A trajetória de Thales Cesar, jovem da periferia que estrela ‘O Rei Leão’
Ator nascido e criado no Jardim Ângela vive Simba no musical da Broadway, que estreia na quinta (20), no Teatro Renault
Nas ruas do Jardim Kagohara, um pedacinho do Jardim Ângela, na Zona Sul, a notícia já se espalhou. Assim que Thales Cesar, 23, desce do carro, moradores entusiasmados se aproximam para cumprimentar o jovem ator nascido e criado no bairro. De uma janela, alguém grita: “Fala, Simba!”. O sucesso, ali na vizinhança, antecede o próprio espetáculo. O novo apelido é uma referência ao protagonista do musical O Rei Leão, superprodução da Disney que estreia na quinta-feira (20), no Teatro Renault.
A montagem é tão grande e ambiciosa que tem previsão de ficar um ano em cartaz em São Paulo — a primeira versão apresentada na cidade, em 2013, permaneceu por quase dois anos nos palcos e atraiu 850 000 espectadores. Criado na Broadway, em Nova York, o musical é baseado no famoso desenho animado de 1994. Desde a estreia, em 1997, nunca deixou de estar em cartaz em alguma parte do mundo — com exceção, claro, do período de pandemia.
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A versão atual é parecida com a encenada aqui uma década atrás, mas tem ajustes em músicas e cenários. Ao todo, a superprodução já viajou por 24 países e vendeu 112 milhões de ingressos. O Brasil é a única parada sul-americana do espetáculo, que tem as letras das canções adaptadas ao português por Gilberto Gil. Entre as mais de 200 pessoas da equipe, a atração tem 51 atores, dos quais onze são estrangeiros: um do México, um do Zimbábue e nove da África do Sul — os artistas africanos são uma exigência da Disney, já que algumas músicas usam línguas do continente. Além, é claro, do protagonista, que já virou estrela na Zona Sul.
O caminho de Thales até o papel de Simba, um jovem leão que precisa vencer os medos para assumir o trono do pai nas savanas africanas, começou no palco de uma igreja evangélica. Aos 8 anos, levado pelos pais aos cultos da Assembleia de Deus do Parque Santo Antônio, o garoto passou a aprender bateria na banda da congregação. Mudou para os microfones após uma bronca de um colega. “No meio de uma apresentação, um integrante ficou bravo e gritou para eu parar, porque estava estragando a música. Saí de lá determinado a aprender a cantar”, ele conta.
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Aos 12 anos, Thales cumpriu a promessa. Começou a fazer aulas de canto na escola de Ton Carfi, um produtor musical e cantor famoso no meio gospel. Ton, nome artístico de Wellington Carfi, também tinha iniciado a carreira em igrejas da região. “Diferentemente da maioria dos alunos, o Thales já cantava bem. Eu só tive de ajudá-lo a aperfeiçoar as técnicas vocais”, ele diz. Na época, além das aulas de canto, Thales dividia a rotina entre o trabalho e a escola. “Acordava às 4 horas da manhã e ia até o Butantã, onde trabalhava em uma fábrica de gaiolas. Voltava para casa, fazia as aulas de canto e à noite ia para a escola”, conta o jovem artista.
Elaborado pela americana Julie Taymor, primeira mulher a vencer o prêmio Tony na categoria direção de musical (justamente com espetáculo da Disney), O Rei Leão é o segundo musical da carreira de Thales. Estreou no gênero em Rua Azusa, da ONG e grupo de arte cristã Cia Nissi, que venceu o prêmio Bibi Ferreira de musical revelação em 2019. Fazia o papel de William Seymour, um pastor conhecido pela luta antirracista nos Estados Unidos no início do século XX. “Antes disso, eu nunca tinha atuado”, revela o jovem.
O esforço para conciliar a carreira e os estudos deu frutos. Aos 17 anos, Thales já havia comprado o primeiro carro — um Corsa vermelho que tem até hoje. Passou, então, a se dividir entre o trabalho de gerente de uma autoescola e as apresentações em igrejas do bairro. As portas do teatro se abriram após as audições de Rua Azusa. “Quando o Thales apareceu aqui, já tínhamos definido o elenco, mas o convidamos para participar de alguns ensaios. Ficamos impressionados com a voz e a personalidade dele. Decidimos que era a pessoa certa para o papel principal”, conta Caíque Oliveira, diretor da peça e fundador da Cia Nissi.
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O vozeirão e o carisma de Thales também arrebataram os produtores de O Rei Leão. Thiago Rodrigues, maestro do musical da Broadway, descobriu o talento do rapaz ao assistir a uma apresentação do musical religioso. No início deste ano, com as audições quase encerradas, Rodrigues convidou Thales para um teste no papel de Simba. Bastaram duas interpretações para que ganhasse a vaga, algo incomum nesse meio. “Lembro que, para ser escolhido para o personagem em 2013, fiz cerca de oito meses de audições”, conta Tiago Barbosa, que protagonizou o leãozinho na versão anterior da peça. “Ele está ‘arrebentando’ no papel’”, afirma Barbosa — que, voluntarioso, procurou Thales para dar conselhos e sugestões sobre Simba.
O musical é digno da suntuosidade da Broadway. Tem cerca de 35 toneladas de figurinos e cenários, o que inclui 200 marionetes com formas de animais que se fundem ao corpo dos atores — a ideia de misturar humanos e bonecos veio da própria Taymor, que ajudou a confeccionar as peças. A rotina de ensaios é intensa. São mais de nove horas diárias de repetição das cenas, com apenas uma folga por semana. Nas vésperas da estreia, o ritmo é ainda mais puxado. Thales conta que teve de caprichar na academia, além de fazer aulas de dança e intensificar as de canto. “Houve momentos em que chorei e pensei em desistir, mas o elenco, a produção e o diretor pegavam na minha mão e me asseguravam de que ia dar tudo certo”, diz.
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Além do Tony de melhor direção, a peça recebeu outras cinco estatuetas do prêmio que é considerado o Oscar do teatro: melhor musical, coreografia, figurino, iluminação e direção de arte. Não à toa, segue levando multidões para assistir à saga de Simba. “Há algo em Rei Leão para todas as pessoas, de todas as idades e raças”, diz o diretor-associado Anthony Lyn.
Na juventude atribulada, Thales sempre achava tempo para o lazer favorito: partidas de futebol com os amigos do bairro. Jogavam em uma praça próxima à rua da foto do início da reportagem. Ali também funcionava um ponto de venda de drogas. “Perdi amigos para o crime. Acontecia de jogarmos juntos e, no dia seguinte, eu descobrir que um deles havia morrido em confrontos”, ele relembra. Com esforço e talento, Thales driblou os adversários da vida real para, feito Simba, conquistar o trono ao qual tinha direito. “Quero seguir no teatro musical. É o que me vejo fazendo nos próximos anos — inclusive no exterior”, conclui.
O Rei Leão (150min, com intervalo). Livre. Teatro Renault. Avenida Brigadeiro Luís Antônio, 411, Bela Vista. ♿ Qua. a sex., 20h. Sáb. e dom., 15h e 20h. R$ 160,00 a R$ 550,00. @t4fmusicais.
BROADWAY BRASILEIRA
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Funny Girl
A trama biográfica sobre a cantora americana Fanny Brice (Giulia Nadruz) ganha a primeira montagem brasileira nas mãos de Gustavo Barchilon. Eriberto Leão debuta no gênero como Nicky Arnstein, marido da protagonista. Estreia em 18/8 no Teatro Porto.
O Mágico de Oz
Duda Pimenta e Danielle Winits vivem uma versão atual da fábula, que aborda o racismo. Estreia em 22/7. Livre.
Teatro Procópio Ferreira. Rua Augusta, 2823, Cerqueira César, ☎ 3083- 4475. ♿ Qui. e sex., 20h. Sáb. e dom., 15h30 e 19h30. R$ 120,00 a R$ 280,00. Até 24/9. @magicodeozmusical.
O Jovem Frankenstein
A sátira aos filmes de terror baseados no romance de Mary Shelley ganha uma montagem inédita. Estreia no segundo semestre, ainda sem local definido.
No musical inédito e imersivo, baseado no filme, os Três Mosqueteiros tentam substituir o rei Luís XIV pelo irmão gêmeo (Tiago Barbosa reveza-se nos papéis), um mascarado que passou a vida na prisão. Estreia em 4/8, no 033 Rooftop, no Teatro Santander. Outras informações a definir.
Kiss Me, Kate
A dupla de diretores Möeller & Botelho remonta o clássico após quase oito anos. Miguel Falabella e Alessandra Verney vivem Fred Graham e Lilli Vanessi, casal de atores que interpreta o par Petrúquio e Catarina em uma releitura de Shakespeare. Estreia em 29/7. Livre.
Teatro VillaLobos. Shopping VillaLobos, ☎ 3024-3705. ♿ Sex., 21h. Sáb., 17h e 21h. Dom., 17h. R$ 50,00 a R$ 200,00. Até 27/8. teatrovillalobos.com.br.
Wicked
É a história das bruxas Glinda (Fabi Bang) e Elphaba (Myra Ruiz) antes de Dorothy chegar à terra de Oz. Até 23/7. Livre.
Teatro Santander. Shopping JK Iguatemi, ☎ 4810-6868. ♿ Qui. e sex., 19h30. Sáb. e dom., 15h e 19h30. R$ 50,00 a R$ 400,00. teatrosantander.com.br.
Mamma Mia!
A produção chega a São Paulo após uma bem-sucedida temporada no Rio. Donna (Claudia Netto) e a filha Sophie (Maria Brasil) moram em uma ilha grega. Prestes a se casar, a jovem tenta encontrar o pai. É embalada por hits do grupo sueco ABBA. Estreia em 21/7. 12 anos.
Vibra São Paulo. Avenida das Nações Unidas, 17955, Vila Almeida. ♿ Sex. (21) e sáb., 16h e 21h. Dom., 16h e 20h. Qua. e qui., 21h. Sex. (28), 20h. R$ 60,00 a R$ 280,00. Até 28/7. @mammamiamusicalbr.
Matilda
O espetáculo terá Fabi Bang, Myra Ruiz e Cleto Baccic, de Wicked, no elenco. Estreia em 18/10. Livre.
Teatro Claro. Shopping Vila Olímpia, ☎ 3448-5061. ♿ Qua. a sex., 20h. Sáb. e dom., 15h e 20h. R$ 39,60 a R$ 400,00. Até 23/12. teatroclarosp.com.br.
80: A Década do Vale Tudo – Doc. Musical
Uma viagem a momentos icônicos dos anos 1980, das músicas e telenovelas aos acontecimentos políticos. A trilha tem sucessos de Cazuza, Michael Jackson e Sandra Sá, que interpreta ela mesma. Estreia em 22/7. Livre.
Teatro Claro. Shopping Vila Olímpia, ☎ 3448-5061. ♿ Qui. e sex., 20h. Sáb., 16h e 21h. Dom., 15h e 19h. R$ 39,60 a R$ 300,00. Até 3/9. teatroclarosp.com.br.
Uma Linda Mulher
Jarbas Homem de Mello e Thais Piza vivem no palco o romance inesperado entre um milionário e uma prostituta, em versão do filme estrelado por Julia Roberts e Richard Gere em 1990. Estreia em 1º/9 no Teatro Santander. Livre.
Qui. e sex., 20h. Sáb. e dom., 16h e 20h. R$ 39,60 a R$ 360,00. Até 17/12. teatrosantander.com.br.
Marcos Veras e Leo Bahia vivem irmãos que tentam “destronar” Shakespeare ao montar o primeiro musical da história (130min). 14 anos.
Teatro Porto. Alameda Barão de Piracicaba, 740, Campos Elíseos, ☎ 3366-8700. ♿ Sex., 20h. Sáb., 16h e 20h. Dom., 15h e 19h. R$ 50,00 a R$ 250,00. Até 6/8. 14 anos. @musicalpodre. @teatroporto.
Bob Esponja
Gustavo Barchilon dirige os simpáticos personagens do desenho ao som de canções de David Bowie e Cindy Lauper. Bob Esponja (Mateus Ribeiro) e Patrick Estrela (Davi Sá) precisam salvar a Fenda do Biquíni de um vulcão. Estreia em 27/7. Livre.
Teatro Sergio Cardoso. Rua Rui Barbosa, 153, Bela Vista, ☎ 3882-8080. ♿ Qui., 20h30. Sex. e sáb., 15h e 20h30. Dom., 16h. R$ 50,00 a R$ 280,00. Até 17/9. @bobesponjamusicalbrasil.teatrosergiocardoso.org.br.
Publicado em VEJA São Paulo de 19 de julho de 2023, edição nº 2850