Conheça o polo de ecoturismo de SP, localizado em Parelheiros e Marsilac

A cerca de 50 quilômetros do Centro, as regiões despontam como surpreendentes áreas de lazer e contato com a natureza

Por Sérgio Quintella Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 12 abr 2024, 16h50 - Publicado em 12 abr 2024, 06h00
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Rafting no Selva SP, em Marsilac. Giuliano Prado, em pé, observa o bote em que o repórter Sérgio Quintella (à frente) desceu o Rio Capivari (Daniel Deák/SPTuris/Divulgação)
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Marcada por sua urbanização desenfreada e seus arranha-céus, São Paulo é mais reconhecida pelo concreto do que pelo verde. Não é para menos. Apesar de possuir uma cobertura vegetal total de 54,1%, a metrópole abriga regiões com índices inferiores a 4%, sobretudo nas áreas central e Leste. A compensação vem em suas franjas, em especial nas zonas Norte e Sul. Essa segunda corresponde a mais de 60% de toda a área arborizada da capital. Ali ficam os distritos de Parelheiros e Marsilac, os mais distantes do Centro.

Com ares de cidade do interior, os dois imensos bairros (eles formam 28% do território paulistano) foram criados em meados do século passado, quando ainda pertenciam, em partes, às cidades de Santo Amaro (anexada a São Paulo em 1932) e São Vicente, no Litoral Sul.

Da história pretérita de sua colonização por alemães e posteriormente japoneses, os dois locais já se destacam há alguns anos como grandes produtores de alimentos, sobretudo orgânicos, graças às centenas de pequenas propriedades rurais de base familiar. Nos últimos tempos, outra atividade tem reformulado os negócios: o turismo ecológico e cultural, tanto dentro quanto fora dos sítios e chácaras.

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Sítio Planta Feliz: compostagem em antiga fazenda de produção de embutidos (Daniel Deák/SPTuris/Divulgação)

Chamada oficialmente de Polo de Ecoturismo de São Paulo, por força de uma lei municipal de 2014, a região, também compreendida pela Ilha do Bororé, abriga um surpreendente rol de atrações, com rios e cachoeiras de águas limpas, em meio à Mata Atlântica e ao Cerrado, além de atividades culturais e artísticas.

De passeio de trenzinho puxado por um trator a alimentar cavalos com milho, dá para se sentir no interior a apenas 50 quilômetros da área central. No mês passado, Vejinha passou três dias e duas noites na região* e conheceu um pouco das atrações do pedaço, com direito a rafting no Rio Capivari, um dos últimos limpos da cidade (o outro é o Monos, na mesma região), ida a uma aldeia indígena guarani, além de caminhar por trilhas, parques e estradas de terra.

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Passeio de rafting em Marsilac (Daniel Deák/SPTuris/Divulgação)
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De todas as atividades, dois parques naturais municipais estão entre os mais surpreendentes. Ao contrário dos outros espalhados pela cidade, os espaços não são voltados majoritariamente para a prática de atividades esportivas em grupos, como futebol, por exemplo, mas sim destinados — além da contemplação da natureza (o Lago das Ninfeias é um dos mais procurados) e da recreação em família (os brinquedos, como gangorras e balanços, feitos de madeira, também servem aos adultos) — às atividades de caminhadas por trilhas.

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Lago das Ninfeias no Parque Municipal Itaim (Roberto Setton/Divulgação)

Com 4,5 quilômetros quadrados, o triplo do Parque Ibirapuera, o Parque Natural Municipal Itaim, em Parelheiros, tem a Trilha do Tatu (700 metros de extensão) e o Bosque do Silêncio. A quase 10 quilômetros dali, o Parque Jaceguava, praticamente do mesmo tamanho do vizinho, tem como atrativo principal a Trilha do Saci, com 2 quilômetros de extensão. O caminho, que começa em meio à Mata Atlântica, termina no Cerrado, também característico da região, que difere do primeiro pelo tamanho da vegetação, mais baixa, deixando a temperatura do espaço mais alta.

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O Parque Natural de Itaim (Daniel Deák/SPTuris/Divulgação)
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Parque Natural Jaceguava (Daniel Deák/SPTuris/Divulgação)
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Idealizador das trilhas, o engenheiro agrônomo Marcelo Mendonça, 57, coordena os sete parques naturais da cidade, construídos em terras doadas pelo governo do estado como compensação ambiental pela construção do Rodoanel. Além de desenvolver os brinquedos, Mendonça criou uma veículo especial para cadeirantes poderem utilizar as trilhas (veja no quadro abaixo).

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Marcelo Mendonça ao lado da cadeira (Roberto Setton/Divulgação)
Cadeira especial

Diretor dos sete parques naturais da capital, o engenheiro Marcelo Mendonça é uma espécie de Professor Pardal dos espaços. Além de transformar a madeira das árvores caídas em brinquedos e criar as trilhas, Mendonça está desenvolvendo uma cadeira de ferro destinada ao transporte de pessoas com dificuldade de locomoção. Inspirado na conhecida Cadeira Julietti, o protótipo vai comportar até 120 quilos e já ganhou um apelido entre os funcionários: Marcelete. O próximo passo é obter recursos para terminar a cadeira e dar escala à empreitada: “Pago tudo do meu bolso”, diz o diretor.

Da observação da natureza à contemplação artística, a Casa da Girafa é outro instigante passeio na região. Localizada em um condomínio próximo ao Solo Sagrado de Guarapiranga, a casa foi erguida pelo artista plástico Luiz Cardoso, 49, com materiais reaproveitados de obras e demolições espalhadas pela cidade. A janela de um dos quartos, por exemplo, estava despejada em uma caçamba dentro da Santa Casa de Misericórdia, no Centro. “Fui visitar uns amigos que moravam ao lado e vi da sacada a janela. Corri para a administração e pedi para levá-la. O difícil não foi obter autorização, mas carregá-la até o apartamento dos amigos”, ri.

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Os donos e criadores da Casa da Girafa, Luis Carlos Pena e Caiê Rinaldini (Roberto Setton/Veja SP)
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Feito à mão

Construída com materiais reaproveitados de obras e demolições, a Casa da Girafa, próxima ao Solo Sagrado de Guarapiranga, recebe visitação apenas por meio do serviço Vai de Roteiro, da SPTuris, e de outras empresas parceiras do casal Luiz Cardoso e Caiê Rinaldini. Além da curiosidade quanto à forma como o autor da empreitada ergueu a residência, de 120 metros quadrados, outro mistério se dá quanto ao nome do lugar: “A girafa é um animal de poder e com um coração muito grande. Me inspirei nela para levantar a casa e dar o nome”, diz Luiz. “Foi uma auto-homenagem. Sempre gostei de girafas”, resume Caiê (@casadagirafaatelie).

Sem possuir especialização em arquitetura e engenharia, o autor da casa utilizou madeira, tijolo e pau a pique para erguer o imóvel. “Levou sete anos para ficar pronta, e quem viu o início não imaginou que ficaria dessa forma”, afirma Luiz.

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Interior da Casa da Girafa (Roberto Setton/Veja SP)
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Ecopousada Centro Paulus: opção aconchegante de estada (Daniel Deák/SPTuris/Divulgação)

Outra atividade com cara de passeio rural, o The Roça Park é destinado a crianças e adultos. Em uma típica fazendinha como as de hotéis do interior, é possível alimentar cabras e cavalos com milho, além de observar o manejo de outros animais, como porcos. O carro-chefe do pedaço, no entanto, não é um carro. Dirigido por Joaquim dos Santos, 75, dono do espaço, o trator puxa um trenzinho que leva os turistas para um passeio até a entrada da Represa de Guarapiranga.

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O patriarca Joaquim dos Santos (no trator), com filhas e netos (Daniel Deák/SPTuris/Divulgação)
Em família

Inaugurado há um ano e meio, o The Roça Park é um misto de fazendinha com restaurante colonial tocados por oito integrantes da mesma família. As opções de passeios incluem café da manhã e/ou almoço, com produtos colhidos e produzidos ali mesmo. O pacote completo, incluindo as duas refeições e as atividades do local, como o passeio de trator, custam 140 reais por pessoa. Para o plano, a dica é chegar cedo, pois o café da manhã tardio pode tirar o apetite para a jornada seguinte. Visitas apenas com reservas (@therocapark).

Uma atração à parte são os três cães que acompanham o trajeto e aproveitam uma parada para se refrescarem nas águas da Guarapiranga. Quando a reportagem esteve no passeio, um dos cães voltou com um peixe na boca, para a surpresa da criançada em volta.

De todas as atrações do polo, a mais radical é a descida de bote pelo Rio Capivari, que deságua no Rio Itanhaém, já no litoral e em direção ao mar. O passeio, promovido pelo Selva SP, dura cerca de três horas e passa por quatro cachoeiras, cada uma mais difícil que a outra, mas todas consideradas leves e moderadas. A volta das corredeiras é feita por meio de uma trilha de cerca de uma hora.

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Tirolesa no Capivari (Daniel Deák/SPTuris/Divulgação)
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Com emoção

Instalado praticamente dentro do Capivari, um dos dois últimos rios limpos da capital (o outro é o Monos, na mesma região), o Selva SP conta com uma tirolesa de 120 metros de extensão e 12 metros de altura, além de rapel, caiaques, stand-up paddle e, claro, rafting. Vejinha desceu os 7 quilômetros de águas calmas e rápidas. O passeio de bote leva cerca de três horas, incluindo a volta, percorrida por uma trilha, e comporta crianças maiores e adultos. Os valores partem de 75 reais por pessoa (entrada para o dia todo, sem contar as atividades mais radicais) e chegam a 198 reais (rapel, tirolesa e rafting inclusos). Crianças até 4 anos e idosos acima de 60 anos não pagam a entrada. É necessário agendamento prévio. Estrada do Capivari, 5005, Marsilac, https://www.selvasp.com.br

Para chegar ao local, que só atende com agendamento prévio, a dica é escrever o nome do Selva SP no Waze e também no Google Maps, para o caso da conexão do celular ficar instável.

Na mesma região do Selva SP, a aldeia guarani Krukutu é uma das sete terras indígenas (de um total de catorze) abertas a visitação. O local oferece diversas atividades para os turistas conhecerem a cultura local, como trilhas, palestras, apresentação de coral e degustação de alimentos tradicionais.

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Espaço para apresentações na aldeia Krukutu (Daniel Deák/SPTuris/Divulgação)

Para agendar o passeio pelo site https://www.tenondepora. org.br (não é permitido chegar sem marcar), o visitante precisa ler um documento sobre como se comportar nas aldeias. “Isso é importante, pois as visitas devem seguir a premissa do respeito. Não são todas as perguntas que podem ser feitas, pois podem soar ofensivas aos indígenas”, afirma o guia de turismo Naiche Bentubo, especialista na região.

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Chocalho na aldeia Krukutu (Daniel Deák/SPTuris/Divulgação)
Aldeias paulistanas

Maior terra indígena da região Sudeste, a Tenondé Porã abriga cerca de 2 000 indígenas do povo Guarani Mbyá. Vejinha visitou a Aldeia Krukutu, em Marsilac, e foi recebida pelo líder (não há cacique, mas lideranças que dividem as responsabilidades e tarefas) Tranquilino Karay. Nas escolas da aldeia, as crianças aprendem apenas o guarani até os 5 anos. Depois, são alfabetizadas em português, a despeito de os indígenas locais falarem as duas línguas, tanto em casa quanto com os pares. Na lojinha da aldeia são vendidos objetos produzidos ali, como colares e chocalhos.

O Polo de Ecoturismo é coordenado pela SPTuris, empresa municipal de economia mista, que promove uma série de integrações dos empresários e moradores, tanto entre si quanto com diversas secretarias. “Os sítios começaram a se organizar para abrir e receber o público. Muitos não enxergavam a riqueza e o potencial que existem lá dentro. Com o fluxo de turistas que conseguimos criar, a capacidade de crescimento para a região é enorme”, afirma Fernanda Ascar, diretora de turismo da empresa municipal.

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O dono do Borboletário, Miguel Naghirniac Junior (Roberto Setton/Veja SP)
Cena de filme

Em uma área de 250 000 metros quadrados, o dobro do tamanho do Parque da Aclimação, o espaço que abriga o Borboletário de São Paulo, com mais de 1 000 unidades nascidas e criadas ali mesmo, também é voltado para o turismo de crianças e adolescentes. Foi ali que o filme Carrossel foi filmado. O acampamento Águias da Serra (chamado de Panapaná na obra) funciona em temporadas específicas, sob contratação de escolas. Já o borboletário é aberto ao público em geral apenas aos feriados. A dica é ligar antes de sair de casa, pois em dias sem sol as borboletas se escondem e o espaço fica fechado (@borboletariodesaopaulo, ☎ 11 2908-0125).

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Borboletas no Borboletário, localizado em Engenheiro Marsilac (Daniel Deák/SPTuris/Divulgação)
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Dona do restaurante, Marlene Pereira Silva, no empório (Roberto Setton/Veja SP)
Parada obrigatória

Dona do mais afamado restaurante de Parelheiros e região, o Da Marlene, Marlene Pereira Silva reforça seu espírito empreendedor. Ela acaba de montar o Empório da Marlene, na entrada do salão onde serve refeições em bufê e alguns pratos à la carte, como um memorável virado à paulista — muitos dos insumos são orgânicos e comprados de sitiantes vizinhos. “A loja foi desenvolvida para receber não só o que produzimos no nosso sítio, como o de outros agricultores da região”, explica a proprietária, que abriu o novo negócio em 5 de abril. Nas prateleiras, distribuem-se itens como geleias de goiaba e de jabuticaba, antepasto de berinjela e de cogumelo shimeji com castanha-do-pará, pesto de azedinha, biscoitos variados, licores de frutas e diversos tipos de cachaça, entre elas o uísque tropeiro, que é a pinga aromatizada com cambuci. Há ainda artesanato, em especial dos povos indígenas que sempre habitaram aquele pedaço. Estrada Ecoturística de Parelheiros, 6455, Parelheiros. (Arnaldo Lorençato)

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Empório da Marlene e alguns e seus produtos (Roberto Setton/Veja SP)

Apesar de os mais de cinquenta atrativos estarem abertos a visitação, uma série de regras foram criadas para evitar o colapso da região, ainda carente de infraestrutura. A principal dica é que os paulistanos escolham agências e guias cadastrados para agendar as visitas, como Toca da Onça (☎ 11 99612-8858) e Discovery Fellows (☎ 11 99616-8314). Outra possibilidade é utilizar o serviço Vai de Roteiro, da SPTuris, que promove excursões por toda a cidade, incluindo o Polo de Ecoturismo, aos sábados e domingos (www.sympla.com.br/ produtor/turismoprefsp).

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Mapa do circuito de ecoturismo de São Paulo (Arte/Veja SP)

Publicado em VEJA São Paulo de 12 de abril de 2024, edição nº 2888

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