Para a menina caprichosa, o começo de um caderno da escola no primeiro dia de aula é o máximo. Aquela folha lisinha, que ninguém tocou, o cheiro de papel novo, tudo convida o lápis ao capricho, ao talhe bonito; a atenção se redobra para não haver erro que torne aquela página menos bela. A segunda página já não é a mesma coisa, marcada que foi pela pressão do lápis na página anterior.

A agenda nova do ano também dá esse gosto, quando mão zelosa anota os endereços, os aniversários, os compromissos. Mais para o meio do ano haverá na mesma agenda rabiscos e clipes, mas não agora, não agora.

+ Aluguel de filmes à moda antiga

+ Boa comida regada à sua bebida preferida

Continua após a publicidade

E começo de namoro, tem coisa melhor? Quer sejamos adolescentes, jovens, adultos, coroas, velhos — tem coisa melhor? Mais plena de expectativas? Ao iniciarmos um namoro, acordamos em nós aquele desejo de ser mais gostáveis e, para tanto, gentis, doces, bonitos, cheirosos, bem-arrumados, bem-humorados, positivos. Vai durar? Não dá para saber, e não é isso que nos alvoroça no momento. Será o amor? Não, não houve tempo para isso: é inquietação, carregada de deliciosas antecipações e de inseguranças.

Há, é verdade, começos complicados de coisas que podem ser boas. Começo de festa, por exemplo. Nunca se sabe se ela vai bombar, é sempre uma angústia para quem convida. “Detesto ser a primeira a chegar às festas que dou”, diz uma personagem de romance, já não sei se é a Nicole Diver, de “Suave É a Noite”, ou a Holly Golightly, de “Bonequinha de Luxo”. Enfim, pode ser de uma delas. Outro começo difícil é o da vida: sair de uma situação deliciosa e irresponsável na barriga da mãe para uma complicação de luz, fome, ruído, calor, frio, cólica, ardência… Depois melhora, quando dá certo.

São mais numerosos os começos que nos dão prazer: o das férias, quando você chega ao hotel, toma aquele banho e relaxa no lençol fresco e perfumado; a primeira mordida na fruta suculenta e fresca ou no hamburgão quentinho escorrendo venenos calóricos; a estreia da roupa nova cheirando a loja, carícia de fibras macias que ainda não se crisparam no stress da máquina de lavar; o primeiro beijo e tudo o que ele promete; o primeiro gole do chope que nos relaxa da estafa de um dia quente; o livro novo que emite leves estalinhos ao se abrir para os olhos; dirigir o carro novo, com seus cheiros de fábrica, esmalte, resinas, filtros; mudar para o apartamento novo cheirando a tinta, verniz e limpeza; a lenta entrada nas portas do sono…

E-mail: ivan@abril.com.br

Publicidade

Essa é uma matéria fechada para assinantes.
Se você já é assinante clique aqui para ter acesso a esse e outros conteúdos de jornalismo de qualidade.

Domine o fato. Confie na fonte.
10 grandes marcas em uma única assinatura digital
Impressa + Digital no App
Impressa + Digital
Impressa + Digital no App

Informação de qualidade e confiável, a apenas um clique.

Assinando Veja você recebe semanalmente Veja SP* e tem acesso ilimitado ao site e às edições digitais nos aplicativos de Veja, Veja SP, Veja Rio, Veja Saúde, Claudia, Superinteressante, Quatro Rodas, Você SA e Você RH.
*Para assinantes da cidade de São Paulo

a partir de 49,90/mês

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.