As mudanças que ocorreram nos cinemas (e em mim) nos últimos 21 anos
Integrante mais antigo da redação de VEJA São Paulo, o crítico Miguel Barbieri Jr. reflete sobre sua trajetória profissional nas últimas duas décadas
Em janeiro do ano que vem, completo 21 anos ininterruptos em VEJA SÃO PAULO, sendo, assim, a pessoa mais antiga da redação. Mas antiga não significa ultrapassada. Aprendi, ao longo de duas décadas, que renovar é preciso. Quando entrei na Vejinha, a internet estava em polvorosa. Enquanto colegas migravam para o digital, eu dava meus primeiros passos num prestigioso veículo impresso semanal. Foram difíceis os primeiros anos, sobretudo para conquistar a confiança dos editores. Mas quanto mais eu assistia aos filmes e escrevia, mais autonomia conquistava.
Em maio de 2003, fiz uma reportagem de capa. Com um júri de especialistas, entre eles os apresentadores Cunha Júnior e Marina Person e o saudoso crítico Rubens Ewald Filho (um mestre!), escolhemos os melhores cinemas da cidade. As novidades no circuito eram poucas comparadas às de hoje, e o Arteplex (hoje Espaço Itaú) do Shopping Frei Caneca acabou sendo o grande premiado. Votaria, novamente, no Frei Caneca, mas como programação, certamente ainda a mais plural da cidade. Nos outros quesitos, porém, assistimos a uma revolução de lá para cá. O Reserva Cultural, especializado em filmes de arte e autorais, foi aberto em 2005 e a Cinemark do Shopping Cidade Jardim inaugurou as primeiras salas vip paulistanas, em 2008. Um ano depois, Avatar impulsionou o aumento das salas 3D e a primeira sala Imax, no Bourbon Shopping, ganhou espaço. Vimos também a chegada das redes Cinépolis e Cinesystem.
Para conquistar um público que estava plugado nos canais por assinatura, foi necessária uma renovação. O mesmo ocorria comigo. Confesso que relutei em ter um blog, mas, a partir do momento em que percebi uma resposta imediata do leitor (algo que nunca havia ocorrido na revista), a adrenalina bateu e, com ela, veio o vício de acompanhar a crescente audiência.
As ferramentas digitais me incentivaram a gostar ainda mais do que faço. Em 2015, eu e o Tiago Faria, hoje editor do site de VEJA, fizemos a primeira transmissão pelo Periscope. Falava ao vivo sobre as estreias nos cinemas e respondia às perguntas dos usuários do app. Eu tinha um bordão para a live: “Aqui não é televisão, é interação”. Ao longo desses cinco anos, me mantive firme, sempre às quintas, às 19h, só que agora no Instagram.
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Para concretizar um sonho de adolescente (de ter um cinema só para mim!), criei a Sessão Vejinha, em 2014. São sessões de pré-estreias que faço em parceria com a Cinemark. É quando consigo ter um contato presencial com meus seguidores e com aqueles que curtem o meu trabalho. E é muito gratificante!
Embora o cinema seja uma paixão e uma experiência coletiva de que não abro mão, é impossível negar que ver filmes no streaming já não é uma tendência — é a realidade, confirmada com estrondoso sucesso na pandemia. A seção Para Ver em Casa, no roteiro de filmes, ganhou mais espaço. Na quarentena, com as salas fechadas desde março, meu trabalho se voltou a indicar filmes e séries em plataformas como Netflix e Amazon Prime Video. Opções não faltam, o que falta é curadoria, algo que, modéstia à parte, eu faço bem. Talvez seja o feeling adquirido como dono de videolocadora por doze anos.
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Entre 1986 e 1998, vi muitos filmes no finado VHS e atendi centenas de clientes. Alguns já chegavam pedindo “qualquer lançamento”, outros escolhiam pela capinha, mas a maioria confiava na minha sugestão. E eu sabia exatamente o que indicar. Escuto gente reclamando que a Netflix “só tem velharia” ou que a pessoa demora tanto para escolher algo que vai dormir sem ver nada.
Ao contrário do consultor presencial de videolocadora, a Netflix trabalha com algoritmo. Se você vê uma série sul-coreana e avalia como positiva, vão surgir várias produções da Coreia do Sul na sua página. E aí é que entra o meu “garimpo” de, semanalmente, vasculhar os acervos dos canais de streaming para bolar listas descoladas, com filmes que têm “problemáticas relações familiares”, “adolescentes desajustados” ou “terror em vários países”.
Nos últimos seis meses, já dei cerca de 500 dicas na revista, que acabaram se desdobrando em mais conteúdo no blog e na minha newsletter. Em 28 anos no exercício da profissão, trabalhei fixo em apenas três veículos. Passei mais tempo na Vejinha do que nos três apartamentos que morei nesse período. Vi amigos pedirem demissão, outros serem demitidos. E eu fiquei. Deve existir algum motivo para isso.
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Publicado em VEJA São Paulo de 30 de setembro de 2020, edição nº 2706.