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Cartas trocadas entre Arthur Nestrovski e a Osesp

Acompanhe as trocas de farpas entre diretor artístico e integrantes da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo

Por Redação VEJA SÃO PAULO
Atualizado em 5 dez 2016, 16h31 - Publicado em 7 dez 2012, 19h57

Leia abaixo a íntegra das cartas trocadas entre o diretor artístico da Osesp, Arthur Nestrovski, e os integrantes da formação representados por Sávio Araújo, diretor presidente da Associação de Profissionais da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, a Aposesp, em decorrência da reportagem “O Solista dos Bastidores”, publicada na edição de VEJA SÃO PAULO que circulou no dia 17 de novembro:

+ Leia a matéria sobre Athur Nestrovski e a Osesp

+ Confira a repercussão da matéria da Veja São Paulo sobre Arthur Nestrovski

CARTA AOS MÚSICOS (enviada no dia 26 de novembro)

Caros colegas,

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Cheguei de viagem anteontem e fui tolhido pelo furacão dessa malfadada reportagem da revista Veja. Não preciso dizer do meu incômodo com a forma como tudo apareceu nesse texto. A começar pela atribuição de termos e falas que não disse e pela ausência de tanto do que eu de fato falei. A continuar pelos muitos pontos ofensivos a tantos de nós – a começar comigo mesmo, alvo de comentários ofensivos que acredito tenham sido formulados noutro espírito e noutro contexto (como tanto mais do que foi dito). Não poderia haver texto mais inapropriado a essa altura dessa brilhante Temporada.

Todos nós já passamos por isso antes, de um ou de outro modo; e sabemos que responder aos jornalistas só alimenta o assunto, com resultados contrários ao desejado. O Presidente Fernando Henrique e o secretário Marcelo Araújo, de resto, publicaram hoje uma carta na seção dos leitores, salientando o caráter coletivo de todo o trabalho praticado desde sempre pela Fundação Osesp.

Escrevo a vocês para enfatizar não só meu descontentamento com essa matéria, mas também minha esperança de que saberemos, antes de mais nada separar o que está ali formulado da realidade dos fatos e, também, desculpar e apagar logo da memória o que foi escrito na infeliz reportagem. Estamos vivendo um momento especial da história da Osesp, com grandes conquistas e grandes perspectivas.

A Osesp tem hoje condições de se firmar com uma das instituições musicais de maior importância no cenário mundial, nesse início de século 21. É isso que importa: a grandeza e a beleza de um projeto sem igual. Não há um de nós que não venha se esforçando para isso. De minha parte, se há uma coisa verdadeira na reportagem, são as palavras do Presidente, comentando o “grau enorme” de meu comprometimento. Tenho grande orgulho de participar desse projeto, ao lado de vocês, do diretor executivo Marcelo Lopes, da nossa regente titular Marin Alsop e das muitas equipes da Fundação, com apoio do nosso Conselho.

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Vêm aí três semanas muito especiais, um triplo fecho de ouro para o ano, começando com a visita do compositor residente Magnus Lindberg e a gravação da Quarta de Prokofiev, continuando com a homenagem a Lev Veksler (representando os músicos da Osesp) e concluindo com a Suíte Chico e Porgy and Bess, na Praia do Gonzaga. Vamos todos aproveitar ao máximo essa música, no ambiente único que temos o privilégio de compartilhar.

Abraços do Arthur Nestrovski

A RESPOSTA DOS MÚSICOS

Caro Arthur,

Desculpe-me utilizar do e-mail para este assunto, mas como você já o fez, me sinto no direito de responder.

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Sua “Carta aos Músicos” não poderia ser mais previsível. Especialmente quando enviada no mesmo dia que a VEJA SÃO PAULO publica uma nota conjunta do Presidente Fernando Henrique Cardoso e do Secretário de Cultura Marcelo Araújo, esclarecendo fatos muito importantes que foram omitidos na reportagem.

Vamos à sua carta. Você afirma que chegou “anteontem” e que foi tolhido pelo furacão da malfada reportagem. Fica a dúvida:

– você não sabia do teor da matéria?- ou não tinha idéia da repercussão negativa que a mesma causou em nossa orquestra?

É difícil acreditar que você não sabia do teor da matéria. Em primeiro lugar porque eu mesmo fiz questão de ligar para você no dia seguinte da minha entrevista para a Raquel Verano, apontando que tratava-se de uma “lavagem de roupa suja”, no meu entendimento. Aliás, eu inclusive disse que não concordava com esse tipo de matéria. Deixei isso claro a você, assim como deixei isso claro à Raquel. Você estava fora do país, portanto sem acesso à versão impressa da Vejinha. Mas ela está online. Portanto, saber da reportagem, de seu teor, seria bem simples. Indo além, é difícil imaginar que, tratando-se de um perfil, você não tivesse lido a matéria mesmo antes dela ter sido publicada. Mas isso eu não vou especular. O fato é que você conhecia a matéria e teve acesso até mesmo à versão impressa da revista, como mostra o seu post no Facebook no dia 17, o sábado em que a Vejinha foi para as bancas. Incluo aqui um print screen do seu post no Facebook, para ficar bem claro.

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Por outro lado, se sua surpresa não foi com o teor da reportagem mas sim com a repercussão entre os músicos e na própria Fundação Osesp, eu sinto muito, mas sua resposta vem demasiadamente tarde. Deveria ter vindo já há alguns dias.

Na realidade, se é tudo como você alega, seria desejável – e muito oportuno – que você mesmo tivesse escrito à Veja, através do Painel do Leitor, reclamando que aquilo que está posto na reportagem não corresponde à entrevista que você concedeu. Esta mesma “Carta aos Músicos” estaria de bom tamanho, pois deixaria claro para todos, músicos, colaboradores, gestores, Conselheiros, Secretários e leitores em geral, que tudo aqui publicado pela Vejinha não passa de uma grande fantasia da Raquel.

Mas continuando. Quando eu digo que sua carta é previsível, o faço justamente porque eu esperava ouvir que você sente-se incomodado” com a forma como tudo apareceu nesse texto… a começar pela atribuição de termos e falas que não disse e pela ausência de tanto do que eu de fato falei”. Não estou brincando. Eu realmente esperava ouvir isso. E por que eu esperava? Porque isso é típico em situações assim. Atribuir ao repórter toda a responsabilidade. Aliás, um parênteses em meu raciocínio: algo muito similar aconteceu durante nossa turnê pela Europa em 2010. O maestro Tortellier chegou a esboçar uma tentativa de pedido de desculpas à Osesp, justamente atribuindo ao jornalista toda a resposabilidade pela barbaridade que ele proclamou contra os músicos. E me desculpe, vocês ainda tiveram a coragem de oferecer-lhe o título de Regente de Honra da Osesp. Outro desrespeito aos músicos!

Voltando à sua carta e seu pedido de desculpas. É realmente difícil de aceitar. Principalmente quando me lembro de alguns trechos do diário que você publicou na revista PIAUÍ em 2011. Senão, atente para seguinte extrato retirado do diário:

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“Todo mundo observa que os músicos reclamam demais. Em todas as orquestras é assim… é a reclamação pessoal que mais impressiona… pelos motivos mais variados, que vão do sublime ao trivial. Eis aqui uma tentativa de explicação. Raras profissões exigem tanta disciplina. A música em si demanda isso, mas a prática orquestral vai mais longe, primeiro pela natureza do conjunto, mas também pelas contingências do dia a dia… Para integrar a orquestra, cada músico estudou muitos anos, aprimorando em alto nível um talento já singular. Agora, no entanto, justamente quando vai tocar, não sobra quase espaço para a expressão individual…Tem mais: para a maioria dos músicos de orquestra – exceção feita aos de função solista (como o spalla, a primeira flauta, o primeiro trompete, o tímpano etc.) – não há como ser ouvido individualmente…. a não ser quando toca uma nota errada. Entende-se, então, que cada músico queira ser ouvido, por si, em si e para si – que é o que acontece, afinal, quando reclama. Nesse momento, ele ou ela cobra atenção particular. Precisa ser escutado e, na medida do possível, atendido. Não quer dizer que não tenha motivo e não quer dizer que não tenha razão. Mas o caráter e frequência das reclamações sugerem algo além de cada queixa específica…”

Para quem não sabe, ou não leu, esse texto é parte do diário “Entre Harpas e bagagens”, publicado na edição No. 52 da revista PIAUÍ em Janeiro de 2011. Entre esse pequeno extrato do diário e outros episódios (que vão da disenteria de um músico a um barraco no saguão do hotel por causa de “um músico de temperamento desassossegado, e que a essa altura já tomou uma cerveja além do que devia…”), o diário publicado na PIAUÍ se assemelha muito à reportagem da Vejinha, ao expor situações que, embora possam parecer como uma mera curiosidade, acabam sendo somente fofoca de bastidor e que expõe músicos, e a própria Osesp, à situações constrangedoras. Da mesma forma que o print screen do Facebook, incluo em anexo um PDF da revista PIAUÍ, para ficar bem claro o que estou relatando.

À luz de seu diário publicado na PIAUÍ, eu não tenho como atribuir responsabilidade à repórter da Vejinha pelo que foi publicado na reportagem da semana passada. Me desculpe, mas isso eu não consigo aceitar. Da mesma forma, é muito difícil apagar da memória. Aliás, vamos combinar que esse é um pedido que não deveria ter sido feito.

Realmente essa reportagem chega em um momento absolutamente inapropriado. Praticamente no final de uma temporada absolutamente intensa, onde os músicos se dedicaram exaustivamente, trabalharam exaustivamente em semanas de até 13 serviços, com cinco concertos, gravações, viagens, horas de estudo, concertos importantíssimos em turnê realizados sem ensaios (onde os músicos estavam com seus nervos à flor da pele), etc., etc., etc. Depois de tudo isso, e com o que ainda temos pela frente nas próximas semanas, é realmente incômodo e doloroso esse “reconhecimento” estampado na matéria da Veja SP.

Sávio Araújo, Diretor Presidente APOSESP

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