Muito se fala em perua. Pouco em pavão. Já encontrei feministas rebeladas contra o termo destinado às mulheres que trocaram a luta pelos direitos por um lugar no cabeleireiro, e a discussão sobre o uso de sutiãs por tratamentos de celulite. Entretanto, ninguém faz piada, e muito menos novela, com o pavão, a contrapartida masculina da perua. Não que eu seja um. Os anos escorrem sobre minha barriga. Além do mais, o pavão tem dinheiro. Pelo menos o suficiente para as academias de musculação. Ou o aluguel da quadra de tênis. Ou para se trancar num spa, se nada der certo. Se tem banhas, estão escondida sob um bem cortado paletó. (Uma vantagem sobre os pavões cariocas, que competem com os surfistas.) Fala manso, educado. Não usa aliança, de preferência. Também não é um mauricinho, preocupado apenas em parecer bem. O pavão abre a cauda, exagera, enquanto as peruas e outras aves canoras se agitam em torno. O pavão já nasce um, e tem talento para superar vicissitudes. O Washington Olivetto é assim. Trocou o perfil atlético pelas gravatas, e funciona. O Rodolfo Gamberini é outro: vence pelas olheiras.
Outro dia, tentei bancar o pavão. Fui ao Esplanada Grill na hora do almoço. É, como se sabe, o viveiro maior dos pavões paulistanos. Mas até o manobrista percebeu que eu não era um: pela caneta Bic pendurada na camisa. E pelo meu rodopiar na porta giratória.
Decidir tomar algumas lições. Afinal, se não estou mais na idade de me transformar num ás do jet-ski, pelo menos posso me pavonear um pouco. Ou não? Procurei um amigo, desses que nem precisam abrir a cauda para as peruas enlouquecerem.
— Encolha a barriga — aconselhou
— Não quer ser sexy?
— Sexy sim, mas não infeliz.
Recebi alguns ensinamentos. Pavões fingem não se interessar por peruas, mas por gatinhas. As peruas, açoitadas por paixões selvagens, se atiram sobre eles. Ou, pelo menos, enviam torpedos com o telefone. Eles bebem uísque, elas vodca. Gostam de cozinhar. Na verdade, fazem da culinária um chamariz.
— Mas e eu, que não sei fritar um ovo?
— Você é um ser anacrônico, um pterodáctilo.
Eu, um pterodáctilo? Pavão fala de cristais e da alta na bolsa. Conhece mais etiquetas de moda do que as próprias peruas. Gosta de fazer as unhas dos pés. Tem cabelos curtos, às vezes adornado por um tom grisalho. Foi a Nova York o ano passado. Faz compras em Miami. Em geral, são especializados em massas. Dedicam boa parte do tempo livre aos segredos do funghi seco e às artimanhas da Nova Era.
— Mas o que eu faço com esta pirâmide?
— Ponha no seu escritório. Sempre é bom para começar uma conversa. E dá boas vibrações.
Continuei com a lição, lúgubre. A lista dos complementos indispensáveis incluía um micro, em local visível, um mocassim, desses com franja de couro no topo, certo conhecimento de vinhos e…
— Pare com essa mania de coçar a orelha.
Retirei o dedo, humildemente. Meu amigo continuou com os conselhos:
— Quando andar, ponha o peito para a frente. A cabeça alta. Perca a mania de dobrar a barra da calça e nunca mais conte a ninguém que usa pivô.
Suspirei. Chegara a hora de exercitar meu charme inabalável, numa happy hour. Tentei andar com o peito estufado, quase entortei a coluna meu amigo não notou, estava entrando no viveiro, quer dizer, no bar, com a cauda exposta. Ouviram-se os inevitáveis gorgolejos: “Como vai? Há quanto tempo”.
Generosamente, ele virou-se em minha direção, disposto a me incluir no seleto círculo de peruas, muitas delas flamejantes executivas com pulseiras de ouro e sardas no colo dos seios. Não me achou. Fiquei num canto, crocitando, com uma bebida dietética. Pode haver algo menos sexy do que refrigerante dietético?
Voltei para casa, pensativo. Nunca chegarei a pavão. No máximo a um franguinho carijó, ou a um pombo gordo, o que é pior. Mas não trem importância. Um dia desses termina o reinado de peruas e pavões e chega a vez de gente como nós, simples mortais.