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São Paulo nas Alturas

Por Raul Juste Lores Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Redator-chefe de Veja São Paulo, é autor do livro "São Paulo nas Alturas", sobre a Pauliceia dos anos 50. Ex-correspondente em Pequim, Nova York, Washington e Buenos Aires, escreve sobre urbanismo e arquitetura
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Prédio que desabou teve anos de abandono e projetos engavetados

A tragédia no Paissandu pede um debate maior sobre a estratégia dos movimentos de moradia

Por Raul Juste Lores Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 1 Maio 2018, 11h16 - Publicado em 1 Maio 2018, 10h43
Edifício Wilton Paes de Almeida, que desabou na madrugada desta terça (1°), foi projetado em 1961 (Veja SP/Veja SP)
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O prédio no Largo do Paissandu que desabou nesta madrugada estava vazio desde 2001. Por vinte anos, a partir dos anos 70, seus 24 andares foram utilizados pela Polícia Federal. Uma agência do INSS ocupou apenas o térreo até 2009.

O governo federal teve dezessete anos para arranjar um destino para o edifício de 14 000 metros quadrados de área construída. Houve fartura de dinheiro nesse mesmo período para estádios da Copa, Olimpíada, submarino nuclear, estaleiros, hidrelétricas na Amazônia, refinaria para petróleo venezuelano, obras na África e para os sempre distantes conjuntos habitacionais do Minha casa, minha vida (quase todas essas iniciativas favorecendo as mesmas empreiteiras de sempre).

Antiga sede da Companhia Brasileira de Vidro, o edifício Wilton Paes de Almeida foi projetado em 1961 pelo grande arquiteto sírio-brasileiro Roger Zmekhol (1928-1976). A família escapou da perseguição aos cristãos na Síria e o pequeno Roger nasceu em Paris. Ainda criança, vieram para o Brasil. Ele se formou na primeira turma da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.

Sua obra mais famosa, pioneira no uso da pele de vidro e aclamada pela modernidade então, virou vítima do jogo de empurra burocrático nesses anos de abandono.

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(Reprodução/Veja SP)

Surgiram projetos fracassados para transferi-lo ao Sesc, a uma ONG francesa, à prefeitura, a uma universidade. Tudo naquela velocidade vertiginosa da administração pública. Invasões e despejos se seguiram. A arrastada transferência para a prefeitura estava quase sacramentada.

Governos federal, estadual e municipal são donos de milhares de imóveis. Não têm vontade ou expertise para saber o que fazer com eles. As burocracias responsáveis por esse patrimônio parecem não ter muita pressa ou vontade de lhes dar novo uso _e perder, assim, o poder que têm ao mandar _ e dormir em cima _ dessas fortunas.

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Porém, o prédio que caiu até foi a leilão no final de 2015, por determinação do então ministro Nelson Barbosa, ainda na gestão Dilma. O governo pedia 21,5 milhões de reais por ele. Não apareceu nenhum interessado. A reforma do prédio deteriorado custaria o dobro desse valor, elevando o valor do investimento para mais de 60 milhões. Ou mais? Uma construção nova custaria menos.

Por que o governo, então, pediu um valor tão alto? Quando escrevi sobre o assunto, fontes na administração federal me confidenciaram que “quem avalia o imóvel para leilão não quer ser processado no futuro por ter subavaliado um bem federal”. Com medo de algum processo futuro, colocaram o preço nas alturas. E, assim, o edifício envidraçado continuou no abandono.

A tragédia no Paissandu, com número de vítimas ainda a ser calculado, também pede um debate maior sobre a estratégia dos movimentos de moradia, que ocuparam por anos o tal prédio sinistrado. A pressão que os movimentos exercem nos governos jamais deve preceder a segurança dos integrantes dos mesmos. Há diversos prédios ocupados que, basta checar a olho nu, têm fiação irregular, botijões de gás espalhados, ausências de rotas de fuga e extintores. As ocupações de caráter temporário têm se tornado permanentes. Outras tragédias assim podem acontecer. Falar que a “culpa é do governo” não vai salvar essas vidas.

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