“Chacrinha, o Musical” estreia em São Paulo
Sucesso dos palcos cariocas, espetáculo entra em cartaz por aqui, onde o apresentador brilhou nos anos 70
Caetano Veloso e Gilberto Gil levaram os conceitos tropicalistas para a música na segunda metade dos anos 60. O cineasta Glauber Rocha levantou a bandeira nas telas, enquanto o encenador José Celso Martinez Corrêa fez as honras no teatro. A fusão de elementos da cultura brasileira com o universo pop, extrapolando o limite do cafona, porém, chegou ao público da televisão com o apresentador pernambucano José Abelardo Barbosa de Medeiros (1917-1988), o Chacrinha. Quase três décadas depois de sua morte, o Velho Guerreiro “continua balançando a pança”, como cantou Gil em Aquele Abraço. Prova disso é o espetáculo Chacrinha, o Musical, dirigido por Andrucha Waddington, o grande fenômeno dos palcos no verão carioca.
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Na sexta (27), a superprodução orçada em 12 milhões de reais entra em cartaz por aqui no Teatro Alfa, em Santo Amaro, na mesma cidade onde o apresentador comandou as famosas Discoteca e Buzina do Chacrinha nos anos 70 e no início dos 80. Dividida em dois atos, a peça inicia-se com o ator Leo Bahia, de 24 anos, na pele do protagonista durante a infância e a juventude até sua iniciação no rádio e na TV. A dramaturgia construída pelos autores Pedro Bial e Rodrigo Nogueira lembra que vieram do folclore nordestino as referências que inspiraram o futuro apresentador, como as pastorinhas, transformadas em chacretes. A seguir, o ator Stepan Nercessian, de 61 anos, exibe sua elogiada composição para o personagem consagrado em seus programas de auditório. O musical foi aplaudido por 80 000 espectadores em quatro meses no Rio. A expectativa é repetir o sucesso na nova temporada, que deve se estender até 26 de julho. Pelo alto custo de montagem, os ingressos custam entre 50 e 180 reais.
Desde 2001, a capital se transformou em um lucrativo mercado para o gênero. Pelo menos seis musicais de porte médio ou grande ocupam os palcos atualmente, entre eles Mudança de Hábito, embalado no formato da Broadway, e duas versões distintas de Ópera do Malandro, escrita por Chico Buarque. Chacrinha faz parte de um projeto da produtora carioca Aventura Entretenimento com temas nacionais — e representa o maior investimento do grupo em sete anos. A empresa tem no currículo Elis, a Musical, Rock in Rio — o Musical e Se Eu Fosse Você. “Chacrinha abrange diversão, memória afetiva e canções, e é capaz de alcançar qualquer público, afinal o apresentador era admirado por todas as classes sociais”, afirma a produtora Aniela Jordan. “Não vejo por que continuar explorando a cultura internacional no teatro. Dá trabalho e custa mais caro fazer tudo por aqui, claro, pois temos de desenvolver e pagar cada etapa do processo, mas já contamos com um mercado maduro o suficiente para isso”, completa Aniela.
Estreante no gênero, Stepan Nercessian percebe uma espécie de ressurreição em uma carreira de mais de quatro décadas. “Nunca imaginei que, depois dos 60 anos, ainda pudesse viver um momento de glória e representar o grande papel da minha vida”, revela. Ele conviveu com o apresentador nos corredores da Rede Globo nos anos 80 e foi jurado do Cassino do Chacrinha, na emissora carioca. Seu nome foi sugestão da atriz Fernanda Montenegro, sogra do diretor Andrucha Waddington. Quem também endossa o trabalho do ator é a ex-chacrete Rita Cadillac, interpretada no palco por Livia Dabarian. “Mais que a voz rouca ou a barriga, Stepan pisa no sapato com o pé para fora, como o Chacrinha costumava fazer nos camarins”, conta ela. Rita fez parte da trupe de Abelardo Barbosa entre 1976 e 1983, quando ele trabalhou na cidade, a maior parte do tempo na TV Bandeirantes (teve também passagem pela extinta Tupi e pela Record).
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Na época, o apresentador veio para cá depois de brigar com José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, diretor da Globo, que não se conformava com alguns excessos da estrela. Na memória de Rita, a temporada paulistana foi o auge do animador. Estudantes de colégios organizavam caravanas para cantar junto os sucessos de Odair José, Fábio Jr. e Sidney Magal. Filas se formavam diante do Teatro Bandeirantes, na Avenida Brigadeiro Luís Antônio, e muitos voltavam para casa por causa da lotação. A produção precisava de apoio policial para conter os fãs exaltados. “O programa trazia uma bagunça que faz falta na TV de hoje e, por isso, o povo adorava”, completa a ex-chacrete.