“A gente fala com as favelas”, diz Veigh, que traz Timbaland em novo disco
Confira a entrevista com o gigante do trap, que expande sua própria gravadora e fala sobre os dilemas da fama no álbum 'Eu Venci o Mundo'

Astro do trap brasileiro, conhecido pelas melodias e rimas viciantes, religioso e avesso a bebidas e noitadas. Este é Veigh, artista que foi alçado ao topo do gênero com os discos Dos Prédios (2022) e Dos Prédios Deluxe (2023) e está prestes a lançar o álbum Eu Venci o Mundo (2025), no dia 26, consolidando seu novo momento.
Vejinha escutou faixas do disco em primeira mão, no último dia 11, em visita à Supernova Entertainment, gravadora independente criada pelo artista em 2021 e instalada na Vila Mariana desde o ano passado.
Com três estúdios e quatro andares, é a concretização de um sonho — se ele veio “dos prédios”, referência à Cohab 1 de Itapevi, onde cresceu, agora Veigh tem um edifício para chamar de seu. “É bem difícil quando você não se alinha a ninguém e aprende por si só, ainda mais no meio da música, onde é muito complicado encontrar pessoas que trabalham certo. Então tentamos fazer tudo diferente”, pensa o artista, que chegou à entrevista vestindo anéis e roupas estampando a sigla do álbum, “EVOM”.

A frase bíblica que nomeia o trabalho, retirada do Novo Testamento, traz um sentimento de vitória e também uma ideia de confronto com o meio ao redor. O caminho não foi fácil. Thiago Veigh vendeu roupas na 25 de Março, foi garçom e trabalhou com telemarketing antes de estourar de vez com seu lançamento anterior, que alcançou o topo global do Spotify. Hoje ele reside na Zona Leste.
“Acredito muito na força da palavra, sempre cantei sobre coisas que não possuía. Profetizar é algo forte na minha carreira”, diz ele, que carrega no pescoço uma foto da sua mãe. “Ela é religiosa, desde pequeno vamos à igreja, é algo muito pessoal. As pessoas às vezes me conhecem por ser esse cara mais tranquilo, que sempre fala de Deus; sigo esse caminho.”
As rimas do novo álbum, gravado entre Brasil, França e Chile, falam do contraste entre mundo material e religião. “Essa dualidade existe entre a música e o ambiente onde eu cresci. Tento unir dois mundos”, define o trapper.

“No álbum tem músicas para curtir, outras para você pegar uma visão legal. Entre a rua, a religião, os pecados, tudo que engloba a loucura da fama, mas ainda com o Veigh das antigas, junto de Deus.” Essa linha tênue está envolta em novas sonoridades e com menor presença do autotune (recurso que corrige a afinação).
A cereja do bolo é a participação do tarimbado produtor americano Timbaland. “Comentei sobre ele durante uma reunião em Miami, e no outro dia disseram que ele estava me esperando. Fui à casa dele e mostrei faixas do álbum, ele acabou produzindo uma delas”, revela.
Ultimamente a rotina do artista tem sido jantar com os amigos e ir à gravadora. “Nunca criei um personagem. Continuo o mesmo, não tem deslumbre, agradeço a Deus por não ter subido à cabeça. Se eu errar ou acertar vai ser o Thiago, não o Veigh”, afirma. Para ele, é difícil manter os valores em meio à fama. “Vejo muita coisa hoje que não via na minha quebrada, em relação a drogas, bebida, luxúria, prostituição. E me assusta um pouco, porque nunca vivi isso, nunca gostei de sair, beber. Não porque acho errado, cada um faz o que quiser, mas, como tive outra criação, não consigo ver esse mundo de uma forma legal.”

Para além de rimar sobre suas contradições pessoais, Veigh também tem usado sua voz para causas coletivas. No início do mês, saiu em defesa de MC Poze do Rodo após a prisão do cantor por suposta associação ao tráfico, dizendo nas redes: “Vejo muitas pessoas com dinheiro, que cometeram crimes reais, não serem tratadas como ele foi”.
Em maio, arrecadou alimentos para uma casa de acolhimento de mulheres trans. “Temos um poder de voz muito forte, isso deixa as pessoas com medo. A gente fala com as favelas. E nossa voz tem que ser usada para fortalecer as minorias.” À época, foi alvo de críticas nas redes sociais pela ação. “Fiquei chateado, porque o rap tem essa fama do machismo. Estávamos ajudando quem precisa, muitas também são de quebrada, às vezes pretas, olha a sequência de marretada que levam”, comenta.
Entre fãs e haters, pecado e religião, tranquilidade e multidões, Veigh tem traçado o seu próprio caminho. ■

Publicado em VEJA São Paulo de 20 de junho de 2025, edição nº 2949