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A trajetória de Thales Cesar, jovem da periferia que estrela ‘O Rei Leão’

Ator nascido e criado no Jardim Ângela vive Simba no musical da Broadway, que estreia na quinta (20), no Teatro Renault

Por Júlia Rodrigues
Atualizado em 14 jul 2023, 18h44 - Publicado em 14 jul 2023, 06h00

Nas ruas do Jardim Kagohara, um pedacinho do Jardim Ângela, na Zona Sul, a notícia já se espalhou. Assim que Thales Cesar, 23, desce do carro, moradores entusiasmados se aproximam para cumprimentar o jovem ator nascido e criado no bairro. De uma janela, alguém grita: “Fala, Simba!”. O sucesso, ali na vizinhança, antecede o próprio espetáculo. O novo apelido é uma referência ao protagonista do musical O Rei Leão, superprodução da Disney que estreia na quinta-feira (20), no Teatro Renault.

A montagem é tão grande e ambiciosa que tem previsão de ficar um ano em cartaz em São Paulo — a primeira versão apresentada na cidade, em 2013, permaneceu por quase dois anos nos palcos e atraiu 850 000 espectadores. Criado na Broadway, em Nova York, o musical é baseado no famoso desenho animado de 1994. Desde a estreia, em 1997, nunca deixou de estar em cartaz em alguma parte do mundo — com exceção, claro, do período de pandemia.

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No bairro onde cresceu, na Zona Sul: grife da Broadway (Alexandre Battibugli/Veja SP)

A versão atual é parecida com a encenada aqui uma década atrás, mas tem ajustes em músicas e cenários. Ao todo, a superprodução já viajou por 24 países e vendeu 112 milhões de ingressos. O Brasil é a única parada sul-americana do espetáculo, que tem as letras das canções adaptadas ao português por Gilberto Gil. Entre as mais de 200 pessoas da equipe, a atração tem 51 atores, dos quais onze são estrangeiros: um do México, um do Zimbábue e nove da África do Sul — os artistas africanos são uma exigência da Disney, já que algumas músicas usam línguas do continente. Além, é claro, do protagonista, que já virou estrela na Zona Sul.

O caminho de Thales até o papel de Simba, um jovem leão que precisa vencer os medos para assumir o trono do pai nas savanas africanas, começou no palco de uma igreja evangélica. Aos 8 anos, levado pelos pais aos cultos da Assembleia de Deus do Parque Santo Antônio, o garoto passou a aprender bateria na banda da congregação. Mudou para os microfones após uma bronca de um colega. “No meio de uma apresentação, um integrante ficou bravo e gritou para eu parar, porque estava estragando a música. Saí de lá determinado a aprender a cantar”, ele conta.

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Thales ainda bebê (Arquivo Pessoal/Reprodução)

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Aos 12 anos, Thales cumpriu a promessa. Começou a fazer aulas de canto na escola de Ton Carfi, um produtor musical e cantor famoso no meio gospel. Ton, nome artístico de Wellington Carfi, também tinha iniciado a carreira em igrejas da região. “Diferentemente da maioria dos alunos, o Thales já cantava bem. Eu só tive de ajudá-lo a aperfeiçoar as técnicas vocais”, ele diz. Na época, além das aulas de canto, Thales dividia a rotina entre o trabalho e a escola. “Acordava às 4 horas da manhã e ia até o Butantã, onde trabalhava em uma fábrica de gaiolas. Voltava para casa, fazia as aulas de canto e à noite ia para a escola”, conta o jovem artista.

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Cantando na igreja quando adolescente: talento (Arquivo Pessoal/Reprodução)

Elaborado pela americana Julie Taymor, primeira mulher a vencer o prêmio Tony na categoria direção de musical (justamente com espetáculo da Disney), O Rei Leão é o segundo musical da carreira de Thales. Estreou no gênero em Rua Azusa, da ONG e grupo de arte cristã Cia Nissi, que venceu o prêmio Bibi Ferreira de musical revelação em 2019. Fazia o papel de William Seymour, um pastor conhecido pela luta antirracista nos Estados Unidos no início do século XX. “Antes disso, eu nunca tinha atuado”, revela o jovem.

O esforço para conciliar a carreira e os estudos deu frutos. Aos 17 anos, Thales já havia comprado o primeiro carro — um Corsa vermelho que tem até hoje. Passou, então, a se dividir entre o trabalho de gerente de uma autoescola e as apresentações em igrejas do bairro. As portas do teatro se abriram após as audições de Rua Azusa. “Quando o Thales apareceu aqui, já tínhamos definido o elenco, mas o convidamos para participar de alguns ensaios. Ficamos impressionados com a voz e a personalidade dele. Decidimos que era a pessoa certa para o papel principal”, conta Caíque Oliveira, diretor da peça e fundador da Cia Nissi.

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O vozeirão e o carisma de Thales também arrebataram os produtores de O Rei Leão. Thiago Rodrigues, maestro do musical da Broadway, descobriu o talento do rapaz ao assistir a uma apresentação do musical religioso. No início deste ano, com as audições quase encerradas, Rodrigues convidou Thales para um teste no papel de Simba. Bastaram duas interpretações para que ganhasse a vaga, algo incomum nesse meio. “Lembro que, para ser escolhido para o personagem em 2013, fiz cerca de oito meses de audições”, conta Tiago Barbosa, que protagonizou o leãozinho na versão anterior da peça. “Ele está ‘arrebentando’ no papel’”, afirma Barbosa — que, voluntarioso, procurou Thales para dar conselhos e sugestões sobre Simba.

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Últimos ensaios do musical: rotina intensa (Alexandre Battibugli/Veja SP)

O musical é digno da suntuosidade da Broadway. Tem cerca de 35 toneladas de figurinos e cenários, o que inclui 200 marionetes com formas de animais que se fundem ao corpo dos atores — a ideia de misturar humanos e bonecos veio da própria Taymor, que ajudou a confeccionar as peças. A rotina de ensaios é intensa. São mais de nove horas diárias de repetição das cenas, com apenas uma folga por semana. Nas vésperas da estreia, o ritmo é ainda mais puxado. Thales conta que teve de caprichar na academia, além de fazer aulas de dança e intensificar as de canto. “Houve momentos em que chorei e pensei em desistir, mas o elenco, a produção e o diretor pegavam na minha mão e me asseguravam de que ia dar tudo certo”, diz.

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Além do Tony de melhor direção, a peça recebeu outras cinco estatuetas do prêmio que é considerado o Oscar do teatro: melhor musical, coreografia, figurino, iluminação e direção de arte. Não à toa, segue levando multidões para assistir à saga de Simba. “Há algo em Rei Leão para todas as pessoas, de todas as idades e raças”, diz o diretor-associado Anthony Lyn.

Na juventude atribulada, Thales sempre achava tempo para o lazer favorito: partidas de futebol com os amigos do bairro. Jogavam em uma praça próxima à rua da foto do início da reportagem. Ali também funcionava um ponto de venda de drogas. “Perdi amigos para o crime. Acontecia de jogarmos juntos e, no dia seguinte, eu descobrir que um deles havia morrido em confrontos”, ele relembra. Com esforço e talento, Thales driblou os adversários da vida real para, feito Simba, conquistar o trono ao qual tinha direito. “Quero seguir no teatro musical. É o que me vejo fazendo nos próximos anos — inclusive no exterior”, conclui.

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Nas ruas do bairro: “perdi muitos amigos para o crime” (Alexandre Battibugli/Veja SP)

O Rei Leão (150min, com intervalo). Livre. Teatro Renault. Avenida Brigadeiro Luís Antônio, 411, Bela Vista. Qua. a sex., 20h. Sáb. e dom., 15h e 20h. R$ 160,00 a R$ 550,00. @t4fmusicais.

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BROADWAY BRASILEIRA

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Funny Girl

A trama biográfica sobre a cantora americana Fanny Brice (Giulia Nadruz) ganha a primeira montagem brasileira nas mãos de Gustavo Barchilon. Eriberto Leão debuta no gênero como Nicky Arnstein, marido da protagonista. Estreia em 18/8 no Teatro Porto.

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Giulia Nadruz e Eriberto Leão (Caio Gallucci/Divulgação)

O Mágico de Oz

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Duda Pimenta e Danielle Winits vivem uma versão atual da fábula, que aborda o racismo. Estreia em 22/7. Livre.

Teatro Procópio Ferreira. Rua Augusta, 2823, Cerqueira César, ☎ 3083- 4475. Qui. e sex., 20h. Sáb. e dom., 15h30 e 19h30. R$ 120,00 a R$ 280,00. Até 24/9. @magicodeozmusical.

O Jovem Frankenstein

A sátira aos filmes de terror baseados no romance de Mary Shelley ganha uma montagem inédita. Estreia no segundo semestre, ainda sem local definido.

No musical inédito e imersivo, baseado no filme, os Três Mosqueteiros tentam substituir o rei Luís XIV pelo irmão gêmeo (Tiago Barbosa reveza-se nos papéis), um mascarado que passou a vida na prisão. Estreia em 4/8, no 033 Rooftop, no Teatro Santander. Outras informações a definir.

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Kiss Me, Kate

A dupla de diretores Möeller & Botelho remonta o clássico após quase oito anos. Miguel Falabella e Alessandra Verney vivem Fred Graham e Lilli Vanessi, casal de atores que interpreta o par Petrúquio e Catarina em uma releitura de Shakespeare. Estreia em 29/7. Livre.

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Miguel Falabella e Alessandra Verney (Priscila Prade/Divulgação)

Teatro VillaLobos. Shopping VillaLobos, ☎ 3024-3705. Sex., 21h. Sáb., 17h e 21h. Dom., 17h. R$ 50,00 a R$ 200,00. Até 27/8. teatrovillalobos.com.br.

Wicked

É a história das bruxas Glinda (Fabi Bang) e Elphaba (Myra Ruiz) antes de Dorothy chegar à terra de Oz. Até 23/7. Livre.

Teatro Santander. Shopping JK Iguatemi, ☎ 4810-6868. Qui. e sex., 19h30. Sáb. e dom., 15h e 19h30. R$ 50,00 a R$ 400,00. teatrosantander.com.br.

Mamma Mia!

A produção chega a São Paulo após uma bem-sucedida temporada no Rio. Donna (Claudia Netto) e a filha Sophie (Maria Brasil) moram em uma ilha grega. Prestes a se casar, a jovem tenta encontrar o pai. É embalada por hits do grupo sueco ABBA. Estreia em 21/7. 12 anos.

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Maria Clara Gueiros, Claudia Netto (no centro) e Gottsha: curta temporada (Caio Gallucci/Divulgação)

Vibra São Paulo. Avenida das Nações Unidas, 17955, Vila Almeida. Sex. (21) e sáb., 16h e 21h. Dom., 16h e 20h. Qua. e qui., 21h. Sex. (28), 20h. R$ 60,00 a R$ 280,00. Até 28/7. @mammamiamusicalbr.

Matilda

O espetáculo terá Fabi Bang, Myra Ruiz e Cleto Baccic, de Wicked, no elenco. Estreia em 18/10. Livre.

Teatro Claro. Shopping Vila Olímpia, ☎ 3448-5061. Qua. a sex., 20h. Sáb. e dom., 15h e 20h. R$ 39,60 a R$ 400,00. Até 23/12. teatroclarosp.com.br.

80: A Década do Vale Tudo – Doc. Musical 

Uma viagem a momentos icônicos dos anos 1980, das músicas e telenovelas aos acontecimentos políticos. A trilha tem sucessos de Cazuza, Michael Jackson e Sandra Sá, que interpreta ela mesma. Estreia em 22/7. Livre.

Teatro Claro. Shopping Vila Olímpia, ☎ 3448-5061. Qui. e sex., 20h. Sáb., 16h e 21h. Dom., 15h e 19h. R$ 39,60 a R$ 300,00. Até 3/9. teatroclarosp.com.br.

Uma Linda Mulher

Jarbas Homem de Mello e Thais Piza vivem no palco o romance inesperado entre um milionário e uma prostituta, em versão do filme estrelado por Julia Roberts e Richard Gere em 1990. Estreia em 1º/9 no Teatro Santander. Livre.

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Jarbas Homem de Mello e Thais Piza (Pedro Dimitrow/Divulgação)

Qui. e sex., 20h. Sáb. e dom., 16h e 20h. R$ 39,60 a R$ 360,00. Até 17/12. teatrosantander.com.br.

Alguma Coisa Podre

Marcos Veras e Leo Bahia vivem irmãos que tentam “destronar” Shakespeare ao montar o primeiro musical da história (130min). 14 anos.

Teatro Porto. Alameda Barão de Piracicaba, 740, Campos Elíseos, ☎ 3366-8700. ♿ Sex., 20h. Sáb., 16h e 20h. Dom., 15h e 19h. R$ 50,00 a R$ 250,00. Até 6/8. 14 anos. @musicalpodre. @teatroporto.

Bob Esponja

Gustavo Barchilon dirige os simpáticos personagens do desenho ao som de canções de David Bowie e Cindy Lauper. Bob Esponja (Mateus Ribeiro) e Patrick Estrela (Davi Sá) precisam salvar a Fenda do Biquíni de um vulcão. Estreia em 27/7. Livre.

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Mateus Ribeiro, Davi Sá e Analu Pimenta (Leo Aversa/Divulgação)

Teatro Sergio Cardoso. Rua Rui Barbosa, 153, Bela Vista, ☎ 3882-8080. ♿ Qui., 20h30. Sex. e sáb., 15h e 20h30. Dom., 16h. R$ 50,00 a R$ 280,00. Até 17/9. @bobesponjamusicalbrasil.teatrosergiocardoso.org.br.

Publicado em VEJA São Paulo de 19 de julho de 2023, edição nº 2850

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