Após sucesso em Paris, ‘Tom na Fazenda’ retorna à cidade
Peça produzida e protagonizada por Armando Babaioff reestreia nesta sexta (5) no Teatro Vivo
O desafio das grandes distâncias nunca foi um problema para Armando Babaioff. Ainda adolescente, o jovem morador do bairro de Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, costumava pegar dois ônibus e uma barca para ensaiar com um grupo de teatro na vizinha Niterói. Agora, o determinado Babaioff acaba de cruzar o Atlântico e levou Tom na Fazenda a Paris, e lá a peça foi aplaudida de pé por pouco mais de um mês — lembrando que tinha tudo para dar errado, já que as falas eram em português acompanhadas de legendas. Esse aparente empecilho não impediu o público de lotar os 225 lugares do Théâtre Paris-Villette.
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Consagrada em críticas como a do diário Le Monde, que destaca a transformação da “brutalidade em um gesto estético”, a peça volta da temporada internacional e de uma bem-sucedida turnê nacional por Recife, Natal, Juiz de Fora e Belo Horizonte para a reestreia paulistana nesta sexta (5), no Teatro Vivo.
Protagonista e produtor do espetáculo, o ator de 42 anos mais os três colegas de palco vivem uma relação delicada. O publicitário Tom (Babaioff) vai a uma fazenda para o funeral do namorado morto em um acidente e depara com uma família nada ajustada: a sogra (Soraya Ravenle), o irmão violento do ex- companheiro (Gustavo Rodrigues) e a falsa noiva do falecido (Camila Nhary). Nesse ambiente rural, ninguém sabia da orientação sexual do morto, e começa uma história com personagens instáveis emocionalmente. Temas como a homofobia vêm à tona.
Na primeira passagem pela cidade, em 2019, a peça, que estreou no Rio de Janeiro em 2017, permaneceu um mês em cartaz no Sesc Santo Amaro. Desde a estreia, a encenação minimalista do diretor Rodrigo Portella coloca os atores sobre uma lona de plástico coberta de barro que vai sendo molhada. À medida que o conflito avança, o piso vira um lamaçal, acentuando a tensão.
Embora pudesse acontecer em qualquer lugar, Tom na Fazenda é uma tradução e adaptação do próprio Babaioff para Tom à la Ferme, obra do dramaturgo canadense Michel Marc Bouchard, vertida das versões em francês e da tradução em inglês com acréscimos do ator.
“A primeira fala é um caco meu, uma descrição da fazenda que fiz a pedido do Rodrigo”, conta. Levado para o cinema em 2013, por Xavier Dolan, o texto chamou a atenção do ator, em particular, por afirmar: “Os homossexuais aprendem a mentir antes mesmo de aprender a amar”.
Embora seja uma produção independente, bancada por Babaioff, a montagem brasileira percorreu uma longa trajetória internacional. Foi encenada duas vezes em Montreal, onde vive o autor. “Na mais recente, tivemos de sair de lá às pressas porque começou a pandemia. Foi em 2020”, lembra ele. Foi também o que impossibilitou a escala prevista para Nova York.
O contratempo não impediu a ambição de levar o espetáculo ao exterior. Em julho do ano passado, usando os próprios recursos novamente, colocou Tom na Fazenda no festival de Avignon. “É uma grande feira. Foram encenadas mais de 1 500 peças e só duas eram brasileiras, a outra falada em francês”, conta ele, que enfrentou reveses como ocupar um teatro fora da área central e murada da cidade do sul da França. “Os franceses estão acostumados com companhia e não entendiam que eu era um ator-produtor. Não existe essa figura para eles.” Felizmente, só houve críticas positivas, um reforço ao convite recebido anteriormente para levar a encenação a Paris.
Babaioff não pretende parar a carreira de Tom na Fazenda no exterior. Com uma agente na França, está negociada outra viagem de quatro meses por várias cidades do país, “de norte a sul”, como ele gosta de dizer. Também integram o pacote Bélgica, Suíça e Portugal, além de um flerte com o Marrocos.
Com a cabeça cheia de sonhos, aventa a possibilidade de ter Tom na Fazenda em países como Austrália e Japão — ainda faz outros projetos, como fazer a primeira direção usando outro texto de Michel Marc Bouchard, poeticamente intitulado de Os Manuscritos do Dilúvio. “Ele me deu todos os direitos das peças dele”, revela o ator. Depois do sucesso na França, o mundo ficou pequeno para Babaioff.
Teatro Vivo. Avenida Chucri Zaidan, 2460, Brooklin, ☎ 3279-1520. → (120min). 18 anos. Sextas e sábados, 20h; domingos, 18h. R$ 75,00 (quantidade limitada) e R$ 100,00.
Reestreia em 5/5. Até 25/6. vivo.com.br.
Publicado em VEJA São Paulo de 10 de maio de 2023, edição nº 2840