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Araquém Alcântara celebra carreira de 54 anos com retrospectiva

Principal fotógrafo de natureza do país expõe sessenta obras na Pinacoteca de Santos

Por Laura Pereira Lima
Atualizado em 7 jun 2024, 10h01 - Publicado em 7 jun 2024, 08h00
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Araquém Alcântara: principal fotógrafo de natureza do país (Rubens MatsushIta/Divulgação)
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Em 1970, Araquém Alcântara dava seu primeiro clique. Aluno de jornalismo na Universidade de Santos, o jovem de 18 anos se aventurou pelas ruas da cidade com uma câmera emprestada e, no cais, fotografou uma prostituta. “Acredito que minha carreira começou com aquela foto”, conta Araquém, que hoje, aos 73 anos, é um dos principais fotógrafos de natureza do Brasil.

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Mulheres indígenas do Parque do Xingu, em 2023 (Araquém Alcântara/Reprodução)

Ele celebra sua trajetória de mais de meio século com a exposição Araquém Alcântara: Retrospectiva 50 anos, que abriu para o público na última quinta (6), na Pinacoteca Benedito Calixto, em frente à praia de Santos, cidade que o formou. A mostra, sua primeira retrospectiva, é um plano que Araquém alimenta desde 2020, quando efetivamente completou meio século de profissão, mas que precisou ser adiado por uma série de projetos, como o livro Amazônia das Crianças, publicado em 2023, além da pandemia.

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Menina Zo’e, no Pará (2007) (Araquém Alcântara/Reprodução)
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Ribeirinha com bicho-preguiça, Rio Negro (2012) (Araquém Alcântara/Reprodução)

Das mais de 500 000 fotografias tiradas desde 1970, Araquém teve de escolher apenas sessenta para a mostra. “Foi um dos trabalhos mais difíceis da minha vida”, confessa. Mas, depois de resistir à tentação de criar uma sala inteira só com seus registros de onças, ele se mostra satisfeito com o resultado. “Foi uma tarefa importante, afinal, a fotografia também é um exercício de síntese”, defende. A escolha por situar a presente seleção em Santos foi natural. “Foi a cidade que me deu régua e compasso”, afirma o catarinense de Florianópolis, relembrando a epifania na praia que culminou na sua guinada de carreira em direção às imagens.

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Seca no Rio Negro, 2023 (Araquém Alcântara/Reprodução)
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Rio Japurá, no Amazonas (2015) (Araquém Alcântara/Reprodução)

Autodidata — o curso de jornalismo não oferecia aula de fotografia —, ele se inspirou em grandes mestres da área, como Henri Cartier-Bresson, para produzir imagens de denúncia da poluição nos arredores de Santos, notadamente Cubatão, e de exaltação à beleza natural brasileira. Suas principais obras foram registradas em meio à floresta e, em especial, nas paisagens amazônicas. Araquém, dono de uma coleção de mais de 300 fotos de onças — seis das quais estão na exposição —, revela o segredo para fotografar animais: “Você tem que ficar invisível e ouvir o chamado do bicho”. Galhos sobre a cabeça, roupas com estampa militar e corpo submerso na água são algumas estratégias comuns de camuflagem.

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Pororoca na Ilha Caviana (2014) (Araquém Alcântara/Reprodução)
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Pescador da comunidade São Francisco, no Rio Juruá (2006) (Araquém Alcântara/Reprodução)

Mas nem tudo pode ser resolvido com um disfarce. “Um verdadeiro fotógrafo de natureza precisa enfrentar adversidades”, decreta. Em uma ocasião, ficou cara a cara com o felino na floresta. “Foi um medo primal”, lembra. Fome, pouso forçado e carros quebrados também compõem o rol de perrengues enfrentados. Ele recorda que na década de 90 foi sequestrado durante cinco dias por indígenas caiapós, que exigiram gasolina de aviação e pimenta verde antes de o libertarem. “Ouvia jenipapos caindo e sonhava que eram os indígenas me matando com bordunas (armas longas e cilíndricas de madeira)”, conta. Dotado de afiada memória, Araquém defende que a fotografia é uma espécie de atestado de presença: “A partir dela, lembro do cheiro, das pessoas, da atmosfera do lugar”.

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(Araquém Alcântara/Reprodução)
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Tamanduá-mirim queimado no Pará (2005) (Araquém Alcântara/Reprodução)
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Árvore morta no Amazonas (2011) (Araquém Alcântara/Reprodução)

Com uma fotografia política, ele dedica seus pixels à conscientização e à preservação da natureza, trazendo aos olhos urbanos a riqueza escondida por trás das folhagens. “Ainda não há uma percepção de que é preciso ações profundas e imediatas para que tenhamos um futuro menos aterrorizante. Com minhas fotos, busco trazer essa consciência”, completa. No Pantanal, na Amazônia, no Cerrado ou em Cubatão, a fotografia de Araquém Alcântara é um grito de socorro em imagens.

A história de dois cliques históricos de Araquém Alcântara:

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“Foi minha primeira foto de onça. Em 1980, fui a Manaus fotografar uma revenda de pneus. Na piscina do hotel entreouvi dois garçons conversando sobre uma onça que andava aparecendo na região. Logo perguntei ao garçom se ele me levaria até ela, e ele aceitou. Foram cinco horas de barco pela vastidão dos Solimões. No primeiro dia, nada de onça. No segundo dia, precisava voltar para fotografar uma festa. Não voltei. Passamos a manhã toda circulando e, à tarde, decidi que precisava ir embora. Foi quando a avistei. Ela me ajudou: pulou em um galho e o abraçou, aí eu, todo trêmulo, fiz a foto. A imagem foi vendida para um estrangeiro e, com o valor, comprei colete, tripé, filtros, lentes e a primeira Nikon.” (Araquém Alcântara/Reprodução)
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“Foi uma imagem muito emblemática. Vi uma foto de esqueletos em Hiroshima e aquilo me impressionou muito. Na década de 80, o governo militar planejava construir duas usinas na região da Jureia, no litoral paulista. Daí, quando eu vi que as duas usinas nucleares equivaleriam a 10 000 bombas de Hiroshima, fui até a região e fiz a reprodução da foto. Meu pai tinha ido comigo e posou na praia onde as usinas seriam construídas, soltou os cabelos e segurou a foto enquadrada da cidade japonesa. Essa foto é de idealismo, mas eu já estava envolvido com uma fotografia política. Não tinha sentido aquilo, duas usinas atômicas. Depois de muita luta, elas não foram construídas. Fico feliz em saber que minhas fotos deram uma pequena contribuição para isso.” (Araquém Alcântara/Reprodução)

Pinacoteca Benedito Calixto. Avenida Bartholomeu de Gusmão, 15, Boqueirão, Santos. ☎ (13) 3288-2260 . → Ter. a dom., 9h/18h. Grátis. Até 21/6. 

Publicado em VEJA São Paulo de 7 de junho de 2024, edição nº 2896

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