“O Mistério de Irma Vap” volta ao palco desconstruída e revigorada
Dirigidos por Jorge Farjalla, Luís Miranda e Mateus Solano se expõem ao ridículo e, como cabe aos grandes atores, jamais perdem a credibilidade
Entre 1986 e 1997, Marco Nanini e Ney Latorraca cravaram a comédia de Charles Ludlam no inconsciente coletivo nacional. Mesmo aqueles que não assistiram à montagem dirigida por Marília Pêra podem guardar referências em relação, por exemplo, às frenéticas trocas de roupa protagonizadas pela dupla.
Encenada por Jorge Farjalla, O Mistério de Irma Vap, como convém a um clássico, volta desconstruída para surpreender os saudosistas e ser descoberta por uma nova plateia. Os atores Luís Miranda e Mateus Solano assumem os papéis defendidos respectivamente por Latorraca e Nanini, e a primeira renovação se dá na gincana dos figurinos, feita, desta vez, aos olhos dos espectadores.
A trama segue a mesma, muito mais apoiada nos efeitos e na versatilidade dos intérpretes que na dramaturgia nonsense. Lady Enid (vivida por Solano), recém-casada com o esquisito Lord Edgar (papel de Miranda), se muda para uma mansão. Logo, a governanta (também representada por Miranda) se revela uma inimiga, e a nova anfitriã desconfia que o lugar seja assombrado pelo fantasma da primeira mulher do marido.
Diretor ambicioso, Farjalla brilhou nas releituras de Doroteia e Senhora dos Afogados, ambas de Nelson Rodrigues, e recriou sem amarras o besteirol, chegando, inclusive, a localizá-lo no Brasil. A nova Irma Vap satiriza fatos dos noticiários, como a reforma trabalhista e as mudanças da Lei Rouanet, evoca elementos do folclore e incorpora sotaques aos personagens, como o do capataz Nicodemo (outro papel de Solano).
A personalíssima versão ainda joga em cena mais quatro atores, Fagundes Emanuel, Greco Trevisan, Kauan Scaldelai e Thomas Marcondes, que se revezam como contrarregras, músicos e figurantes. Os principais responsáveis pelo show, no entanto, são Miranda e Solano, plenamente entrosados e capazes de sustentar o bizarro da história sem parecer previsíveis. Eles se expõem continuamente ao ridículo e, como cabe aos grandes atores, jamais perdem a credibilidade junto ao público. Pelo contrário, deixam muita gente de boca aberta (100min). 12 anos. Estreou em 12/4/2019.
+ Teatro Porto Seguro. Alameda Barão de Piracicaba, 740, Campos Elíseos. Sexta, 21h; sábado, 18h e 21h; domingo, 16h e 18h. R$ 80,00 a R$ 150,00. Até 16 de junho.