Exposição e filme resgatam a história da Batalha da Rua Maria Antônia
Longa-metragem de Vera Egito e mostra com fotografias de Hiroto Yoshioka revivem o conflito que completou 55 anos neste mês
O fotógrafo e ex-estudante de arquitetura Hiroto Yoshioka, 80, tinha 25 anos quando, em uma quinta-feira de outubro de 1968, soube que estava acontecendo uma briga entre estudantes na Rua Maria Antônia, na Vila Buarque.
Munido de sua câmera Nikon, tirou fotos do último dia de conflito. Mais de cinco décadas depois, sua participação no registro daquela guerra estudantil dá luz à mostra Batalha a Preservar: Maria Antônia, 55 anos, que abre hoje (27) no Centro MariAntonia da USP, e também a uma homenagem no filme A Batalha da Rua Maria Antônia (2023), dirigido e escrito por Vera Egito.
“Lembro do pessoal soltando rojão de um lado, rojão do outro. E, do Mackenzie, começaram a jogar coquetéis molotov”, lembra o fotógrafo paulista, que ingressou na FAU-USP em 1964, mas largou o curso após se envolver no movimento estudantil e começar a fotografar para revistas da Editora Abril.
No dia anterior, o conflito havia esquentado após um aluno do Mackenzie, em protesto a um pedágio cobrado por alunos da USP para custear o congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), atirar um ovo podre no grupo.
A batalha terminou com a invasão do prédio da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP pelos militares, e deixou uma morte e dezenas de feridos. “Quando a força pública soltou a cavalaria, todos saímos correndo. Entrei na Faculdade de Economia (da USP), na Rua Doutor Vila Nova. Os militares começaram a invadir o prédio e foram batendo de sala em sala. Apagamos as luzes, eles pensaram que não tinha ninguém e foram embora”, conta Yoshioka.
Os detalhes daqueles dias 2 e 3 de outubro são narrados no longa A Batalha da Rua Maria Antônia (2023), que venceu o prêmio de melhor filme de ficção no Festival do Rio.
A produção acompanha as 24 horas do conflito a partir de 21 planos-sequência em preto e branco. “Acho que é um filme que está mexendo com as pessoas por não ser algo tão distante. Não é sobre o passado, é sobre o presente”, diz Vera.
Formada pela USP, a cineasta começou a rascunhar o projeto ainda em 2009, mas ele só saiu do papel em abril de 2022, quando foi filmado, em doze dias — a locação não foi a Rua Maria Antônia, e sim o prédio da Secretaria da Justiça e Cidadania, atrás do Pátio do Colégio, pois as fachadas estão mais preservadas.
“O Mackenzie não quis falar com a gente sobre a gravação. Entramos em contato e disseram que não estavam interessados”, disse a diretora. Apesar de os personagens serem fictícios, existem referências a pessoas reais — uma delas é o próprio Yoshioka. “Conversei com ele há alguns anos. Tem um personagem que carrega uma câmera e aparece em várias cenas. Fizemos essa homenagem a ele, nem sei se ele sabe.”
Em sua entrevista à Vejinha, o fotógrafo recebeu a notícia. “Eu gostaria muito de assistir, é uma surpresa para mim. Soube que o filme foi premiado, mas isso eu não sabia. Quero ver.”
Sem previsão de estreia no circuito comercial, o filme terá duas sessões neste fim de semana, na 47ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo: sábado (28) no Cineclube Cortina e domingo (29) no Reserva Cultural, com poucos ingressos disponíveis na bilheteria, no dia das exibições.
Centro MariAntonia da USP. Rua Maria Antônia, 258, Vila Buarque, ☎ 3123-5202. ♿Ter. a dom., 10h/18h. Até 31/3/2024. Grátis. @mariantoniausp
Publicado em VEJA São Paulo de 27 de outubro de 2023, edição nº 2865