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Capital da parafina, SP é a cidade sem praia com mais surfistas no mundo

Como é a rotina dos praticantes a 70 quilômetros do litoral, contingente que movimenta 1,5 bilhão de reais por ano, e os endereços ligados ao esporte

Por Guilherme Queiroz
Atualizado em 11 jan 2019, 06h00 - Publicado em 11 jan 2019, 06h00

A conquista do bicampeonato mundial pelo paulista Gabriel Medina nas ondas de Pipeline, no Havaí, em dezembro, aumentou a visibilidade nacional do surfe. E, mesmo localizada a quase 70 quilômetros do litoral mais próximo, a cidade de São Paulo tornou-se um polo do esporte da água salgada. A metrópole famosa pelos negócios e pela gastronomia reúne cerca de 150 000 praticantes, segundo estimativa da revista Almasurf. “Trata-se da cidade não litorânea com o maior número de surfistas em todo o mundo”, diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria e dos Esportes com Prancha, Romeu Andreatta.

Esse contingente tem um impacto forte no mercado: a capital movimenta mais de 1,5 bilhão de reais por ano no comércio de surfwear, com roupas, acessórios ou equipamentos da modalidade. Isso significa que nada menos que 25% do consumo de surfe no Brasil ocorre num local sem uma mísera praia. “O recente destaque internacional do Brasil no esporte ajudou ainda mais no aquecimento das vendas”, explica Guilherme Dembitzky, representante comercial da californiana Quiksilver, uma das líderes mundiais do setor.

A influência do esporte por aqui pode ser conferida em endereços espalhados por várias regiões. O bairro de Moema, na Zona Sul, por exemplo, é um ponto de concentração de algumas das mais tradicionais surf shops da cidade, como a Flutuar e a Surfers Paradise. Por ali é possível adquirir pranchas prontas, mas se a ideia é ter um equipamento sob medida, a melhor alternativa é recorrer a um shaper. Mais conhecido como Akiwas, Alexandre Flora modela até cinquenta pranchas por mês em sua fábrica na Vila Romana, na Zona Oeste. Já o Lar Mar, localizado em Pinheiros, reúne bar, restaurante e loja de acessórios em um ambiente com decoração e cardápio de inspiração “praiana”.

Eventos ajudam a manter os surfistas paulistanos motivados mesmo nos momentos de mar flat (sem ondas). O Festivalma, que aborda a cultura do esporte, terá sua 13ª edição a partir do dia 25, na Avenida Paulista. Para novembro está marcado o The Board Trader Show, que reúne fabricantes do segmento. Uma série de serviços também está à disposição de quem pretende descer a serra para encarar as esquerdas e direitas de nosso litoral. Com sede nos arredores do Parque Ibirapuera, na Zona Sul, o site Waves fornece previsão das condições do mar de 180 praias da costa brasileira e recebe mais de 700 000 visitantes por mês. “Somos o segundo maior portal de surfe do mundo”, diz o fundador, Cláudio Martins de Andrade.

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O surfista paulistano rompe com o surrado estereótipo do sujeito que vive à espera do próximo swell (série de ondas). Muitos dos nossos donos de prancha trabalham no mercado financeiro, como o economista Lucas Freitas, que usa suas raras brechas para manter regularidade na remada. Antes associado aos homens, o surfe também ganha espaço entre o público feminino, com 17% dos praticantes da capital. Um exemplo disso é a empreendedora Victoria Muratore, ex-iFood e Gympass, que já chegou ao escritório com sal atrás das orelhas após uma sessão matutina no Guarujá. Nos quadros espalhados pelas páginas desta reportagem, você confere algumas das histórias e locais que ajudaram a transformar a urbana São Paulo em uma das mecas do surfe.

Marcos Tavares: advogado da multinacional Johnson & Johnson se divide com surf trips (Alexandre Battibugli/Veja SP)

Tubarão no Chile e caldo em Bali

Advogado do gigante Johnson & Johnson, Marcos Tavares pegou suas primeiras ondas aos 14 anos de idade, na Praia de Pernambuco, no Guarujá. Hoje, aos 33 anos e com uma coleção de seis pranchas, não se limita mais às descidas ao litoral paulista. Desde 2003, quando ele organizou a primeira surf trip, para El Salvador, na América Central, suas viagens têm rendido histórias de tirar o fôlego. Em 2005, por exemplo, no Chile, Tavares surfou a 5 metros de distância de um tubarão. Já em maio passado, acabou surpreendido por uma série de ondas de 4 metros de altura em Bali, na Indonésia. “Fui puxado para baixo, fiquei submerso por mais de um minuto e só sobrevivi porque havia feito um curso de apneia alguns meses antes”, diz.

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Vanessa Bertelli (à frente na foto) e garotas da rede Longarina (Bruna Veloso/Veja SP)

Feminismo sobre as ondas

Criada em 2015 pela administradora Vanessa Bertelli (à frente na foto) e a engenheira ambiental Cristiane Brosso, a rede Longarina reúne mulheres paulistanas com vontade de aprender a surfar. O grupo organiza viagens periódicas da capital até Bertioga, no Litoral Norte, para a prática do esporte. A esticada à praia pode ser apenas um bate e volta ou durar três dias: os pacotes variam de 329 a 2 000 reais, com alimentação e estadia incluídas no caso dos mais longos. É possível tornar-se membro do Clube Longarina e participar de aulas semanais. O grupo também realiza viagens internacionais a cada quatro meses. A última, em novembro, para a Costa Rica, contou com vinte inscritas. Além das iniciativas no litoral, a rede oferece encontros na capital para discutir o esporte e feminismo. “O surfe acabou se tornando uma ferramenta de entrosamento entre as participantes e isso vai muito além do que ocorre na água”, diz Vanessa.

Juliano Tubino divide a paixão do surfe com a esposa, Juliana, responsável por comprar suas pranchas (João Bertholini/Veja SP)

Um noivado com o mar

O surfe também pode ser uma ferramenta de integração na família. É o que ocorre na casa do vice-presidente de marketing e estratégia de negócios da empresa de software Totvs, Juliano Tubino. Sua relação com o esporte começou na adolescência, no Rio de Janeiro. Há dezessete anos, desde que ficou noivo, suas pranchas são compradas pela mulher, Juliana. Além disso, os dois filhos, de 6 e 8 anos, pegam onda, durante as descidas ao litoral para o apartamento do casal em Bertioga. “O surfe se tornou a minha forma de conexão com os dois”, afirma Tubino.

Reinaldo Andraus: em 1978, no Havaí (Arquivo pessoal / reprodução/Veja SP)

Testemunha ocular

Administrador por formação e jornalista por opção, Reinaldo Andraus (na foto, em 1978, no Havaí), conhecido como Dragão, viveu o surfe nas funções de coordenador de programas esportivos de TV e editor de revistas especializadas, bem como no marketing de marcas do setor. Neste ano ele lança a série de livros A Grande História do Surf Brasileiro. A obra narra o surgimento das confecções de surfwear em São Paulo na década de 80 e relembra o primeiro circuito nacional do esporte, patrocinado por essas marcas, em 1987. “A capital foi a máquina que impulsionou o surfe brasileiro”, afirma.

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Alexandre Flora: confecciona cinquenta pranchas por mês (Antonio Milena/Veja SP)

Shaper da Zona Oeste

Dono da marca Akiwas, o shaper Alexandre Flora começou a se interessar pela produção de pranchas ainda na adolescência. Hoje ele confecciona uma média de cinquenta equipamentos por mês e os vende por preços que variam entre 1 400 e 2 900 reais. Desde 2000, seu ateliê está instalado na Vila Romana, na Zona Oeste. Em certo momento, ele tentou uma mudança para o Guarujá, para ficar mais perto do litoral, mas recuou. “Quem fabrica pranchas precisa estar no mercado paulistano”, diz.

Victoria Muratore: equilíbrio entre lazer e profissionalismo (Antonio Milena/Veja SP)

Sempre na água

A paixão pela água define a empreendedora Victoria Muratore. Sua primeira experiência com o surfe foi aos 9 anos. Aos 13, começou a praticar polo aquático, que lhe deu medalhas em torneios internacionais. Por vezes, isola-se um verão inteiro na casa da família em Ubatuba para pegar onda. As pranchas, inclusive, impactam seu trabalho. Após passar por empresas como iFood e Gympass, hoje ela desenvolve um serviço próprio, chamado Lifeeling. Com lançamento previsto para os próximos meses, a plataforma oferecerá experiências inovadoras no cotidiano. “Quero mostrar que é possível ter equilíbrio entre a vida profissional e a pessoal, algo que o surfe me ensinou”, diz.

Lucas Freitas: tempo dividido entre surfe e economia financeira (Antonio Milena/Veja SP)

No escritório com os tops

A família do economista Lucas Freitas é mais ligada ao interior, mas os amigos de infância que moravam em seu prédio na Mooca adoravam surfar. Assim, ganhou sua primeira prancha aos 13 anos. Hoje gerente de relacionamento do segmento de multinacionais do Itaú BBA, e cursando uma especialização no Insper, tem de se desdobrar para surfar. “Faço revezamento. Ou estudo no sábado e desço no domingo ou vice-versa”, conta ele, que assiste às etapas do Mundial de Surfe em um notebook na mesa do trabalho.

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La Mar: bar, restaurante e loja, em Pinheiros (Leo Martins/Veja SP)

Para se sentir na praia

Ouvir um reggae, beber uma cerveja e colocar o pé na areia. Uma cena que lembra o litoral, mas possível de ser emulada na Rua João Moura, em Pinheiros. Com um ambiente que simula uma praia, o bar, restaurante e loja Lar Mar atrai os surfistas. O local oferece aulas com o shaper Neco Carbone, que ensina técnicas de fabricação de pranchas. Mas talvez nenhum bairro reúna tantas surf shops tradicionais como Moema. Algumas das principais opções do pedaço são a Flutuar Surf (Avenida Pavão, 451), Star Point Moema (Avenida Iraí, 224), Surfers Paradise (Alameda dos Nhambiquaras, 1674) e Surf Trip (Avenida dos Imarés, 255).

13ª edição do Festivalma: o evento oferece shows e exposições (Divulgação/Divulgação)

O pico da vez é a Avenida Paulista

Com uma série de eventos sobre a cultura do surfe, a 13ª edição do Festivalma começa no próximo dia 25 e se estende até 3 de fevereiro no Centro Cultural da Fiesp, na Avenida Paulista. A programação inclui shows de bandas como Nomade Orquestra, do rapper Black Alien e uma exposição que se propõe a contar a história do esporte por meio de uma coleção com mais de 100 pranchas de diversos períodos.

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